Cremlin
beneficia Reagan
Pedro J. Bondaczuk
A entrevista concedida pelo presidente soviético,
Constantin Chernenko, ao jornal norte-americano “The Washington Post”, e que
foi publicada ontem, surpreendeu os observadores políticos internacionais em
dois pontos: pelo tom inusitadamente conciliador do Cremlin em relação aos EUA
e por reforçar a posição do presidente Ronald Reagan junto ao seu eleitorado,
às vésperas do importante e decisivo debate que este vai travar domingo com o
democrata Walter Mondale, e que pode, até mesmo, reverter as expectativas
eleitorais.
Chernenko afirmou, categoricamente, que “as relações
entre Washington e Moscou poderiam melhorar se o governo norte-americano
concordasse com pelo menos uma, de quatro propostas feitas pelo Cremlin, e que
são: proibição da militarização do espaço, congelamento das armas nucleares,
ratificação de tratados de proscrição de armas nucleares e uma promessa de Tio
Sam de que não seria o primeiro a usar suas bombas atômicas contra os russos”.
Bem, diria o leitor, o presidente soviético colocou
Ronald Reagan contra a parede, forçando-o a uma manifestação pública exatamente
nos quatro pontos chaves de sua política em relação à superpotência do Leste.
Aparentemente, no xadrez da retórica internacional, Chernenko teria fornecido,
na verdade, farta munição para Mondale usar no debate de domingo próximo. Não
vejo a coisa bem assim.
O simples fato de haver uma manifestação
conciliatória de Moscou, já é um ponto favorável à Casa Branca. Afinal, Reagan
não se cansa de repetir que apenas usando a firmeza nas suas posições, os EUA
poderão forçar os soviéticos a negociarem. E ao que se saiba, o candidato
republicano à reeleição não cedeu em nada ao Cremlin, mas mesmo assim esse
revela (ou pelo menos manifesta publicamente) um ânimo conciliatório.
Hábil como é, Reagan certamente não deixará de
explorar esse aspecto na campanha. E poderá ir até mais longe, declarando,
publicamente, estar de acordo com uma das quatro propostas de Chernenko. Por
exemplo, pode assumir o compromisso de não desfechar o primeiro ataque. Com
isso, passará a bola para o outro lado, deixando o presidente soviético outra
vez na defensiva. Isto é, ou ele inicia negociações com Washington, depois
disso, conforme sua promessa, ou mais uma vez cai em descrédito perante a
opinião pública mundial.
Se a entrevista do líder russo visava beneficiar o
candidato democrata, portanto, o tiro saiu pela culatra. Ou pelo menos pode
sair, dependendo da habilidade do atual presidente norte-americano em
explorá-la a seu favor. O fato é que os acontecimentos da semana, mesmo à
revelia de Reagan, acabaram lhe trazendo fartos benefícios (como por exemplo o
diálogo promovido pelo presidente salvadorenho com a guerrilha). E estes
chegaram no momento oportuno, no exato instante em que Mondale já começa a
ameaçar uma reeleição que parecia, a princípio, demasiadamente, tranqüila.
(Artigo publicado na página 9, Internacional, do
Correio Popular, em 18 de outubro de 1984)
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