Saturday, September 03, 2016

Coragem e muito “jogo de cintura”


 Pedro J. Bondaczuk


O líder soviético Mikhail Gorbachev demonstrou, mais uma vez, ontem, que além de coragem, tem um grande “jogo de cintura”. Sabe fazer, com precisão, as jogadas políticas, e na hora certa, para transformar situações que lhe sejam desfavoráveis em outras a seu favor.

Durante uma plenária do Comitê Central do Partido Comunista, o segundo órgão mais poderoso da agremiação, depois do Politburo, o presidente conseguiu o que nenhum dos seus antecessores havia conseguido antes. Antecipou o Congresso do PC em alguns meses, para que quase coincidisse com as eleições em vários níveis que serão realizadas no país em 1990, com múltiplos candidatos.

Dessa forma, ele conseguirá afastar os conservadores, que estão bloqueando as suas reformas, de uma forma “elegante”. Ou melhor diríamos, inteligente. Vai entregar essa decisão ao eleitorado. E este, a julgar pelo que aconteceu no pleito de março passado, certamente não vai compactuar com o passado, com os retrógrados, com aqueles que colocaram a superpotência marxista num impasse num impasse principalmente econômico, quem não tiver cacife eleitoral que diga adeus à carreira política.

Não se pode negar, entretanto, a coragem de Gorbachev. O leitor já imaginou a natureza e a intensidade das pressões que ele vem sofrendo da parte dos conservadores? E ainda assim, a despeito de uma enervante lentidão, sua “perestroika” econômica e sua “glasnost” político-social estão caminhando.

Mais do que isso, estão extrapolando o território soviético e afetando, positivamente, os países do bloco do Leste europeu. Por enquanto, somente dois deles, Polônia e Hungria, estão embarcando em projetos reformistas.

No entanto, com a evolução que se espera que os acontecimentos venham a ter, outros, fatalmente, terão de aderir, para não perderem o bonde da história. Os alemães orientais, por exemplo, estão sofrendo na própria carne a falta de visão as sua liderança comunista em promover mudanças no país.

No êxodo de seus cidadãos (que está ainda em desenvolvimento, posto que de forma menos intensa do que na semana passada), a Alemanha Oriental está perdendo a sua nata. Os que estão fugindo não são párias sociais, como aconteceu na chamada “Ponte de Mariel”, de Cuba para os Estados Unidos, em 1980. São jovens bem preparados, em geral universitários, técnicos em setores essenciais, que farão falta ao país.

Aliás, para evitar algo assim é que Gorbachev quer conduzir com perícia e segurança as suas “perestroika” e “glasnost”. Para que a União Soviética seja, de fato, uma superpotência, com um povo forte e feliz, e não um mero Estado policial, super bem armado, mas amargurado e considerado incompetente para promover o próprio bem estar.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 20 de setembro de 1989).


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