Friday, September 30, 2016

É IMPRUDENTE ADIAR O QUE DEVA SER FEITO

O padre Antônio Vieira, no sermão da “Quarta Dominga do Advento”, pregado na Capela Real de Lisboa, em 1652, nos lembra: “Quantos amanheceram e não anoiteceram! Quantos se deitaram à noite e não se levantaram pela manhã! Quantos postos à mesa os afogou um bocado! Quantos indo por uma rua os sepultou uma ruína! A quantos levou uma bala não esperada! Quantos endoideceram de repente! A quantos veio a febre junta com o delírio! A quantos um espasmo, a quantos uma apoplexia, a quantos infinitos acidentes, que, ou tiram o uso da razão, ou a vida! Todos estes cuidavam que iriam morrer de uma morte ordinária, como vós cuidais; e quem vos deu a certeza de que vos não há de suceder o mesmo?”. Quando buscamos racionalizar essa atitude e mostrar a estupidez de se projetar nossos sonhos e projetos para um futuro incerto; quando buscamos alertar para o quanto ela é insensata e tola, baseados na inflexível lógica, de imediato nos colam na testa o rótulo de “pessimistas”. Pessimismo? Não! Realismo! O que quer que se pretenda fazer, mandam o bom-senso e a razão – aos quais quase sempre relutamos em atender – deve ser feito no aqui e agora. A menos que...


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Falta proteção social


Pedro J. Bondaczuk


O presidente Fernando Collor falará, em rede nacional de rádio e televisão, ainda nesta semana, para responder aos ataques que vêm sendo feitos por vários setores ao plano econômico lançado em 16 de março passado. E já não era sem tempo esse pronunciamento, já que a inflação segue em alta e as atividades na economia continuam sofrendo um processo de desaquecimento, de desaceleração, prejudicando ainda mais aqueles a quem o governante prometeu proteger: os descamisados.

É indispensável que se estudem e se ponham em prática mecanismos de proteção social que impeçam que os mais humildes sempre paguem pelos erros dos tecnocratas do passado e pelas dolorosas correções de rumo do presente. O salário-desemprego, da forma com que funciona hoje, não é esta salvaguarda, convenhamos.

Os países do chamado Primeiro Mundo possuem esse "guarda-chuva" para épocas de crise. E as deles nunca são tão perversas e prolongadas quanto as nossas. O presidente manifestou, nos últimos dias, que as críticas ao plano são frutos da união dos que se interessam em sabotar o programa, dentro do País, com os credores do Brasil, cujo interesse seria o de desestabilizar os negociadores da nossa dívida externa.

Seria desejável, no entanto, que fossem claramente identificados os que agem dessa maneira pois sua ação atenta contra os interesses nacionais. É verdade que boa parte da nova escalada inflacionária se prende à prolongada crise no Golfo Pérsico, que elevou os preços do petróleo a um patamar insuportável para os países que dependem da importação dessa matéria-prima.

Todavia, não se pode atribuir somente às estrepolias de Saddam Hussein a torturante ascensão das taxas inflacionárias, num momento em que os salários estão sem nenhum mecanismo de proteção. A tal de livre negociação, em períodos recessivos, não passa de balela.

Há empresas bem geridas e administradas por pessoas de tino que fazem por sua conta a reposição, porque seus administradores têm consciência de que sem salários não há vendas e, portanto, inexistem os negócios. Mas nem todos agem assim.

E como ficam os trabalhadores das firmas que não têm essa visão? Que poder de barganha eles possuem, num período em que podem se dar por satisfeitos pelo simples fato de conservarem seus empregos, tendo permanentemente por sobre suas cabeças o cutelo da demissão? Não será por aí, evidentemente, que os descamisados --- e são tantos neste País! --- irão encontrar sua proteção.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 21 de novembro de 1990).


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A poesia da ciência


Pedro J. Bondaczuk


O cientista e o poeta lançam mão do mesmo tipo de linguagem, a dos signos e convenções, em suas respectivas atividades: a metáfora. Um, age assim para tentar descrever o indescritível, ou seja, os dois extremos do infinito, tanto o micro quanto o macro. O outro, vale-se desse recurso para tornar concretos os sentimentos e emoções (obviamente abstratos) que movem este animal incrível, o único ser racional conhecido – embora seja possível e até provável que na imensidão do universo, com quatrilhões ou mais de mundos, em uma infinidade de galáxias e sistemas estelares, haja outros, até mais inteligentes e perfeitos. Talvez jamais venhamos a saber se eles existem ou não.

