Tuesday, January 30, 2018


Sonhos de criança



Pedro J. Bondaczuk


O meu maior sonho, quando guri de apenas seis anos, recordo-me bem, era ser escritor. Fechava os olhos e via-me, nitidamente, já crescido, cercado por dezenas de pessoas ávidas por meus autógrafos. Claro que, como toda criança, era um tanto inconstante no que queria ser quando crescesse.

Às vezes, sonhava ser um cientista, um pesquisador da área médica, para descobrir remédios que curassem doenças incuráveis, como o câncer e a poliomielite. Na ocasião ainda não havia sido inventada sequer a vacina de Jonas Salk. A de Albert Sabin veio alguns anos depois.

Hoje, a pólio foi erradicada do País. Mas não do meu corpo... Essas duas fixações acompanharam-me por toda a adolescência, maturidade e ainda estão presentes, secretamente, no fundo do subconsciente. Vez por outra vêm à tona, mas cada vez mais ocasionalmente.

Cientista não consegui ser, embora seja leitor ávido de livros dessa área, em especial de medicina, curso que tive que interromper por falta de recursos. O vil metal foi o responsável pela frustração do segundo maior sonho da minha infância. O que fazer?

Quanto a ser escritor... As chances ainda existem. Talvez remotas, é verdade, mas… não abri (e nem abrirei) mão desse sonho. Vivo de textos, que representam meu ganha pão há anos. Com eles sustentei e eduquei meus filhos. E se não fiz fortuna, pelo menos consegui sobreviver graças ao talento de escrever.

Claro que não posso avaliar a qualidade do que escrevo. Sou péssimo juiz e pior ainda quando se trata de me julgar. Ora mostro um rigor excessivo, ora sou complacente em demasia, sem contar com a devida isenção para os julgamentos.

Livros já escrevi 22, embora tenha só quatro (dois de contos, um de ensaios e outro de crônicas) publicados e alguns em vias de serem lançados, à mercê de julgamento de editoras às quais volta e meia os ofereço, sem muito sucesso até aqui. Nenhum dos livros que publiquei, no entanto, é de poesias, gênero ao qual me dedico desde menininho. Mais uma vez meu sonho (e desta vez o maior deles) esbarra na falta de recursos até mesmo para bancar publicações.

Poderia, eventualmente, conseguir uma editora, mas para tanto precisaria de tempo para fazer a peregrinação típica dos escritores desconhecidos, em busca de oportunidade. Teria que ter a paciência de Jó para ouvir inúmeros "não!" e engolir as desculpas tão já conhecidas, sem que o interlocutor se dispusesse sequer a ler os originais, ou ter, simplesmente, a porta batida na cara.

Optei pelo expediente da correspondência, embora seja contestável que dê resultados. Até agora, não deu. É verdade que já publiquei textos, em uma infinidade de jornais, que se reunidos, formariam toda uma biblioteca, com dezenas de alentados volumes. Bem ou mal, portanto, comuniquei-me com o público. Com quantas pessoas, jamais saberei.

Paralelo ao sonho de ser escritor (que ainda está por se concretizar, já que não ganhei nada com os quatro livros publicados), acalentei outro, mais ousado, mais pretensioso e aparentemente irrealizável, durante a juventude: o de chegar à Academia Brasileira de Letras. É muita pretensão minha? Certamente que sim. Todavia... sonhar não paga imposto (ainda)...

Para minha surpresa, em 1992 consegui subir o primeiro degrau dessa escada íngreme e escorregadia do sucesso, que conduz à pretensa imortalidade. Faltam, porém, ainda dois e ambos, em princípio, inacessíveis. Questiono, a todo o instante, se tenho talento para conquistar leitores. Mais do que isso, se o que escrevo interessa a alguém e é útil às pessoas.

À Academia Campinense de Letras, quis o destino que eu fosse guindado, no início da década de 90. Parte do sonho, portanto, está realizada. Para chegar, porém, à Paulista (antes) e à Brasileira (numa etapa posterior) precisarei fazer mais, muito mais do que fiz até aqui (que não foi pouco), em termos de criatividade, de domínio das técnicas de redação e de bom senso.

Foram anos e mais anos de intensiva leitura, de noites insones, de cansaço, de angústias, de quilômetros de papel preenchidos com textos, de críticas muitas vezes mesquinhas e destrutivas, de inúmeras frustrações, de autodisciplina, de privação de vida social e de lazer. Enfim, de trabalho e sacrifícios, com nulas compensações. Tudo em nome de um sonho de infância que sequer sei se vale a pena. Tudo em busca de castelos de fumaça. Tudo para satisfazer um ego. Tudo para contentar meu narcisismo intelectual.

Querem um exemplo de críticos chatos, destes de que quero distância por serem sempre destrutivos, mesmo quando criticam com (digamos) “educação”? Muitos, que se julgam defensores do tal do politicamente correto, criticam-me por escrever sempre na primeira pessoa e em tantas ocasiões trazer à baila coisas estritamente pessoais. Todavia, há quem goste e que até me cobre para escrever mais e mais a meu próprio respeito. E gosto não se discute. Ademais, prestes a completar 75 anos de idade, este é o momento propício da minha vida para o resgate de memórias, mesmo admitindo que com o tempo elas perdem a precisão e se tornam quase “ficcionais”. Às favas, pois, com os pretensos defensores do “politicamente correto”!!!!

"Vanitas vanitate", diria Salomão. Estranha criatura o homem! Milan Kundera escreveu, em seu "Livro do Riso e do Esquecimento": "O orgulho do poeta não é um orgulho banal. Só o próprio poeta conhece o valor daquilo que escreve. Os outros o compreenderão muito mais tarde ou talvez nunca o compreendam. O poeta tem, portanto, o dever de ser orgulhoso. Se não fosse, trairia sua obra". Como não sou “traidor”, escrevo para o futuro e a posteridade. Mas corro o risco (real) de resvalar para o absoluto esquecimento... Que tolice a minha, não é mesmo?!

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

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