Platão foi educador por
excelência
Pedro
J. Bondaczuk
"A educação deve
possibilitar ao corpo e à alma toda a perfeição e a beleza que podem ter".
Foi dessa maneira que Platão estabeleceu, de forma direta, sumamente objetiva,
sem subterfúgios e nem solilóquios, em poucas palavras, a real finalidade desse
processo, tão comentado e teorizado, mas tão pouco compreendido, posto que
essencial para a formação humana. Ele via no filósofo não um teorizador, a
lidar com complexas idéias abstratas, como muitos entendiam (e ainda hoje
entendem), mas, sobretudo, um “educador”. Todavia em sentido amplo, holístico,
completo, envolvendo a integralidade humana. Ou seja, levando em conta,
simultaneamente, corpo e mente (que chamou de “alma”), já que um não existe sem
o outro.
Para Platão, educação
era algo muito além do que é compreendido hoje, universalmente (salvo
raríssimas exceções). Ou seja, como mera forma de “adestramento” das pessoas
para exercerem as diversas profissões que exijam conhecimentos específicos, como
sempre entenderam e ainda entendem os responsáveis por políticas educacionais
mundo afora. Fiel a essa sua visão, ele criou, em uma área nobre que havia
recebido por herança, uma de suas principais obras, que só rivaliza em
importância com suas idéias filosóficas, que foi a Academia. Ouso afirmar que
se tratou da primeira escola superior da história. E foi tão preciosa, que lhe
sobreviveu, e muitíssimo. Durou quase um milênio!!! Ademais nunca foi nem
remotamente igualada em excelência, quer em seus métodos, quer em seu objetivo:
o de “possibilitar ao corpo e à alma toda perfeição e beleza que podem
ter”.
O filósofo e escritor
norueguês Jostein Gaarder destaca, em seu best-seller mundial “O mundo de
Sofia”, qual era a principal característica dessa instituição, que a
diferenciava de todas as outras, tanto as que vieram antes, quanto as criadas
depois dela: “ Na Academia de Platão ensinava-se filosofia, matemática e
ginástica. ‘Ensinar’’ talvez não seja o verbo mais adequado. Na Academia de Platão
o que mais importava também era o diálogo vivo. Não foi por acaso que Platão
escreveu seus textos em forma de diálogos”. Não havia, pois, como nas escolas
tradicionais, a figura de um “professor”, em contraposição a alunos. “Todos”
participavam – cada qual de acordo com as informações que dispunha – da busca
do conhecimento. Pelo menos durante o tempo em que Platão comandou a Academia,
esta não dispunha de qualquer doutrina especial para ensinar. Em vez disso, o
filósofo (e provavelmente outros associados a ele) passavam problemas a serem
estudados e resolvidos conjuntamente.
A filósofa gaucha Neiva
da Silva Martinelli observa: “ (...) A filosofia é realizada na Academia...
pela oralidade, a vida comunitária é regida pelos discursos e diálogos, pela
educação da alma. O método socrático e a matemática (fonte em Pitágoras) são
ciências necessárias à formação do filósofo, sendo que a matemática revela
ordem, harmonia, fornecendo uma visão de perfeição do mundo inteligível”. Em
outro trecho de seu excelente ensaio a propósito dessa modelar escola, ela
destaca: “A Academia objetivava formar novos homens, no sentido transformador
do amor ao bem, num ato de sublimação, visando o tornar-se virtuoso pela ação.
O filósofo é aquele que escreve na alma. E o verdadeiro conhecimento é
universal, refletido em si mesmo e de si toma consciência. Por isso nos
diálogos há o comum acordo, onde se superam os pontos de vista individuais.
Entretanto havia a liberdade de pensamento, de expressão. O fundamento da
escola era o ato do diálogo, visto e tido como um modo de vida, pois o mesmo
conduz à transformação do ser humano”. E não conduz?!
Neiva da Silva
Martinelli lembra, ainda: “Platão diferencia os dois tipos de escrita que podem
ser impressas: a escrita gravada na alma dos homens, e a escrita nos rolos de
papel. E ele considera filósofo aquele que tenta escrever na alma dos homens.
Por isso, atribuía grande importância à oralidade. Os escritos em papel são
passíveis de diferentes interpretações, e capazes de despertarem os mais
variados sentimentos. Uma palavra escrita que está simplesmente impressa em
papel aparente, corresponderia, a uma cópia da cópia. Por isso, a alma tem
tanta dificuldade de reconhecer, de lembrar-se do verdadeiro conhecimento”.
A Academia não fazia
distinção de sexos. Ou seja, homens e mulheres recebiam a mesmíssima educação,
inclusive a física. Ademais, pelo menos na gestão de Platão, era gratuita. Não
cobrava mensalidade de ninguém. O professor Márcio Ferrari enfatiza, com
rigorosa pertinência: “Platão acreditava que, por meio do conhecimento, seria
possível controlar os instintos, a ganância e a violência. O acesso aos valores
da civilização, portanto, funcionaria como antídoto para todo o mal cometido
pelos seres humanos contra seus semelhantes. Hoje poucos concordam com isso; a
causa principal foram as atrocidades cometidas pelos regimes totalitários do
século 20, que prosperaram até em países cultos e desenvolvidos, como a
Alemanha. Por outro lado, não há educação consistente sem valores éticos. Você
já refletiu sobre essas questões? Até que ponto considera a educação um
instrumento para a formação de homens sábios e virtuosos?”. Sim, leitor, até
que ponto?
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment