Saturday, September 30, 2006

REFLEXÃO DO DIA


“O traje não faz o monge”, diz conhecido dito popular, citado e repetido amiúde, quando se quer ilustrar o quanto as aparências costumam enganar quem está habituado a tirar conclusões apressadas sobre os semelhantes, baseado, apenas, no que vê. E, em certa medida, todos nós, uma vez ou outra, agimos dessa maneira. Medimos a capacidade, e até a “respeitabilidade” (quando não a projeção profissional e/ou social) de uma pessoa, apenas pela forma como ela se veste. Fazemos, por conseqüência, juízos apressados (quando não ridículos), baseando-nos, somente, no aspecto exterior de alguém, naquilo que é passivo de ser disfarçado, ou imitado. Há, inclusive, quem faça desse comportamento uma espécie de regra (e não são poucos). E, claro, cometem equívocos monumentais. E como se enganam!

Promessas e lembranças


Pedro J. Bondaczuk

Doce amada, há tanta promessa em seu olhar!
Há magia, há ternura, há tanto encantamento,
que jamais poderei esquecer o momento
em que nos amamos sob a luz do luar.

Nossos corpos febris, em perfeita harmonia,
nossas almas fundidas, num só ideal,
nos seus olhos profundos, atônito, eu via
a ciência vedada do bem e do mal.

Como esquecer aquele instante de beleza,
de místico êxtase que nos dominava,
que era incomparável em toda a natureza?!

Repetir aquele instante, ó Deus, quem me dera!
Era noite clara...ao longe, um mocho piava.
O mundo despertava...era primavera!

Friday, September 29, 2006

REFLEXÃO DO DIA


A rigor, não conhecemos, sequer com razoável aproximação, "o que" sentimos ou "o que " nos inquieta. É uma sensação vaga, imprecisa, intermitente e por isso irremediável. Nossa busca pela razão está apenas no princípio, embora, de maneira arrogante, achemos que somos sumidades de racionalidade. Nossa distância mental com os animais irracionais, no entanto, é ínfima, é muito reduzida. A pior das solidões é a que sentimos quando acompanhados, no meio de uma multidão. Não se trata de uma questão quantitativa, mas de compreendermos os outros e nos fazermos compreendidos por eles. Maridos e mulheres, pais e filhos, irmãos, parentes de quaisquer graus ou amigos, por mais íntimos que sejam, por maior afinidade que tenham conosco ou por mais que necessitemos de suas presenças, jamais nos completam. A maioria dos sentimentos, emoções, medos e inquietações temos que suportar de forma absolutamente solitária.

Questão de nome


Pedro J. Bondaczuk


O nome de uma pessoa – embora sua escolha não dependa dela e seja imposto pelos pais no momento do registro em cartório, logo depois do nascimento – é importante fator de identificação, embora nem sempre seja original. Há milhões de casos de homonímia, que causam enorme confusão e muitas vezes dão dores de cabeça muito grandes ao cidadão. Por exemplo, quem conseguiria catalogar todos os que se chamam José da Silva no País? E nem é preciso abrangência tão ampla. Quantos, em Campinas (a cidade em que moro), são chamados dessa maneira? Tentem contar em uma lista telefônica!
No mesmo caso estão os John Smith, nos Estados Unidos. Ou os Ivans, na Rússia. Ou outros tantos nomes que são mais do que comuns em várias partes do mundo. Mas as obras de um indivíduo – única coisa que lhe sobrevive caso tenha de fato alguma que seja consistente e que mereça ser lembrada – se associam ao nome e nunca à imagem. Muitos não gostam do seu e, na idade adulta, o trocam no cartório. Alguns adotam pseudônimos, com os quais passam para a posteridade.
Estão, neste caso, artistas, esportistas e políticos famosos. Quem conhece, por exemplo, Allen Stewart Konigsberg? Pouquíssima gente sabe de quem se trata. Talvez essa pessoa seja conhecida dessa maneira só pelos parentes mais chegados e amigos mais íntimos, quando muito. Agora se dissermos que se trata do ator e diretor de cinema Woody Allen, a coisa muda de figura. Quase ninguém irá alegar desconhecimento, a menos que se trate de um sujeito extremamente mal informado.
O mesmo ocorre com Frederic Austerlitz (Fred Astaire), Dóris Kapelhoff (Dóris Day), Lucy Johnson (Ava Gardner), Marion Morrison (John Wayne) ou Joseph Levitch (Jerry Lewis), entre outros. Como se vê, o nome fica imediatamente associado àquilo que o seu detentor faz, de bom ou de mau, e é o primeiro referencial para a sua identificação, quer na vida social no dia a dia, quer para a posteridade, dos que conseguem vencer a "segunda morte": a da memória. Quanto mais original for, portanto, mais chances terá de ser lembrado dentro de vinte, trinta, cinqüenta, cem, quinhentos ou mil anos.
Um casal sueco, no entanto, exagerou na dose de originalidade. Registrou o filho, nascido na cidade de Gotemburgo, com 39 consoantes (muitas das quais repetidas três ou quatro vezes) seguidas do número 11116, uma coisa absolutamente ilegível e sem nenhum sentido. Foi exatamente dessa forma que o garoto foi chamado e registrado. Claro que o caso despertou repercussão na imprensa, não apenas da Suécia, mas do mundo todo. A princípio, pensou-se que algum funcionário do cartório tivesse empastelado a certidão de nascimento. Por isso, os pais foram convocados para esclarecer tudo. Perante o tabelião, confirmaram que era exatamente dessa forma que queriam chamar o menino.
Logo o caso caiu no esquecimento. Cinco anos depois, o garoto continuava sem nome. Afinal, essa sucessão de 44 caracteres é ilegível e impronunciável. Ninguém pode se chamar dessa forma, embora ela seja, convenhamos, originalíssima (para não dizer maluca). O casal foi intimado para proceder à mudança e denominar o filho de forma digna e civilizada. Por manter-se irredutível, porém, acabou multado em 5 mil coroas suecas (o equivalente a US$ 735). Quando parecia que os pais do jovem sem nome iriam parar de brincadeira e alterar o registro, os dois resolveram recorrer da multa em um tribunal de recurso fiscal da cidade.
Seus advogados argumentaram que o casal tem crenças esotéricas e que a sucessão de letras e números, na verdade, tem um significado lógico: "Albino". O juiz indagou: "Por que, então, vocês não registraram o filho dessa maneira?". "Porque ele teria azar na vida", responderam. "A formulação é mágica", acrescentaram. Sem comentários... Claro que o tribunal não levou a sério esta e outras argumentações. Entendeu – se com razão ou não nunca se vai saber – que o nome não passava de brincadeira de mau gosto, de uma enorme "sacanagem" com a criança.
Por isso, confirmou a multa e mandou o cartório fazer um novo registro do menino. O nome que passou a constar na certidão é Albino. Uma das argumentações do casal, quando da apresentação do recurso, retirada do processo (ao qual a imprensa teve acesso) é esta "pérola" de ambigüidade: "Os caracteres utilizados são de uma formação pletórica de sentido e tipograficamente expressionista, que nos parece uma nova criação artística". Pobre garoto! Se em uma coisa tão simples, quanto a escolha do nome, houve tanta confusão, o que não deve ocorrer na sua convivência com esses pais? De fato, a ficção jamais conseguirá superar a realidade em termos de coisas insólitas...Ou malucas...

Thursday, September 28, 2006

REFLEXÃO DO DIA


No silêncio do meu quarto, às voltas com minhas indefiníveis inquietações, pensando nas pessoas que sofrem de males mais palpáveis e concretos do que os da solidão, como fome, frio, dores provocados por doenças incuráveis e pelos maus tratos recebidos da vida, carentes de absolutamente tudo e muitas vezes ansiando, desesperadas, por alguém que somente as ouça, as valorize e as trate uma única vez com dignidade e respeito, faço, ansioso por uma resposta que sei de antemão que não terei, a mesma pergunta que o compositor Paul McCartney fez, na inspirada letra da canção "Eleanor Rigby", sucesso dos Beatles: "Haverá um lugar especial para os solitários?" Ou, para ser mais preciso em relação aos meus anseios, indago: "Haverá um lugar especial onde possamos estabelecer comunicação total com os semelhantes, sem precisar de palavras?" Fica a pergunta no ar...Mas acredito que não!

Autógrafo genético


A realidade é mesmo mais absurda do que a mais louca das ficções. Quem vive de olhos e ouvidos atentos sabe bem disso. Folheando uma das pastas da minha hemeroteca, com recortes de jornais diários, encontro uma informação, publicada em 1997, no mínimo insólita. É o tipo da notícia que em jornalismo se classifica de "homem mordendo o cachorro". Merece, evidentemente, destaque, já que o usual seria ocorrer exatamente o contrário.
Está na coluna do dia 21 de setembro desse ano do então correspondente do "O Globo" nos Estados Unidos (não sei se ainda o é, acho que não), José Meirelles Passos. O jornalista nos informa que estava virando moda, na ocasião, na terra de Tio Sam, pessoas colecionarem "autógrafos genéticos"!!! Ora, vejam só...
A idéia, grande sucesso comercial conforme o colunista, foi do cientista Kary Mullis, da Califórnia. O pesquisador, que ganhou o Prêmio Nobel de Química de 1992 (portanto, não se trata de um maluco excêntrico qualquer, mas de alguém qualificado), reproduziu o DNA (em português a sigla é ADN, de Ácido Desóxirribonucleico), de personalidades mundiais, como Albert Einstein, Elvis Presley, Marylin Monroe, James Dean e até de Abraham Lincoln e do líder da independência norte-americana e primeiro presidente desse país, George Washington. A reprodução foi feita a partir de fios de cabelo desses homens famosos, adquiridos de colecionadores.
Para organizar o negócio – dos mais lucrativos, a julgar pelo faturamento previsto para aquele ano, de US$ 100 milhões – criou-se, inclusive, uma empresa, a Stargenes (que nem sei se ainda existe). O DNA, uma espécie de "impressão digital" do indivíduo, já que não há dois exatamente iguais, era reproduzido de acordo com a procura (alguns aos milhões, como no caso de Elvis Presley e outros em quantidades consideravelmente menores) e colocado em anéis e brincos, que eram posteriormente vendidos.
É o cúmulo da "tietagem" e ainda por cima post-mortem. É ou não é uma coisa maluca? Jamais soube de qualquer escritor que previsse, em seus contos, romances ou novelas, algo sequer parecido. Mas a realidade engendrou esse comércio inútil.
Qual a razão de tamanha procura por objetos pessoais e autógrafos (agora partículas) de pessoas famosas? No fundo, no fundo, é o desejo de compartilhar notoriedade, talvez achando, no subconsciente, que a criatividade é como um vírus, capaz de contaminar pela proximidade. Infelizmente não é. A burrice talvez seja...
Trata-se de uma tentativa (inútil) de guardar algo precioso de indivíduos bem sucedidos. O doutor Howard Rusk, num artigo que li há muitos anos, sugere, no entanto, coisas mais palpáveis que deveriam ser colecionadas. Destaca: "Há tanta coisa neste mundo que todos poderiam alcançar e tocar e guardar consigo, para si mesmos, e espalhar entre todos os outros! Não é dinheiro – porque o dinheiro só serve pelo que possa fazer – e só é bom se é usado para ajudar. Mas as pessoas poderiam procurar bondade e retidão...e poderiam espalhar bondade e retidão em volta de si, para os outros".
Essas pessoas famosas deixaram seus "autógrafos", a marca de seu talento, o registro de sua genialidade, nas obras que legaram à humanidade, não importa se científicas, políticas ou artísticas. Isto é o que conta. Por causa disso é que são lembradas e têm o nome imortalizado. Pois como dizem os versos de Ezra Pound – internado em um hospício, por haver apoiado o nazi-fascismo durante a Segunda Guerra Mundial – do alto do seu sábio inconformismo: "Ao piparote dos anos tudo rola em ruinas./ Fica de pé o gênio, ornamento imortal, um nome feito/ para não desgastar-se ao decurso dos anos". Autógrafo genético...querem bobagem maior?!

Wednesday, September 27, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Temos quatro maneiras de sair desse "labirinto" de mediocridade em que nos metemos quando não temos um objetivo de vida coerente e definido: fugir, lutar contra, esquecer ou agir. Ninguém irá decidir por nós. E mesmo que delegássemos essa tarefa, nós é que arcaríamos com as conseqüências. Bem dizia o poeta Carlos Drummond de Andrade: "No meio do caminho havia uma pedra..." Elas existem em profusão na vida de todos...Alguns, descobrem atalhos mais suaves e chegam ao seu objetivo. A maioria recua e aceita passivamente a derrota. Mesmo com chances de vencer...

