Revisão constitucional
Pedro J. Bondaczuk
A revisão
constitucional teve a data de seu início fixada, na semana passada,
para o dia 6 de outubro próximo, pelas lideranças de oito partidos
(PMDB, PSDB, PFL, PP, PPR, PTB, PL e PRN), cujas bancadas somam 80%
dos 584 congressistas.
Novamente,
grandes expectativas são despertadas entre a faixa lúcida da
população (que é formadora do que se convencionou chamar de
“opinião pública”) no sentido de que, desta vez, os
parlamentares tenham um repente de lucidez e façam um trabalho limpo
e decente, dotando o País de uma Constituição que realmente mereça
esse nome.
Ou
seja, que se enquadre na definição que lhe foi dada pelo
doutrinador Jellinek: “Fixação escrita, material, das
instituições e princípios de governo de um Estado. A formação e
a limitação básica do Estado diante do indivíduo”.
A
tarefa fundamental e lógica dos responsáveis pela revisão é a de
usar com perícia uma “tesoura”, para cortar uma série de
bobagens, de armadilhas, de utopias encravadas no texto
constitucional. Espera-se, sobretudo, que a reforma restabeleça
aquilo que os constituintes de 1986 suprimiram: a governabilidade. Ou
seja, a base, o fundamento, a alma e a própria razão de ser de
qualquer Carta Magna que se preze.
A
atual composição do Congresso, porém, lança dúvidas sobre se
isso será feito ou não. Até porque, estranhamente, um tema de
tamanha relevância, como é o da revisão constitucional, não vem
merecendo nenhum destaque nos meios de comunicação, o que
impossibilita, ou pelo menos inibe, o saudável e indispensável
debate que a questão deveria gerar.
Fala-se
muito nas “conquistas sociais” obtidas com a Constituição
promulgada em 5 de outubro de 1988. Todavia, jamais o País esteve em
situação mais vexatória nesse aspecto, do que nos cinco anos de
sua vigência.
Seria
até redundante citar dados estatísticos a respeito, tantos foram os
divulgados e analisados nos últimos tempos. Até porque tal citação
se faz desnecessária diante da própria realidade. Basta que se dê
uma caminhada pelas ruas para se observar o estado de miserabilidade
da população.
Onde,
pois, estão as tão apregoadas “conquistas”? Onde a reforma
agrária? Onde a garantia fundamental aos direitos da criança? Onde
o atendimento às necessidades fundamentais do cidadão?
As
melhores Constituições são as enxutas, as despidas de detalhes que
competem à legislação ordinária, como a norte-americana, que é a
mesma elaborada após a independência dos Estados Unidos, com sete
artigos e 21 emendas. E, no entanto, sempre funcionou e continua mais
atual do que nunca. E a nossa, com seus 245 artigos básicos e mais
70 nas chamadas "disposições transitórias"?
Seria
oportuno que os responsáveis pela revisão lessem o trabalho do
veterano e proficiente constitucionalista Wolgran Junqueira Ferreira.
O mestre acentua, num de seus livros: “A Constituição deve ser a
individualidade pelo respeito ao pensamento humano; a solidariedade
humana em sua profundidade; o esquecimento do passado, como melhor
forma de futuro. Concebida como um impulso humano para o espírito do
homem, deve ser a voz e a palavra para o auditório do mundo, tomando
o homem, protegendo-o, realizando-o e dando-lhe a oportunidade de
ser. Deve determinar com clarividência, afirmando sem dúvidas,
protegendo sem pendência e estimulando o mais fecundo porvir, sem
medo”.
Respondam
os que pelo menos leram a atual Constituição: são estes os
princípios que a fundamentam? Ela afirma sem dúvidas, protege sem
pendências e estimula o futuro sem medo?
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 10 de agosto
de 1993).
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