Para ser justo, devo ressaltar que essa constatação, sobre a similaridade das linguagens, não é minha. Vários cientistas de renome admitem isso. E é, até, uma questão de lógica. Os cinco sentidos do bicho homem são extremamente frágeis para penetrar no âmago da matéria ou para alcançar distâncias absurdamente grandes e vislumbrar o que há nos limites do universo. Contudo, com o instrumento da razão, e com a metáfora da matemática (ou da palavra, no caso do poeta) consegue chegar a leis e princípios –  demonstráveis, de maneira lógica, posto que apenas de forma empírica – que regem todo esse fabuloso conjunto, cujos limites jamais conseguirá saber onde estão.

O eminente físico nuclear Niels Bohr observou a esse propósito: “Quando chegamos aos átomos, a linguagem somente pode ser usada como na poesia. O poeta também não está mais preocupado em descrever fatos do que em criar imagens”. Ciência e poesia, portanto, são as duas faces de uma mesma moeda. Ou seja, ambas refletem a ânsia, a necessidade, a obsessão humana de conhecer (e de entender e explicar) tudo o que nos rodeia, inclusive (e principalmente) o próprio homem.

Uma das pessoas que têm tratado com maior didatismo e lucidez essa questão da linguagem dessas duas atividades nobres do homo-sapiens é K. C. Cole (pesquisei durante dias na internet para tentar descobrir o significado das duas iniciais do seu nome, em vão). Trata-se de uma jornalista e escritora, especializada em jornalismo científico, que prestou, durante anos, relevantes serviços em sua especialidade ao jornal “Los Angeles Times” e que, atualmente, leciona essa disciplina, aos futuros comunicadores, na University of Southern Califórnia.

Num dos seus múltiplos ensaios a que tive acesso (e que consegui traduzir, posto que de forma canhestra), ela constata: “A ciência, com efeito, envolve, na maior parte dos casos, olhar para coisas que nunca poderemos ver. Não apenas quarks (subpartículas atômicas) e quasares (formações quase-estelares), mas também ‘ondas’ de luz e ‘partículas’ carregadas, ‘campos magnéticos’ e ‘forças gravitacionais, saltos quânticos’ e ‘órbitas’ de elétrons”.

E não somente na física existe essa impossibilidade, mas em praticamente todos os ramos da ciência. Nenhum homem jamais viu, por exemplo, um dinossauro, das milhares de espécies desses gigantescos sáurios que povoaram a Terra. Os paleontólogos, no entanto, não somente “sabem” tudo a seu respeito (será que sabem mesmo?), como conseguem situar a época que teriam vivido (que remonta há vários milhões de anos no passado), descrever os seus hábitos e reconstruir seus corpos, tendo em mãos nada mais do que um punhado de ossos. É a fértil imaginação humana a serviço da compreensão (ou da tentativa dela).

K. C. Cole – que tem forte ligação com o Brasil, pois passou a infância no Rio de Janeiro – autora de livros notáveis em seu gênero, como “A mente considerando a matéria: conversas com o cosmos” e “Universo e a xícara de chá”, entre outros (cuja leitura recomendo, notadamente para jornalistas), diz mais: “De fato, nenhum destes fenômenos (os que citei acima) é, literalmente, o que dizemos ser. As ondas de luz não ondulam através do espaço vazio da mesma forma que as ondas de água se propagam num lago calmo; um campo não é como um prado, mas antes uma descrição matemática da intensidade e do sentido de uma força; um átomo não salta, literalmente, de um estado quântico para outro; os elétrons não viajam, literalmente, em torno do núcleo atômico em círculos, tal como o amor não produz, literalmente, dor de cabeça”.

Como se vê, há profunda poesia na ciência e vice-versa. Usando uma expressão popular, podemos afirmar que ambas “são farinhas do mesmo saco”, frutos da fertilíssima imaginação humana. Só o homem consegue produzir o que há de mais veloz em todo o universo, que supera, em muito, a velocidade da luz: o pensamento. Basta pensarmos, por exemplo, em Alfa Centauro e imediatamente estaremos lá. Ou em algum minúsculo planeta de alguma remotíssima estrela, de uma perdida galáxia dos confins do universo, tão distante que o seu brilho chegará à Terra somente daqui uns bilhões de anos após esta não existir mais, para que nos sintamos pisando o seu solo. Por tudo isso, considero a poesia e a ciência gêmeas siamesas... Estarei forçando a barra? Provavelmente. Mas também tenho o direito e a prerrogativa de dar asas à minha imaginação!              


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Thursday, September 29, 2016

QUINTANA E A “ARTE DE ENVELHECER”

Mário Quintana, neste pequeno/grande poema, traz sua peculiar visão da arte de envelhecer. Diz:

“Antes, todos os caminhos iam.
Agora, todos os caminhos vêm.
A casa é acolhedora,
os livros poucos.
E eu mesmo preparo
o chá para os fantasmas”.

Já no poema “Brinquedos de criança”, Quintana arrasa em versos de intensa beleza e verdade:

“Recordo ainda... E nada mais me importa...
Aqueles dias de uma luz tão mansa
que me deixavam, sempre, de lembrança,
algum brinquedo novo à minha porta...

Mas veio um vento de Desesperança
soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
todos os meus brinquedos de criança...

Estrada afora após segui...Mas, ai,
embora idade e senso eu aparente,
não vos iluda o velho que aqui vai:

eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino...acreditai...
que envelheceu, um dia, de repente!...”

Quintana, como se vê, é sublime!

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Ricos divergem, mas permanecem unidos


Pedro J. Bondaczuk


A reunião econômica de cúpula, que começa amanhã, em Bonn, na Alemanha Ocidental, já se tornou um acontecimento rotineiro para os sete países integrantes do seleto clube dos ricos, de três continentes. Afinal, esta é a décima-primeira vez que ela se realiza, sempre com a mesma pompa, os mesmos esquemas rígidos de segurança e idêntica expectativa pelos novos rumos que, os que realmente decidem alguma coisa sobre economia mundial, devem dar a questões como comércio internacional, dívida externa, protecionismo e taxas de juros.

Como das vezes anteriores, o espírito que move cada país participante, parece ser igual. Alemanha Ocidental, Canadá e Grã-Bretanha continuam firmes ao lado de Reagan e dirão, invariavelmente, amém, a qualquer decisão que ele tome.

François Mitterrand, confirmando a tradição francesa, de controvérsia em relação à política dos EUA (inaugurada ainda nos tempos de De Gaulle), pelo quarto ano consecutivo vai apresentar a sua proposta pelo estabelecimento de uma nova regra no jogo econômico mundial. A França propõe, simplesmente, um novo Bretton Woods, visto que muita água já rolou por baixo da ponte da História desde que aquela célebre reunião ocorreu em julho de 1944. Os canhões, então, ainda não haviam se calado, numa Europa devastada pela guerra, e o perigo nazista era algo palpável.

As questões dos tempos de hoje, no plano econômico, contudo, são muito mais complexas, principalmente depois do processo de descolonização da África e de partes da Ásia, com a emergência de países que, sob qualquer ângulo que se olhe, são inviáveis.

A Itália fica, nessa reunião, mais uma vez, como o fiel da balança. Seu principal papel deverá ser o de advogado dos endividados do Terceiro Mundo, reivindicando condições mais suaves para o pagamento das dívidas, especialmente no que se refere a juros. Indiretamente, Bettino Craxi estará defendendo a mesma tese de Mitterrand, já que se manifesta, posto que moderadamente, contra o sistema estabelecido em Bretton Woods.

Quem estará, entretanto, na berlinda, será o Japão, atacado por todos os lados por ser eficaz e prático até demais. Os produtos nipônicos são, hoje, soberanos em quase todos os mercados, não somente os asiáticos, que lhes pertencem quase que completamente, mas também nos EUA e em boa parte da Europa. Com seus preços tentadores e sua qualidade extraordinária, vencem, facilmente, os similares norte-americanos e europeus, frutos de indústrias cansadas e de técnicas anacrônicas, por isso resultando mais caros.

Mas ninguém precisa recear por qualquer espécie de ruptura nesse clube seleto dos ricos. É claro que essa reunião será diferente das do bloco do Leste da Europa que, simplesmente, homologam as decisões soviéticas. Mas as rusgas e briguinhas que eventualmente surgirão terminarão, como bem dizem os moradores do bairro paulistano do Brás, simplesmente “em pizza”. É assim que funcionam as engrenagens da política ocidental.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 1º de maio de 1985).


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Vida supera a ficção

Pedro J. Bondaczuk

A vida de determinados escritores, não raro, supera, e em muito – em termos de interesse – a sua própria obra, por mais criativa, inteligente e oportuna que esta seja. Alguns dão exemplos magníficos de garra, determinação e coragem e vão muito além dos próprios limites, encarando os obstáculos e dificuldades que têm que enfrentar com otimismo e com bom-humor.

Outros, têm trajetórias trágicas e nada exemplares. Estes, via de regra (nem sempre, é claro) recorrem ao álcool e/ou às drogas, na tentativa (vã) de calar seus “demônios interiores”. Há casos e mais casos que oscilam entre estes dois extremos, com várias graduações, positivas ou negativas. Inclusive existem os que se mostram, sobretudo, coerentes, e cuja vida e obra rivalizam entre si, quando não se igualam em interesse e grandeza.

Classifico nesta categoria um escritor que sempre me fascinou (e que, invariavelmente cito, quando o assunto vem à baila) tanto pelos livros que escreveu, quanto, e principalmente, pela forma que encarou suas dificuldades e fraquezas e as venceu ou, pelo menos, as minimizou. Refiro-me ao escocês, natural da cidade de Edimburgo, Robert Louis Stevenson, nascido em 13 de novembro de 1850.

É dele uma citação que anotei, pedi para um artista gráfico reproduzir em letras góticas e mandei enquadrar, mantendo esse quadro na parede bem em frente à minha escrivaninha, para me inspirar no cotidiano, especialmente naqueles dias em que nada parece dar certo e que ameaçam ficar perdidos. De tanto ler e repetir suas palavras, como uma espécie de mantra, até já as decorei. São estas: “Qualquer um pode carregar o seu fardo, embora pesado, até anoitecer. Qualquer um pode fazer seu trabalho, embora árduo, por um dia. Qualquer um pode viver mansamente, pacientemente, amistosamente, até que o sol se ponha. E é isso o que a vida realmente requer”.

Robert Louis Stevenson viveu às voltas, desde a tenra infância, com  uma renitente tuberculose, da qual jamais se curou. A doença, porém, não o impediu de viajar por várias partes do mundo, registrando, meticulosamente, as impressões dessas viagens – as pessoas que conheceu, os lugares pitorescos que viu, os costumes e tradições exóticos com os quais entrou em contato etc. – deixando esses preciosos registros como legado para a posteridade.

A figura que se tornou marcante na vida do escritor, que determinou sua personalidade e até sua carreira, e que ele guardou para sempre na memória, foi a de uma jovem enfermeira que seus pais contrataram para tomar conta daquele menino enfermiço, chamada Cummy. Denominou-a de “meu anjo da minha vida de criança”. Durante as freqüentes crises de tuberculose que o acometiam, para acalmá-lo, ela lhe contava histórias e mais histórias de piratas, além de contos folclóricos da Escócia. Deu no que deu.

Seus pais exigiram que cursasse Direito, o que o moço fez em Londres. Todavia, jamais advogou. Não era esse seu destino e muito menos sua vocação. Tudo em Stevenson foi precoce, inclusive o talento de escrever. Tinha que viver com pressa, afinal, a morte não cessava de o rondar. Passou a dedicar-se à literatura a partir de 1871, com 21 anos de idade. Escreveu de tudo: contos, novelas, poemas, ensaios, impressões de viagens, estudos de estética e, claro, romances (o gênero que o consagrou).

É dele um dos clássicos da literatura juvenil, “A ilha do tesouro”, que escreveu para um sobrinho de 13 anos, que havia, há pouco, ficado órfão. Em 1880, surpreendeu todo o mundo e casou-se com uma norte-americana divorciada, mãe de dois filhos, muito mais velha do que ele, chamada Fanny Osborne, e se mudou para os Estados Unidos, onde, aliás, não ficou por muito tempo. Era uma espécie de cigano. A despeito da doença, não parava em lugar algum.