Além da imaginação


Pedro J. Bondaczuk

O homem, em sua insignificância em relação ao Universo, tem conseguido lampejos de “grandeza” através da razão. Agiganta-se pelo que o distingue das feras broncas: a capacidade de pensar, de refletir, de sonhar, de imaginar, de transformar, de construir coisas novas e extraordinárias, num tempo que, em relação à sua existência individual, pode ser extenso, mas que é ínfimo em termos cósmicos.
Esta foi a conclusão (óbvia) a que chegamos, dia desses, em conversa numa roda de amigos, num dos barzinhos da moda da cidade, onde, amiúde, nos reunimos para, entre um gole e outro de cerveja e um pratinho e outro de tremoço e de fatias de salaminho a título de tira-gosto, “filosofar” e “salvar o mundo” (pelo menos em nossos delírios etílicos).
“Em meros 13 milênios (um quase nada em relação ao tempo universal), o homem deu um salto notável das cavernas às viagens espaciais”, acentuou o Marcelo, que em tudo o que diz dá um jeito de inserir algum dado histórico, seja qual for. E não é de se estranhar quando se sabe que ele é estudante de História, em uma das faculdades da cidade.
Da minha parte, aduzi que, amiúde, futurólogos avançam previsões mirabolantes, que mais parecem insanos delírios, tamanha é a ousadia do que prevêem. E, ainda assim, a maior parte dessas projeções do futuro se apequena e se torna modestíssima face ao que, de fato, é conseguido. “Isto aconteceu, por exemplo, com Júlio Verne. Quando o escritor francês previu a construção de um submarino movido a energia nuclear, numa época em que os mais íntimos segredos do átomo sequer haviam sido desvendados, pessoas ditas de bom-senso torceram o nariz. Disseram que a previsão não passava de inútil fantasia. Era, pelo menos, o que objetivamente parecia. Passado menos de um século, todavia, isso se tornou real quando, em 1954, os Estados Unidos lançaram ao mar o primeiro submarino nuclear da história que, além de tudo, tinha o nome dado por Júlio Verne à sua embarcação: Nautilus. Hoje, o insólito submergível do capitão Nemo não somente é uma realidade, mas ultrapassou, em muito, a mais ousada fantasia do romancista”, disse, em tom pedante, em defesa da minha tese..
E voltei à carga: “O mesmo vale para as viagens à Lua, igualmente previstas pelo romancista francês. Como se vê, o homem continua surpreendendo a ele mesmo, à medida que se conscientiza do seu potencial (que beira o infinito). Nem sempre, pois, os chamados futurólogos são maníacos delirantes, a criar disparates, ou desocupados, que desperdiçam tempo prevendo bobagens. Na maioria das vezes, as maravilhas que prevêem se concretizam de forma muito mais surpreendente do que ousaram prever”.
Marcão, por seu turno, lembrou que Arthur Clarck, no fim dos anos 70 do século passado, traçou um panorama a respeito dos avanços da ciência, em que relacionou as conquistas da tecnologia somente no período iniciado em 1800. Lembrou as descobertas que revolucionaram o mundo nos transportes, nas comunicações, na mecânica, na química, na biologia e na física, entre outras tantas disciplinas.
A partir desse levantamento, fez várias extrapolações para o futuro. Contudo, apenas esboçou, timidamente, os benefícios que uma nova disciplina (que então mal começava a ser estruturada) poderia proporcionar para a humanidade: a Engenharia Genética. Na ocasião, as previsões de Clarck foram recebidas (como seria de se esperar) com ceticismo, tanto pela comunidade científica, quanto pelo público. A maioria leiga encarou os prognósticos como “mera curiosidade”, nada mais.
E o Marcão, não contente com a informação que deu, acrescentou detalhes. “Entre outras coisas, Clarck afirmou que a transformação artificial de organismos vivos era factível. Fez, todavia, uma prudente ressalva. Disse que isso ocorreria ‘apenas em futuro bastante remoto’. Previu que os genes de animais viriam a ser manipulados, para a criação de novas espécies. Prudentemente, porém, disse, também, que isso seria possível somente por volta de 2030”.
Resolvi mostrar que havia lido as declarações de Clarck e lembrei que ele sabia que alguma coisa, nesse sentido, já estava sendo tentada por alguns biólogos. “Mas não poderia adivinhar que no mesmo período em que fez suas previsões futurísticas, alguns cientistas já haviam criado, mediante manipulação genética, uma nova raça de animal. Foi na Fazenda El Peludo, na província de Buenos Aires, na Argentina. Um veterinário local conseguiu desenvolver um minipônei, do tamanho de um cão de porte médio, com longevidade que era o dobro da dos cavalos comuns”, aduzi, pois havia lido sobre essa experiência na revista “Enciclopédia Ilustrada”.
Não me contive, e voltei à carga, crente que estava abafando: “Hoje, a despeito de agirem com grande cautela, em um campo cheio de mistérios e de segredos, os cientistas já têm como reproduzir seres vivos a partir de qualquer célula de seu organismo (e não apenas das sexuais). Uma vacina contra a hepatite B, por exemplo, foi elaborada por esse método. E os avanços não param de acontecer. A clonagem de animais é uma realidade. E a de seres humanos é potencialmente possível (embora eticamente não desejável). Pesquisas com células-tronco são bastante promissoras. Vacas minúsculas, de poucos centímetros de altura e com produtividade média de 3,5 litros de leite por dia, já existem. Outras, de tamanho gigantesco, capazes de produzir 40% a mais de carne do que as de porte normal, foram desenvolvidas mediante simples tratamento hormonal”.
O Zito, que até então havia ficado calado, e que tinha manias de sociólogo, interveio na conversa e disse, o que todos acharam que foram palavras bastante sensatas: “O que se espera é que esses avanços da Engenharia Genética possam ser compartilhados por toda a humanidade, e não apenas por pequenos e poderosos grupos ou por países que contem com mais recursos, como Estados Unidos, Japão e Alemanha. Que possam servir de meios para erradicar, por exemplo, doenças hoje consideradas incuráveis e, principalmente, a fome e a miséria no mundo. Que esse salto tecnológico jamais se transforme em mais uma forma de dominação do rico sobre o pobre, do forte sobre o fraco. Porque, se há um campo, no qual o homem pouco evoluiu (e, provavelmente, até regrediu), este é o da ética”.
Nisso, um mendigo aproximou-se da mesa onde se desenvolvia nossa conferência de cúpula para salvar o mundo, de olho, claro, no prato de salaminho. Zito, que acabara de fazer veemente defesa dos pobres, disse, revoltado: “Sai pra lá, cara!”. E gritou para o garçom: “Tire esse ligeira daqui! Esse bar está ficando uma merda! Entra quem quer!”.
Aproveitei a deixa para dar uma de moralista: “A solidariedade está, mesmo, em baixa. Cada vez mais dá lugar à cobiça e ao preconceito”. E, olhando de viés para o Zito, arrematei: “Algumas pessoas, ao que parece, se esqueceram que precisam umas das outras e que, sozinhas, não são ninguém. Não querem se dar conta de que a razão e a fonte da sua sobrevivência estão no convívio justo, harmonioso, solidário, cooperativo e constante com seus parceiros de espécie”.
“Belo discurso, Pedrão”, Zito respondeu, entre irônico e irritado. “Leva ele para casa!”, acrescentou, referindo-se ao mendigo e com cara de pouco amigo. O incidente propiciou-me uma reflexão final, antes que nos dispersássemos, dado o adiantado da hora e já pensando nas desculpas que daríamos às nossas respectivas esposas. “Não há porque não confiar no homem. Gerações, certamente, vão se suceder, até que se promova a indispensável revolução de consciências. Injustiças, violências, contradições e mortes inúteis e desnecessárias deverão ocorrer ainda, em grande profusão. Mas todo o aprendizado do homo sapiens, em termos de comportamento, deu-se por processos traumáticos. Dos traumas, erros e acertos, porém, nasceram as civilizações. Felizmente, há, também, quem pense como Horace Mann, que dizia ‘tenho vergonha de morrer enquanto não tiver conquistado alguma vitória para a humanidade’”.
Lá no fundinho da consciência, no entanto, uma voz incômoda e insistente me desafiava: “Por que não dar o exemplo e não oferecer todo o prato de salaminho ao mendigo, que tanto o deseja?” Para aliviar o remorso, fiz mais do que isso. Pedi ao garçom que fizesse o maior e melhor sanduíche da casa para o infeliz que interrompera nossas inúteis reflexões. E saí do bar com uma certeza (que talvez não fosse mais do que mero desejo): ainda há esperança... Será?!!!

Tuesday, September 26, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O homem tem que definir objetivos para a sua vida, sem os quais não chegará a lugar algum, a não ser ao destino comum de todos os seres viventes, animais ou vegetais: a morte. Esta é a única certeza que temos. Nossa jornada no mundo caracteriza-se pelo incerto, pelo desconhecido, pelo casual. Para traçar rumos corretos, é necessário que as pessoas entendam que vivem por alguma razão e que esta não se restringe a comer, beber, dormir, reproduzir-se e morrer, para que sua descendência percorra o mesmo ciclo indefinidamente, buscando apenas conquistas materiais e a satisfação dos sentidos. Não é por acaso que esse ser complexo e ainda primitivíssimo (em termos de relacionamento) é dotado de razão e livre-arbítrio. Possui essas características para promover o próprio desenvolvimento mental e espiritual (entendendo-se aqui "espírito" como a essência do indivíduo) e, por conseqüência, o da espécie.

Arte compartilhada




Pedro J. Bondaczuk


O diretor de cinema norte-americano Paul Schrader – que tem em seu currículo, entre tantos outros, filmes como “Auto Focus” (2002), “Temporada de caça” (1997) e “A marca da pantera” – disse, certa feita, em entrevista, uma frase que, embora óbvia, nunca se apagou da minha mente. Declarou: “A arte é sempre maior que a vida”. Claro que tinha razão. As obras que produzirmos, desde que originais e de qualidade, nos sobrevivem, por décadas, por séculos, por milênios, quem sabe até para sempre (embora esse “sempre” não deixe de ser ambíguo).
Isto ocorre, como garantiu o psicanalista Carl Gustav Jung, por uma causa fundamental: Porque “o artista é um homem coletivo que exprime a alma inconsciente e ativa da humanidade”. É, pois, o que sabe expressar (e, de fato, expressa), com o signo próprio e característico da sua arte (pintura, música, escultura, dança, literatura, não importa), as angústias, perplexidades, sonhos, misérias e grandezas de um povo; da pessoa comum e não raro inculta, que sente tudo isso, com grande intensidade, mas que não tem como concretizar esses sentimentos em imagens, sons, movimentos ou palavras.
Tenho o privilégio, porém, de privar da amizade de uma pessoa que é perita, em sua modalidade artística, em desvendar esses desvãos escuros e sombrios da alma humana e os revelar plenamente à luz. Trata-se do artista plástico José Luís Piassa, que em julho passado foi, finalmente, reconhecido pela Câmara Municipal de Campinas, que lhe outorgou, com absoluta justiça, a Medalha Carlos Gomes, por sua contribuição para as artes e a cultura da cidade.
Fomos colegas de trabalho no jornal Correio Popular, posto que em funções diferentes. Mas cruzávamo-nos, amiúde, e não tardou para que firmássemos sólida e produtiva amizade. Mantivemos longas e agradáveis conversas sobre nossas respectivas visões de mundo e nossos projetos artísticos. Nunca vi ninguém com tamanho entusiasmo pelo que faz como esse criador sensível e originalíssimo, talentoso e idealista.
Foi com satisfação redobrada, pois, que fiquei sabendo do sucesso dos seus totens “Pergaminho Filosófico-Cultural”, espalhados pelo Brasil afora, embora pouco divulgados pelas mídias tradicionais. Há cerca de vinte anos, quando eles ainda não passavam de meros projetos, Piassa já falava, entusiasmado, com os olhos brilhando, a respeito dessa sua idéia. Na oportunidade, embora nunca lhe tivesse dito, duvidei que sua intenção de levar o melhor das artes para os grotões deste país-continente fosse prosperar. E não é que meu amigo artista conseguiu!
Claro que voltarei outras vezes ao tema, para explicar no que consistem esses “Pergaminhos Filosófico-Culturais”. Cabe, aqui, um parêntese para explicar o que são totens. Trata-se de uma forma de manifestação que remonta ao princípio da civilização. São símbolos associados, em geral, a uma linhagem familiar, uma tribo, um grupo, uma empresa, ou até a times de futebol. Referem-se, via de regra, a um espírito ancestral. Não se prendem a formas e podem aparecer como uma pedra, ou como uma planta, ou como uma força ou até como o vento ou o trovão.
Os totens de Piassa são compostos por colagens, grafismo, textura e pintura. São interativos e contam com a participação direta de membros de determinadas comunidades na sua composição. É o próprio artista que explica como eles são elaborados: “É permitido livre acesso às crianças, aos jovens e adultos, que interagem na obra, de forma a obter um resultado plástico”, diz. E acrescenta: “Outro aspecto importante, que começa a aparecer, se refere à relação entre pintura, colagem, objeto, instalação e intervenção. Tudo leva a uma noção de ambiente, de criação de uma atmosfera onde a vida, a mais comum possível, possa ser vivida e experimentada graficamente, seja na garatuja da base, seja nas intervenções em relevo no corpo que compõe o totem. São campos de energia cromática, de formas, que se propagam e que nos convidam a uma leitura táctil. É um mundo de cores para ser sentido na pele”.Piassa conta, nesse seu original e bem-sucedido empreendimento, com o indispensável apoio do secretário de Programas e Projetos Culturais, Célio Turino, e do próprio ministro da Cultura, Gilberto Gil, que prestigiaram a inauguração de vários dos totens em Pontos de Cultura espalhados pelo País afora. O meu amigo artista, portanto, mais do que nunca, é, simultaneamente, veículo e agente da expressão da alma inconsciente e ativa da humanidade, ou de, pelo menos, parcela expressiva dela.

Monday, September 25, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos: Arquivo)

FIM DE SEMANA DE FRACASSOS

O futebol de Campinas teve um fim de semana daqueles! Seus três times profissionais perderam, nas respectivas competições que disputam. Derrotas são todas iguais, não há melhores ou piores. Mas diria que aquela que trouxe mais prejuízo foi a da Ponte Preta, ontem, para o Cruzeiro, por 1 a 0. E justifico com pelo menos três argumentos: a) Ocorreu em casa, em pleno Moisés Lucarelli. b) Era um jogo de seis pontos, já que o adversário tinha pontuação pouca coisa maior do que a da Macaca. c) A Ponte foi superior ao adversário, mas perdeu um caminhão de gols. Quando da derrota para o Grêmio, na quarta-feira, em Porto Alegre, por 4 a 0, afirmei que, apesar da goleada, esse era um jogo que o time poderia perder. O mesmo, todavia, não se pode dizer em relação ao Cruzeiro. A Macaca tinha a obrigação de conquistar esses três pontos, que agora precisará buscar na casa dos adversários. Mas qual deles? Todos são verdadeiras “pedreiras” quando jogam em seus domínios. Foi uma derrota terrível, em termos de classificação.

GUARANI ESTÁ A PERIGO

A derrota do Guarani, sábado, em Jundiaí, para o Paulista, por 2 a 1, em outras circunstâncias que não as atuais, poderia ser considerada normal. Poderia, mas não foi o caso. E por que? Porque se tratou da quarta derrota consecutiva do time, que o colocou na rabeira da Série B, muito próximo de Ituano, São Raimundo, Remo, Ceará e Portuguesa, que lutam, com todas as forças, para fugir ao rebaixamento. O mais doído para a torcida é que o time jogou bem, dominou seu adversário, mas a exemplo da Ponte diante do Cruzeiro, o ataque bugrino perdeu uma infinidade de gols. Grossura? Falta de técnica? Não! Foi pura afobação. Os resultados negativos, que se acumulam, um após outro, tiram a confiança dos jogadores. Ademais, o atual time do Guarani carece de experiência. É um grupo bastante jovem e que não conta com um líder dentro de campo, que facilite as coisas. Agora é ganhar ou ganhar do Marília, seu próximo adversário, no Brinco de Ouro, onde a bruxa volta a rondar.

SÍNDROME DAS FINAIS

O Campinas há já um bom tempo ronda a zona de acesso para a Série A-3 do Campeonato Paulista. Faz, em geral, excelente fase de classificação, quando nem toma conhecimento dos adversários. Mas quando chega a hora decisiva... No momento da verdade, o time desanda, e deixa escapar por entre os dedos essa importante conquista. Foi assim no ano passado, quando deixou fugir, de maneira não explicada até hoje, e em casa, a chance de galgar mais um degrau em sua ainda curta história. Ontem, no jogo de estréia da fase decisiva, disputado em Mogi das Cruzes, diante do invicto União Mogi (único time da competição que ainda não perdeu), o Campinas até que começou muito bem. Abriu o marcador e parecia que iria trazer para casa esses importantíssimos três pontos. Não trouxe. Perdeu, de virada, por 2 a 1. Espero que o resultado não abata os jogadores do Águia, pois tenho a intuição de que este será o seu ano. Seria muito bom para a cidade ter um time em cada série da Primeira Divisão do Campeonato Paulista.

O QUE OCORRE COM O IRAN?

