Luz interior
Pedro J.
Bondaczuk
A comunicação – quando exercitada
com amor, e com o genuíno desejo de, não apenas penetrar na mente das pessoas e
sondar seus desejos, angústias e necessidades, mas, principalmente, lhes
apontar caminhos para a solução dos seus problemas – é, mais do que um dom: é
uma arte. Trata-se, porém, de imensa responsabilidade, principalmente quando o
veículo utilizado é o texto e quando seu alvo é o público em geral, e não
alguém específico.
Nunca se sabe em quais mãos a
crônica, o artigo, o ensaio (ou seja lá que tipo de escrita que for) vão cair.
Desconhece-se, por exemplo, o estado de espírito desse leitor no momento da
leitura, sua condição de saúde (física, mental e/ou psicológica), se está
feliz; se, ao contrário, sofre por alguma razão qualquer (perda de um ente
querido, demissão no emprego, doença própria ou de alguém da família
etc.etc.etc.); se é ou não influenciável pelo que ouve ou que lê e assim por
diante. Mesmo assim, apesar de todos esses cuidados, às vezes, por imperícia (e
juro que não por má-fé), acabo por ser causador de ainda mais sofrimento a
alguém que já esteja sofrendo. Imaginem se não me cercasse de tanta cautela!
Podemos, com o nosso texto, tanto
consolar, animar e incutir otimismo e vontade de vencer em quem nos lê, quanto
levá-lo ao desânimo, à depressão, ao desespero e, em casos extremos, até ao
suicídio. E raramente temos ciência dos efeitos e do resultado do que
escrevemos.
Por isso, sempre que me preparo
para este ato de comunicação, penso, em primeiro lugar, nessa possibilidade.
Analiso se o tema é construtivo, se a colocação é adequada e se a exposição das
idéias está clara, sem qualquer ambigüidade. Caso não sejam, apago o que
eventualmente já esteja escrito e parto para outro tema, cercado das mesmíssimas
cautelas. Se, pelo contrário, sentir que satisfiz todas as condições
auto-impostas, dou a crônica (que é o gênero de que mais me utilizo para
comunicação com o público) por concluída.
Não raro, mesmo com todos esses
cuidados, não me sinto seguro do que escrevi. Procuro em minha biblioteca algum
livro sobre o assunto para me esclarecer melhor. E refaço o texto, mesmo que já
esteja atrasado na sua entrega ao editor. Quando o concluo de novo, peço a
alguém da minha plena confiança que o leia, com o olhar mais crítico possível,
e que me aponte todos os defeitos que encontrou. Se o assunto, ou a sua
abordagem, forem por demais polêmicos, busco mais de uma opinião (já houve
casos de pedi-la a até dez pessoas), antes de me dar por satisfeito e encaminhar
o texto em questão para divulgação em sites e jornais, ou de expô-lo em meus
blogs.
O que procuro, ao escrever, é uma
certa luz interior, que me desperte empatia com os semelhantes. É colocar no
texto todos os princípios que me foram incutidos por meus pais, por meus
mestres e pelos milhares de escritores que li e que me tornaram no que sou. Na
maioria das vezes, tenho conseguido isso, a julgar pelos comentários sobre
minhas crônicas, feitos na internet ou nas cartas e nos e-mails que recebo. Às
vezes, porém...Dou magníficos escorregões e recebo ásperas reprimendas
públicas, por esses mesmos meios.
Essas críticas, apesar de
machucarem o ego, são preciosíssimas, até aquelas mal-educadas e com palavras
chulas, feitas com o objetivo deliberado de me ridicularizar. Procuro
aceitá-las com humildade e evito polemizar. É verdade que às vezes a vaidade
fala mais alto e dou respostas um tanto quanto atravessadas para os mais
atrevidos. Tolice minha, claro!
Na minha atividade de
comunicador, busco pautar minhas ações por estas palavras, ditas por um dos
seres humanos mais preciosos e altruístas que já existiram, o Dr. Albert
Schweitzer – que dedicou mais de 60 anos de sua longa e produtiva vida (morreu
com 92 anos de idade) a curar leprosos em um tosco hospital em plena selva
africana –: “Quando existe dentro de alguém a luz interior, ela transparece e
se irradia. Então nos reconhecemos mutuamente, mesmo na escuridão, enquanto
caminhamos lado a lado”.
Li essa citação há muito tempo,
há 51 anos, na edição de 2 de outubro de 1965 da revista “O Cruzeiro”, que há
muito já não existe. O Prêmio Nobel da Paz de 1952 disse essas palavras a
respeito da esposa, Helena Breslau, que o acompanhou até o último momento nesse
seu sublime sacerdócio. E elas foram citadas pela repórter Leda Barreto, na
matéria “Schweitzer, morre um feiticeiro branco”, publicada pela referida
revista.
É essa luz interior que busco
todos os dias, quando me preparo para escrever, o que faço, pontualmente, há
mais de quatro décadas, profissionalmente ou não. Não sei se já consegui
estabelecer, em alguma ocasião, essa empatia com o leitor, mas continuo
tentando. Para isso, cultivo o mais que posso o otimismo e valores positivos,
mesmo quando as circunstâncias me aprontam das suas.
Não tenho o direito de ser
pessimista, amargo ou desanimado e muito menos de difundir esses sentimentos
através dos meus textos! E isto até por um motivo egoísta, para a preservação
da minha saúde, pois como constatou o filósofo norte-americano Will Durant, em
seu clássico “Filosofia da Vida”: “A fé, a esperança e o amor parecem
expandir-se em cada célula do nosso corpo; a dúvida, o medo e o ódio
contraem-nos os tecidos, como se fossem venenos – e fisicamente são venenos”.
Como não quero me envenenar e muito menos envenenar meus leitores... procuro
seguir a trilha do bom-senso.
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