A verdadeira consagração, a notoriedade artística de Robert Louis Stevenson veio em 1886, aos 36 anos, quando escreveu “The stranger case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde” (em português, “O médico e o monstro”), um dos livros mais adaptados para teatro cinema e televisão de todo o mundo e que inspirou até dezenas de histórias em quadrinhos, além de várias centenas de ensaios. O escritor revelou, em entrevista publicada no jornal “The New York Herald”, em 8 de setembro de 1887, que o argumento do romance lhe veio num sonho. Hoje, essa obra, é considerada uma das precursoras da ficção científica. No livro, Stevenson retoma o velho mito do duplo, resgatado pelo romantismo alemão do “Doppelgänger”.

Além da “Ilha do tesouro” e do “Médico e o monstro”, publicou vários outros best-sellers, entre os quais “A Flecha Negra”, “As aventuras de David Balfour”,  “O morgado de Ballantrae” e “Nos mares do Sul”, escrito nas Ilhas Samoa, onde viveu os seis últimos anos de sua vida e onde morreu – não vítima de tuberculose, como seria de se esperar, mas de hemorragia cerebral – em 3 de dezembro de 1894, 20 dias após haver completado 44 anos.

Na Oceania, Stevenson era chamado pelos nativos de “Tusitala”, que significa “o contador de histórias”. Apesar de ser considerado pelos críticos literários, basicamente, autor de literatura juvenil, e acusado, por muitos, de escritor afetado (do que sempre discordei), foi considerado por Graham Greene, Ítalo Calvino e Jorge Luiz Borges, como um “mestre” da literatura.

Eu iria bem mais longe. Classificaria esse talentoso lutador como mestre na arte de viver. Afinal, foi coerente com tudo o que escreveu. Carregou, por 44 anos, seu fardo (e que fardo!) dia após dia, até o anoitecer. Fez seu trabalho diariamente, com a diligência de uma formiguinha. Viveu, mansa, paciente e amistosamente, todo o tempo que lhe foi concedido, até que o sol se pusesse, sem saber se estaria vivo no dia seguinte. Ou seja, cumpriu todos os requisitos que a vida exige de cada um de nós. Foi, portanto, na minha modesta avaliação, um vencedor na mais completa acepção da palavra e em qualquer aspecto que se olhe.


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Wednesday, September 28, 2016

UM PARALELO ENTRE A INFÂNCIA E A VELHICE


No livro “Elogio à loucura”, Erasmo de Rotterdã traça, naquele estilo irônico que o caracterizou e o tornou célebre (e perseguido por poderosos desafetos) um paralelo entre a infância e a velhice, entre a criança e o idoso, da seguinte maneira:  “Os velhos apreciam bastante a companhia das crianças, e estas a dos velhos, pois os deuses gostam de unir os semelhantes. Realmente, se fizermos abstração das rugas e do número de anos, próprios da velhice, haverá dois seres que se assemelhem mais que o velho e a criança?”. A seguir, esse eminente encrenqueiro holandês apresenta algumas dessas semelhanças: “Ambos têm cabelos brancos, boca sem dentes, corpo flácido, ambos gostam de leite, ambos balbuciam, ambos falam sem cessar; a tolice, o esquecimento, a indiscrição, tudo concorre para estabelecer entre essas duas idades perfeita semelhança. Quanto mais envelhecem os homens, tanto mais se passam a crianças, até o dia em que abandonam o mundo, como verdadeiras crianças, sem aversão à vida e sem perceber a morte”. Claro que aí há muito de exagero, mas também há muito de verdade.

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Entendimento difícil de sair


Pedro J. Bondaczuk


O sucesso das conversações para a obtenção de um sonhado e cada vez mais difícil entendimento nacional está em risco antes mesmo da definição dos interlocutores e da pauta a ser elaborada para conduzir as negociações. Uma das partes integrantes do processo, a Central Única dos Trabalhadores, CUT, manifestou, através de seu presidente, Jair Meneguelli, a intenção de não participar das reuniões, alegando, como motivo, a nomeação de Jarbas Passarinho para o Ministério da Justiça.

A decisão, assinale-se, ainda não é definitiva. Porém, caso o afastamento se configure, será lamentável, já que a entidade representa uma parcela considerável da sociedade.

Este é um momento para somar forças, não de divisões. Trata-se de mais uma oportunidade, talvez a última, para que o pacto, o entendimento, ou seja lá o nome que se deseje dar, venha a ser obtido, facilitando a travessia por um duro período de transição que, se superado a contento, pode abrir ao Brasil amplos horizontes.

Ao invés da CUT retirar-se do processo, o que é necessário é a adesão de outras categorias, de representantes de outros setores, além das participações nas conversações da Ordem dos Advogados do Brasil e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.

É hora de se deixar disputas ideológicas e inócuas picuinhas políticas de lado e se partir para o terreno prático, para uma negociação séria, sincera, bem intencionada quanto à repartição dos sacrifícios numa luta sem quartel contra a inflação.

É o momento de evitar que os 53 milhões de brasileiros afetados pela fome e pela subnutrição tenham suas aflições aumentadas, sem que haja esperanças, pelo menos a médio prazo, das coisas melhorarem. Se a CUT não quer ser tratada de forma preconceituosa, é preciso que não alimente preconceitos contra ninguém. Muito menos contra um ministro, que já deu mostras de competência no passado.

O que está em jogo não é o poder, pois este, nas urnas, o povo decidiu, nas eleições presidenciais do ano passado, com quem deveria ficar. Empenha-se por uma solução consensual, ou próxima disso, para os problemas que são comuns a todos. E não é lícito que uma entidade que representa justamente aquela parcela que corre o risco de ser a mais atingida pela estratégia antiinflacionária se omita de seu dever de tentar proteger os seus representados.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de outubro de 1990).


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Há 64 anos o Brasil perdia seu seresteiro


Pedro J. Bondaczuk

Você conhece Francisco Alves, caro leitor? Bem, certamente que sim, dependendo de a quem me refiro, não é mesmo? Afinal, trata-se de um nome bastante comum. É possível que você tenha algum parente, amigo, ou colega de trabalho (ou de escola, ou de faculdade, ou seja lá de onde for) que se chame assim. Eu conheci vários. Convivi com muitos. Alguns foram até mais do que colegas: foram amigos. Outros... Bem, nem tanto. Mas nenhum chegou a ser meu inimigo. Não me refiro, todavia, a um Francisco Alves qualquer (com todo respeito). Trago este nome, hoje à baila, por se tratar de um dos homens mais populares de seu tempo, cuja morte trágica, ocorrida num 27 de setembro de 1952 (há 64 anos, portanto), no auge do sucesso, comoveu todo o País na época. Chocou desde o cidadão mais humilde e anônimo até as maiores autoridades da República, deputados, senadores, ministros, o presidente Getúlio Vargas etc., além, claro, de artistas de todas as artes.

Era um cantor. Óbvio, não se tratava de um cantor qualquer. Era especial, especialíssimo, o top dos tops de então. Era, praticamente, unanimidade nacional o que, em qualquer atividade, é sumamente raro. Guardadas as devidas proporções, seu sucesso e sua popularidade eram maiores do que os que ostenta, hoje, o já mítico Roberto Carlos. Não por acaso ostentava o título de “Rei da Voz”. Carinhosamente, era chamado, também, de “Chico Viola”, por ser exímio violonista e ter um violão como “companheiro inseparável” e de “Seresteiro do Brasil”. Eu tinha nove anos de idade na ocasião da sua morte e, apesar da pouca idade, era seu fã, com o fervor e a fidelidade que apenas uma criança consegue demonstrar quando gosta, de fato, de alguém. E eu gostava demais de Francisco Alves.