Do atual time titular da Ponte Preta, o jogador no qual a torcida depunha a maior esperança de estourar na competição e a diretoria de render, num futuro muito breve, recursos aos cofres do clube, era o lateral-esquerdo Iran. Limitado, tecnicamente, supria suas deficiências com muita garra e muito pulmão. Começou a se destacar no final do Campeonato Paulista e, no início do Brasileirão, teve performance arrasadora. Chegou a ser o artilheiro do time, recebendo elogios gerais, do treinador, da imprensa, dos companheiros e da torcida. De repente...Bastou receber elogios do técnico Wanderley Luxemburgo, que chegou a insinuar a possibilidade do Santos contratar o atleta, para que tudo desandasse. Hoje Iran não é nem sombra daquele jogador valente, fogoso, que entusiasmava o time e os torcedores. Arrasta-se em campo, marca mal, cruza bolas de forma equivocada, não acerta um passe e arremata de maneira horrorosa. No jogo de ontem, contra o Cruzeiro, voltou a repetir suas péssimas apresentações, perdendo um gol feito, que trouxe sérios prejuízos à Macaca. É certo que Tuto também perdeu (e não apenas um mas três) e Luís Mário desperdiçou duas chances preciosíssimas. Os dois, no entanto, pelo menos batalham o jogo todo. Mas o Iran...

FUTEBOL PAULISTA EM BAIXA

O futebol paulista, que já contou com oito representantes na Série A do Campeonato Brasileiro, atravessa uma fase horrorosa. Dos seis times que restaram na elite nacional (Portuguesa e Guarani foram rebaixados), quatro (São Caetano, Ponte Preta, Corinthians e Palmeiras) estão na rabeira da tabela, com possibilidades de pelo menos dois deles irem para a Série B no ano que vem. É verdade que um paulista, o São Paulo, lidera a competição, mas está em nítida decadência técnica. Caso continue apresentando o mesmo futebol que apresentou ontem, em Presidente Prudente, na derrota para o Palmeiras, por 3 a 1, logo, logo estará lutando por meras posições intermediárias. Continua líder apenas pelos pontos que acumulou no início do campeonato. E o Santos, outro representante do Estado, faz uma campanha apenas discreta e graças, somente, ao talento do seu treinador, Wanderley Luxemburgo, que faz milagres com os jogadores que tem. É muito pouco, convenhamos. Está na hora, pois, dos paulistas abrirem o olho e provarem que o Estado ainda tem o melhor futebol do País. Ou não tem mais?!

DECADÊNCIA TAMBÉM NA SÉRIE B

Por falar em decadência do futebol paulista, ela também se manifesta na Série B do Campeonato Brasileiro. Vários dos seus times, que brigavam há não muito pelo acesso, estão fora da competição neste ano, casos do Bragantino (que já foi vice-campeão nacional nas mãos de Carlos Alberto Parreira), do Mogi Mirim, do União São João, do União Barbarense e, há já um bom tempo, do Botafogo de Ribeirão Preto, que hoje se transformou num clube modesto, que briga só para se manter na Série A-2 do Campeonato Paulista e nada mais. Times como o Guarani, a Portuguesa e o Ituano, por sua vez, lutam desesperadamente para não cair para a Série C. Tudo isso seria mera coincidência? Duvido! Compete aos dirigentes e à imprensa descobrirem o que vem ocorrendo e cobrarem providências urgentes. Como está, não pode mais continuar.

RESPINGOS...

· E não é que o Santa Cruz voltou a respirar no Campeonato Brasileiro da Série A! Em apenas quatro dias, conquistou seis pontos em seus domínios (3 a 2 no Palmeiras, na quinta-feira, e 1 a 0 no Juventude, ontem).
· O Fortaleza também ganhou um pouco de fôlego, ao surpreender o Fluminense, em pleno Maracanã, e ganhar, no sábado, do tricolor carioca por 3 a 1.
· O recorde de público deste ano, que estava com o Bahia, passou para as mãos do Atlético Mineiro. Sábado, no jogo contra o Sport, o Mineirão recebeu 41 mil fanáticos atleticanos. O clube mostrou, mais uma vez, a força da sua torcida.
· O Grêmio foi a surpresa negativa da rodada. Após golear a Ponte Preta, na quarta-feira, por 4 a 0, no Estádio Olímpico, experimentou ontem o próprio veneno e foi goleado, pelo mesmo placar, no Estádio Serra Dourada, em Goiânia, pelo desesperado Goiás.
· O Paraná, próximo adversário da Ponte Preta, depois de uma série de insucessos, voltou a fazer as pazes com a vitória e está de novo na zona de classificação para a Libertadores do ano que vem. É o time mais surpreendente (para o bem e para o mal) dos 20 que disputam o Brasileirão.

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


Todo o conhecimento que adquirimos só tem lógica e razão de ser quando revertido em benefício da preservação e evolução da espécie. A pessoa apenas se realiza e justifica sua existência quando vive em função do próximo. É o único caminho sensato que conduz à realização pessoal e à felicidade. Leon Tolstoi constatou, em “Guerra e Paz”: “Todo conhecimento é apenas adaptação da essência da vida às leis da razão”. O egoísmo, pois, é o maior exercício de burrice e de inutilidade que alguém pode praticar. Servir é poder, ao contrário de ser servido, que significa dependência.

Garimpeiros de sonhos


A ex-primeira-dama dos Estados Unidos, Eleonor Roosevelt, afirmou, em certa ocasião, que o “futuro pertence àqueles que acreditam na busca dos seus sonhos”. É preciso sonhar alto para se alcançar a grandeza. Mas não se restringir apenas a isso, porém agir, efetiva, constante e construtivamente para dessa matéria-prima abstrata criar uma realidade concreta. Felizmente, apesar do justificado clima de desencanto da população e do injustificado derrotismo que toma conta de milhões de pessoas, há muitos, muitíssimos brasileiros que, mesmo abandonados à própria sorte, desassistidos pelos que competiam lhes dar assistência, discriminados por uma sociedade onde as desigualdades se acentuam e perenizam, são verdadeiros caçadores de sonhos.
São médicos que deixam o conforto e o luxo das grandes cidades, para praticar seu ofício onde mais se precisa dele. São professores que batalham anonimamente, nas aldeias mais remotas deste país-continente, para educar, instruir e orientar homens rudes, no ingente esforço de os integrar no mundo moderno. São pesquisadores que, carentes de recurso, buscam queimar etapas, sonhando em tirar o Brasil do atraso tecnológico e reduzir sua dependência em relação ao Primeiro Mundo.
Embora os que moram nas grandes metrópoles não acreditem que ainda haja gente assim, felizmente há. E não são poucos os idealistas, cujos esforços mantêm o País funcionando. Há os abnegados que ainda acreditam nos seus sonhos e agem para que eles vinguem. Infelizmente, tais brasileiros são anônimos. Não ganham, via de regra, espaço nos meios de comunicação. Fossem políticos corruptos, banqueiros do jogo-do-bicho, excêntricos inventando modismos passageiros ou degenerados sexuais dados a escândalos, quando não traficantes, seqüestradores ou ousados assaltantes, é provável que freqüentariam as manchetes.
Mas são homens e mulheres que resgatam nossas esperanças, embora raramente lembrados, e buscam, através de obras, conquistar seu espaço. Joseph Pulitzer acentuou que “o único cargo que...um homem em nosso mundo pode desempenhar com êxito pelo simples fato de ter nascido é o de idiota”. Benditos garimpeiros de sonhos, “donos do futuro!”.

(Capítulo do livro “Por uma nova utopia”, Pedro J. Bondaczuk, páginas 137 e 138, 1ª edição – 5 mil exemplares – fevereiro de 1998 – Editora M – São Paulo).