Destaque-se que ele atingiu o patamar de fama e de sucesso em uma época em que não havia, ainda, a televisão no Brasil. Esta só veio a se tornar opção dois anos antes de sua morte. Contudo, a quantidade de receptores disponíveis dessa novidade, na época, era ínfima, irrisória, qualquer coisa que ascendia a meras centenas, se tanto. O Rei da Voz foi fruto, portanto, da chamada “era de ouro do rádio”. Ironicamente, o mesmo veículo que o popularizou e o consagrou foi, indiretamente, a causa da sua morte. Explico. Francisco Alves veio a São Paulo para uma apresentação de gala na Rádio Nacional paulista, que congregou incontável multidão em delírio em sua performance. O bom senso recomendava que ele pousasse em algum hotel da Paulicéia e fosse para o Rio de Janeiro no dia seguinte. Contudo, Chico Viola tinha outra apresentação marcada para a manhã do dia seguinte, na então Capital Federal. E ele era desses artistas que respeitavam às últimas conseqüências seu público. Não queria atrasar sua apresentação na Rádio Nacional do Rio, à qual era ligado por quatro ou cinco décadas. Além do que, tinha vindo a São Paulo no seu próprio carro, um Buick placas 11-65-80 DF e não tinha, pois, porque esperar.

Caso Francisco Alves soubesse o que o esperava, certamente adiaria sua volta ao Rio. Mas... como saber? E a fatalidade colheu-o em cheio em plena Via Dutra, tão perigosa que na época era conhecida como “Rodovia da Morte”. Na altura da localidade de Una, no município paulista de Pindamonhangaba, seu carro chocou-se, violentamente, de frente, com um caminhão com chapa 11-58-84 RS, dirigido pelo caminhoneiro João Valter Sebastiani, ao tentar uma imprudente ultrapassagem a outro veículo. Estava, portanto, na contramão. A colisão foi impressionante. O caminhão foi totalmente avariado, embora não destruído. Imaginem, então, o Buick de Francisco Alves! Transformou-se num monte irreconhecível de ferros retorcidos. Pior, incendiou-se.

Seu companheiro de viagem, Haroldo Alves, foi projetado para fora do veículo (na época, os carros não tinham cintos de segurança) e foi socorrido por alguém que trafegava na estrada naquele momento e encaminhado, em estado gravíssimo, à Santa Casa de Taubaté, onde permaneceu por muitos dias em coma. Presume-se que o cantor tenha morrido na hora. Se não morreu, seu derradeiro momento deve ter sido dos mais sofridos. O fogo “devorou” por completo o corpo de Francisco Alves, carbonizando-o, deixando-o irreconhecível. O motorista do caminhão sofreu apenas ferimentos leves. Assim que a notícia do desastre foi divulgada, o País, virtualmente, parou, em estado de choque. As emissoras de rádio (todas elas, de Norte a Sul), interromperam de imediato suas programações normais e passaram a transmitir programas especiais, com os sucessos do cantor, entremeados por novas notícias.


O sepultamento, no Cemitério São João Batista, no Rio, teve cenas surreais, de histeria coletiva. Uma multidão, estimada por volta de um milhão de pessoas, acompanhou o corpo de Chico Alves à sua ”última morada”. Seu enterro pode ser comparado ao de Ayrton Senna, em São Paulo, 42 anos depois, em 1994. O jornal “O Dia”, na edição de 29 de setembro de 1952, descreveu da seguinte forma a despedida dos cariocas do seu filho ilustre e grande ídolo: “Era impossível ter-se uma idéia exata do número de pessoas que formavam aquela fabulosa onda humana, que provocou colapso no trânsito, acompanhando os funerais de Francisco Alves. Cem mil, duzentas mil pessoas? Quem sabe ao certo, se a vista do repórter se perdia ao longo de ruas e avenidas da zona sul? Foi um espetáculo comovente, o coroamento das manifestações de dor popular pela morte trágica do Rei da Voz. Durante as últimas 48 horas, a cidade se transformou de tal modo, ligando-se ao destino de um artista por vinculo do mais profundo sentimentalismo, que até parecia não ter morrido apenas um seresteiro de alta classe, mas um místico de poderosa influência sobre multidão deslumbrada. Era o milagre do talento de um cantor, que soube interpretar, como ninguém, as tristezas e as alegrias, as venturas e os infortúnios da sua gente, dizendo no lirismo da sua voz harmoniosa e tropical o que não se pode expressar em meras palavras. (...)” E tudo isso ocorreu há já 64 anos que, todavia, na minha memória, parece ter sido apenas ontem...

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