Sunday, September 24, 2006

REFLEXÃO DO DIA


A absoluta maioria das pessoas vive sem saber porque e, principalmente, “para que”. Despende o melhor de sua capacidade e suas energias, tanto físicas, quanto mentais, em busca de miragens, de fantasias, de ilusões, ou seja, do que entendem como “riqueza”. Esta mensagem, divulgada há algum tempo pelo Greenpeace, na internet, deveria ser objeto de reflexão permanente, diária, de cada um de nós. Diz: “Quando a última árvore tiver caído, quando o último rio tiver secado, quando o último peixe for pescado, vocês vão entender que dinheiro não se come”. Será preciso chegarmos a tanto para salvar nosso pobre Planeta, que pede socorro, sem que ninguém o ouça?!

Maldição do tetra


Pedro J. Bondaczuk


A morte de Ayrton Senna priva o esporte brasileiro de um dos seus raros ídolos ainda em atividade e o maior deles desde 1984, quando começou a correr na Fórmula 1. Todavia, morreu somente o homem, cumprindo, embora de forma prematura e trágica, um destino comum a todo ser humano. O mito, certamente, não morrerá jamais. Permanecerá nos corações daqueles que o amaram e até daqueles que não morriam de amores pelo nosso campeão.
Figuras como Senna, como Garrincha (o Mane das pernas tortas, que acabou seus dias na indigência) e principalmente como Pelé, mais vivo do que nunca, jamais se apagarão da memória dos brasileiros. O mesmo vale para Eder Jofre, Maria Esther Bueno, Joaquim Cruz, Zequinha Barbosa, Adhemar Ferreira da Silva, João do Pulo etc.
São heróis em suas atividades, num país tão carente deles. Embora sejam insubstituíveis, deixaram um exemplo positivo, que certamente vai frutificar. A morte de Senna causou maior impacto por ele estar ainda em plena atividade, no vigor dos 34 anos, com amplas chances de quebrar todos os recordes possíveis e imagináveis no automobilismo. Se o faria ou não, a partir de agora ficará restrito, somente, ao terreno da especulação.
A verdade é que nos últimos anos, o piloto paulistano era o melhor dos embaixadores de que o País dispunha. Os brasileiros orgulhavam-se dele e ele revelava um orgulho imenso de ter nascido no Brasil. Uma imagem que jamais vai se apagar da minha retina é a de Senna encostando a sua Lótus negra junto a um muro, no circuito de rua de Phoenix, no Arizona, apanhando junto a um espectador uma bandeira verde e amarela, após uma suada e então surpreendente vitória, e rodando por todo o circuito, exibindo-a para todos.
Era o dia 22 de junho de 1986. Na véspera, a seleção brasileira havia sido eliminada pela da França, na Copa do Mundo do México, na cobrança de penais, Reinava entre a torcida um imenso baixo-astral. O jovem piloto devolveu-nos, na oportunidade, e em dezenas de outras, o nosso orgulho, ferido nos campos de futebol.
Um mito como esse é imortal, embora jamais venhamos a tê-lo novamente entre nós. Que sua morte encha nossos esportistas de brios e assim eles obtenham, em pistas, quadras, ringues, piscinas e campos, o mesmo sucesso desse brasileiríssimo Ayrton Senna, cujo sobrenome era da Silva...Que nos estádios dos Estados Unidos, a partir do próximo mês, nosso selecionado acabe, de vez, com a “maldição do tetra”.
Aliás, essa parece uma sina do esporte brasileiro. Depois da conquista do tricampeonato no México, estamos na fila há longos 24 anos, quase um quarto de século, para sermos outra vez campeões. Nelson Piquet, que tinha a chance de, na Fórmula 1, conseguir essa façanha, se afastou dessa categoria.
E agora essa...O nosso Senna morto...Parece um pesadelo, um sonho mau, do qual venhamos a acordar a qualquer momento e rir de nossas aflições. Infelizmente não é. O corpo do jovem piloto será sepultado na São Paulo em que nasceu e tanto amou. Seu espírito, não. Terá sempre o primeiro lugar no pódio do nosso coração. Sua sepultura será, parodiando o escritor argentino Jorge Luís Borges, “o ar insondável...”.

(Crônica publicada na página 2, do caderno de Esportes do Correio Popular, em 3 de maio de 1994).

Saturday, September 23, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Raramente são os melhores, em suas respectivas áreas de conhecimento ou profissões, que ocupam as posições de relevância ou melhores remuneradas. E os critérios de escolha (quando existem), quase nunca são seguidos com rigor. Fatores altamente subjetivos, como aparência, comunicabilidade e simpatia, entre outros, têm grande importância nos processos de seleção. Por isso, quem almeja o sucesso não pode, jamais, deixar escorrer por entre os dedos, como finos grãos de areia, qualquer oportunidade, por mínima que seja, ou mais banal que pareça. Precisa, sempre que possível, dar uma providencial "mãozinha" ao acaso. Nosso aperfeiçoamento mental, cultural, espiritual ou técnico deve ser permanente, contínuo, obsessivo até. E mesmo assim, essa busca pela excelência não se constitui em garantia, em certeza de que chegaremos ao nosso objetivo. Apenas nos predispõe ao aproveitamento de eventuais oportunidades, se estas aparecerem.

Estação do amor


Pedro J. Bondaczuk

Veja, amada, de novo renascem as flores.
Quanto encanto! Quanta beleza e poesia!
Que espetáculo ímpar de luzes e de cores!
Você encanta e ilumina todos os meus dias.

Dos seus olhos emanam mensagens sutis.
Emana toda a inspiração de que preciso.
Nas árvores cantam, em festa, os bem-te-vis,
e eu me embeveço no frescor do seu sorriso.

Esqueço as mágoas, os desencantos, saudades,
e renovo, com fervor, minha tíbia crença,
meus sonhos loucos e todas minhas verdades,

na contemplação do seu juvenil frescor
e no sutil encanto da sua presença.
Afinal, é primavera...estação do amor!


(Soneto composto em Campinas, em 20 de setembro de 2006).

Friday, September 22, 2006

REFLEXÃO DO DIA


De nada vale alguém ser uma sumidade em determinada área, saber tudo a respeito dessa atividade, se não lhe forem dadas chances de mostrar seu valor. Há muito talento escondido por aí, em um mundo repleto de medíocres. Se não houver quem se interesse pelo seu talento, por sua técnica ou por sua criatividade, todo o seu empenho em se preparar para o exercício de uma profissão, ou de uma arte, ou de um simples estudo, será em vão. Pode até trazer-lhe satisfação íntima. Esta, no entanto, será estéril. Não dará nenhum fruto. Estará, invariavelmente, acompanhada pela frustração, diretamente proporcional ao esforço despendido. Vai faltar o efeito prático para esse talento se realizar. Ou seja, o reconhecimento, em geral traduzido pela remuneração financeira (mas não somente por ela).

Alienação às avessas


Pedro J. Bondaczuk


O cidadão, em especial o brasileiro (que é o que conheço e o que posso analisar), é bombardeado, diariamente, por uma carga brutal de más notícias, como denúncias de corrupção em vários níveis da administração pública, aumento de preços e de impostos, surtos periódicos de desemprego, crescimento da miséria com seus dolorosos reflexos sociais, catástrofes de toda a sorte e violências de todos os tipos etc.
Este volume enorme de informação negativa, difundido por jornais, revistas, rádio, televisão, portais e blogs da internet, age sobre as pessoas, predispondo-as ao pessimismo, ao negativismo e ao desânimo. Pudera! Não há fortaleza de espírito que resista a tanta desgraça e patifaria juntas! Daí a onda de descrença generalizada que se observa no cotidiano e que nada constrói. Qual a opção dos meios de comunicação?
Esconder os fatos negativos, mantendo a população alienada? Passar uma imagem falsa da realidade, dando a entender que as coisas andam às mil maravilhas, quando de fato não estão assim? Evidentemente, não! Discordo dos que criticam o trabalho jornalístico, afirmando, (sem base nos fatos) que somos meros robôs dos patrões e que distorcemos a verdade a nosso bel prazer. Não somos perfeitos (ninguém é), mas salvo exceções (e estas existem em tudo e em todas as profissões), realizamos com competência e senso ético a nossa tarefa de informar. Todavia, dar a entender que só existem coisas e pessoas ruins, também é alienar. Devemos fugir dessa tentação. A palavra chave para os editores, como para todas as pessoas de bom-senso, em qualquer aspecto da vida, é: equilíbrio!
Compete aos analistas (supostamente formadores de opinião), que costumeiramente tratam destes temas, tentar orientar leitores (ou ouvintes, ou telespectadores, ou usuários da internet) para que dêem o devido peso a cada uma dessas informações. É sua tarefa fazer a contextualização exata dos fatos. Corrupção, desgraças, misérias, violência e injustiças sempre existiram e vão existir, porquanto caracterizam um dos lados do ser humano, o negativo, o imperfeito, o animal, o que precisa ser burilado.
Os tempos atuais, em termos qualitativos, não são nada piores do que as eras passadas. Se assim parece, é porque hoje há maior quantidade de pessoas (cerca de 6,5 bilhões) e infinitamente maiores facilidades de difusão de informações. Fica (claro) essa impressão, dado o volume avassalador de más-notícias despejado sobre cada um de nós (e que nós, editores, repassamos para os consumidores delas). Afinal, em época alguma o aparato comunicativo foi tão ágil, abrangente e instantâneo como agora, transformando, de fato, o mundo na tão apregoada “aldeia global” de que tanto o papa das comunicações, o canadense Marshall McLuhan, falou, em especial na década de 60 do século passado.
No século XIX, o poeta norte-americano Robert Frost constatou, a propósito de más-notícias: “Impacienta-me a idéia de que esta época é uma das piores da história do mundo. Já no seu tempo, Matthew Arnold, reclamava tal honra para a sua época, anterior à nossa. Wordsworth reclamava para a época retrasada. E assim vai, literatura afora. É falta de modéstia do homem imaginar-se sucumbido diante das piores forças já mobilizadas por Deus”.
O cidadão contemporâneo precisa se acostumar, pois, com a carga de más-notícias que recebe e saber como agir em relação a isso. Quando se tratar, por exemplo, de um escândalo envolvendo o patrimônio público, deve exercer seu direito de cidadania e cobrar providências. No caso da miséria, compete-lhe ser solidário e participar, de alguma forma, para que esta venha a ser, senão erradicada, pelo menos atenuada. E vai por aí afora.
Escândalos sempre existiram e provavelmente sempre existirão. O dramaturgo irlandês George Bernard Shaw constatou: “A verdade real é que não só é bom para as pessoas ficarem escandalizadas de vez em quando, mas também é absolutamente necessário que se escandalizem freqüentemente”.
O que não dá mais para suportar é ter de carregar um complexo de culpa permanentemente, apenas pelo fato de ser brasileiro. A imagem que se pinta de nós no exterior é constrangedora, ofensiva e irritante. Descamba para o estereótipo e, mais do que este, para o preconceito. No entanto, não somos piores (e nem melhores) do que ninguém. Corrupção, por exemplo, há em toda a parte, e em maior volume e proporção do que no Brasil. Os meios de comunicação estão aí para comprovar.
Claro que o fato de existirem corruptos em todas as partes do mundo não justifica a impunidade para os daqui. Todavia, agir como se todo o brasileiro, sem atentar para quem seja, pelo simples fato de nascer no País, é desprovido de senso ético e não passa de uma reprodução mais ou menos fiel daquele personagem sem caráter de Mário de Andrade, Macunaíma, é, não somente uma injustiça, mas uma tremenda burrice, para não dizer uma monumental sacanagem. E é isso que boa parte do mundo pensa de nós.

Thursday, September 21, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos: Christiano Mazzola/Portal oficial da Ponte Preta)

RESULTADO RUIM, MAS PREVISTO

A goleada que a Ponte Preta sofreu, ontem, no Estádio Olímpico, por 4 a 0, para o Grêmio Portoalegrense, apesar de ter sido (óbvio) um mau resultado, já era prevista. O desnível técnico entre os dois times é muito grande. Creio que nem o mais fanático torcedor pontepretano esperava que a Macaca voltasse do Sul com os três pontos na bagagem. Quando muito, se esperava um heróico empate que, como se vê, não aconteceu. Apesar do placar elástico, essa derrota, convenhamos, não é motivo para pessimismos e nem para desânimo. Há determinados jogos que não dá mesmo para vencer, e este foi um deles. Embora a Ponte Preta não tenha mostrado um futebol exuberante, não faltaram nem esforço e nem espírito de luta à equipe. Dos gols sofridos, talvez apenas o quarto possa ser atribuído a falha da defesa. Nos demais, méritos totais para os avantes do Grêmio. Um fator que pesou bastante na atuação pontepretana foram as ausências de Fábio Baiano e de Luís Mário, dois dos jogadores mais experientes do plantel e que, ultimamente, têm dado equilíbrio ao time e favorecido Tuto a fazer seus gols. O jeito, agora, é levantar a cabeça e tocar a bola pra frente. Afinal, este resultado já não dá mais para mudar.

BUGRE PERDE A PRIMEIRA EM CASA

Pior do que a goleada sofrida pela Ponte Preta, em Porto Alegre, para o futebol de Campinas, foi a derrota do Guarani para o Remo, na terça-feira, por 1 a 0, em pleno Brinco de Ouro. Foi o primeiro tropeço bugrino em seus domínios neste Campeonato Brasileiro da Série B. O time foi afoito em certos momentos, apático em outros, e sem imaginação e criatividade o jogo todo. Até penalidade máxima desperdiçou. Há tempos que estamos alertando para a fragilidade deste plantel bugrino, ao contrário do que faz parcela expressiva da imprensa campineira, que só ilude o torcedor. Embora matematicamente tudo seja possível, objetivamente o sonho do retorno à elite do futebol brasileiro, nesta temporada, está cada vez mais distante. E, se não abrir o olho, o Guarani pode amargar novo rebaixamento. Basta atentar para as campanhas de Bahia e Vitória, no ano passado, que eram semelhantes à do Bugre neste ano. Quando ambos acordaram... já era tarde.

MAROLAS E CORNETAGENS

Bastou a Ponte Preta perder para o Grêmio, vice-líder da Série A e um dos melhores e mais bem montados times da competição, para que os adversários gratuitos da Macaca, que ainda têm a cara de pau de dizer que “defendem os interesses do clube”, e os burros corneteiros de plantão, que achando que estão fazendo o bem, só prejudicam a agremiação, colocassem as manguinhas de fora. Alguns querem por que querem que a alvi-negra seja rebaixada. Atrevo-me a dizer que ela não será. O clube já passou por outras situações muito piores, com plantéis bem inferiores ao atual, e se safou. Neste ano não será diferente. Para a Ponte Preta, tudo sempre foi difícil e dramático. Provavelmente por isso é que tenho tamanho amor a ela. Torcer para clubes ricos (aliás, dá para contar nos dedos de uma só mão quais são), com grandes torcidas e que contam com descarado favorecimento dos cartolas do futebol e de uma imprensa oportunista e parcial, é fácil. Ter fidelidade, porém, por uma entidade que luta contra tudo e contra todos, de 106 anos de existência, e que não entrega os pontos em qualquer circunstância, é que é meritório. Sou, portanto, mais Ponte Preta, e não abro.

PROPAGANDA ENGANOSA

A mais recente contratação do Guarani foi um caso típico de propaganda enganosa. Ao longo de toda a semana passada, a imprensa anunciou, com estardalhaço aos quatro ventos, que o clube iria contratar um meia experiente, que jogava num time de ponta da Série A, cujo nome estava sendo mantido sob rigoroso sigilo. A expectativa era grande sobre quem seria essa preciosidade. Seria um Carlos Alberto, do Corinthians? Não, esse já jogou mais de seis partidas pelo Timão. Seria Petkovic, do Fluminense? Também não. Ou, quem sabe, seria Kleber Santana, do Santos. Este, igualmente não poderia ser inscrito. Ao final das contas, na segunda-feira, a nova “sensação” foi apresentada. Trata-se do meia Odair (nem me lembro dele), que estava na reserva do Juventude. Sem desmerecer o atleta, que pode, até, ser um craque, foi muito barulho para pouco efeito. E assim mesmo, quase que o meia não assina contrato, pois chegou ao Brinco de Ouro acima do peso, para desgosto do técnico Luís Carlos Barbieri. Imaginem o barulho que seria feito se isso acontecesse na Ponte Preta!

DESPONTA UM NOVO BICHO-PAPÃO

O Grêmio de Porto Alegre, que no ano passado foi protagonista da mais lendária vitória da história do futebol mundial, desponta como a grande surpresa da reta final do Campeonato Brasileiro da Série A de 2006. Quietinho, sem nenhum alarde, o time foi conquistando vitória sobre vitória e já está nos calcanhares do São Paulo, cujas atuações não têm sido das mais convincentes, apesar dos seus bons resultados. O ataque gremista é arrasador e o melhor da competição (já marcou 45 gols, cinco a mais do que o tricolor paulista) . O time gaúcho ocupa a segunda colocação na tabela e não vem tomando conhecimento dos adversários, quer no Olímpico, quer fora de casa. Sem nenhuma grande estrela, é uma equipe coesa, solidária e, sobretudo, eficiente. Foi, como se vê, muito saudável a sua passagem pela Série B. Na desgraça, a torcida se uniu e jogou com o time, o que o trouxe de volta à elite. Agora, está ainda mais coesa e de olho do título brasileiro, para compensar o fato do seu maior rival, o Internacional, ter conquistado a Copa Libertadores da América.

REVELAÇÃO COMO TREINADOR

Tiro o chapéu para Renato Gaúcho, que vem se mostrando um treinador competente, o melhor da nova geração. O campeão mundial interclubes pelo Grêmio, como jogador, era temperamental e indisciplinado, apesar de craque que desequilibrava. Como técnico, porém, para surpresa de todos, vem se mostrando emérito disciplinador. Renato vem fazendo milagre com este time do Vasco que, a exceção de Morais, não conta com nenhum jogador acima da média. Chegou às finais da Copa do Brasil e vem fazendo um Campeonato Brasileiro da Série A bastante digno, com possibilidades, até, de conquistar uma vaga para a Copa Libertadores do ano que vem. Para mim, é o treinador revelação, não apenas da atual competição, mas do País nos últimos anos. Além do que, não deve ser nada fácil trabalhar sob o comando de um cartola como Eurico Miranda.

RESPINGOS...

· Tudo indica que Santa Cruz e Fortaleza (salvo uma dessas surpresas incríveis que o futebol costuma aprontar) estão irremediavelmente perdidos e serão rebaixados para a Série B do ano que vem.
· Tudo indica, também, que o Nordeste vai continuar tendo representantes na Série A, em 2007 e que ambos serão de Pernambuco: Náutico e Sport Recife.
· Por falar em Nordeste, que show que a torcida do Bahia vem dando, na Série C do Campeonato Brasileiro! No jogo contra o desconhecido Ananindeua, do Pará, o público, no Estádio Fonte Nova, passou das 40 mil pessoas. Isso que é amor ao clube!
· A carência de centroavantes no futebol brasileiro é imensa. Os grandes goleadores do País estão todos no exterior. Está na hora das escolinhas revelarem novos astros dessa posição. Não é esse o seu papel?
· Por falar em centroavante, que tal a Ponte Preta apostar em Wanderley. Não digo para jogar, mas o garoto merece, pelo menos, uma chance no banco. Afinal, jogador dessa posição é uma raridade atualmente no futebol brasileiro.

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


O sucesso ou o fracasso de uma empreitada, qualquer que seja a sua natureza estão condicionados a uma série de fatores, alguns subjetivos e outros objetivos. Nem sempre uma pessoa competente e bem preparada é bem-sucedida no que faz. Às vezes, falta-lhe garra. Ou, na pior das hipóteses, carece de vontade. No outro extremo temos reconhecidos medíocres, rematados "picaretas" – o tipo de gente chamado de "pára-quedista", por entrar sem preparo algum em determinada profissão que não exija conhecimento técnico específico (isto é, que "cai" no cargo) –, ocupando funções que não lhes caberiam pelo critério da competência e da experiência. Galgam, em pouco tempo, vários escalões, até chegarem ao topo da carreira. Por que isso acontece? Para uma pessoa ser vencedora, não bastam, simplesmente, o conhecimento, o treinamento e o preparo intelectual. A premissa básica para se chegar ao sucesso é a oportunidade.

Homem e natureza


Pedro J. Bondaczuk


As pessoas deveriam atentar para a natureza, procurar estudar e entender suas leis e agir de conformidade a elas. “Devemos buscar o mesmo tipo de processo em todos os seus campos. Devemos supor que a mesma classe de leis está por trás da estrutura do cristal e da estrutura da sociedade”. Essa afirmação não é minha, mas de um dos mais ecléticos, ativos e importantes pesquisadores do século passado, Gregory Bateson.
Dia desses, comentei com os amigos do nosso já famoso cenáculo (nosso grupo informal, que se reúne, periodicamente, num bar da cidade, para falar de tudo e de todos, e sobre o qual já escrevi em várias crônicas), a respeito das idéias desse renomado cientista. Ninguém o conhecia. Decepcionado, abordei, com entusiasmo redobrado, algumas das suas teorias e conclusões. Fiquei pasmo com o fato de um intelectual de tamanha envergadura, com uma obra de tanta relevância, ser ilustre desconhecido de pessoas cultas e razoavelmente bem-informadas, como os meus companheiros de reflexão.
Gregory Bateson, para os que o desconhecem, foi antropólogo, biólogo, naturalista, etólogo (estudioso do comportamento), sociólogo e cibernético. Filho do cientista britânico William Bateson, pioneiro da genética, foi um dos mais importantes estudiosos de organização social do século XX. Praticamente em todas essas disciplinas a que se dedicou, deu uma contribuição transcendental e inovadora. Parte importante do seu pensamento se encontra em seus livros “Passos para uma ecologia da mente” (1972) e “Espírito e Natureza” (1970), que tive o privilégio de ler.
Antes de se tornar expoente da contracultura, nos anos 60, nas décadas de 20 e 30 ocupou-se de antropologia, em Bali, e ajudou a fundar a ciência cibernética. Especialista, também, em Teoria da Comunicação, uma das suas teses mais polêmicas, controvertidas e famosas é a que garante ser possível, ao homem, a comunicação direta e inteligente com qualquer animal, desde que consiga interpretar (e reproduzir) corretamente a sua “linguagem”.
Nos esquecemos, via de regra, de que somos meras partes integrantes da natureza, e não seus senhores, como amiúde achamos, com empáfia e arrogância. A cada espécie que destruirmos, mesmo que nos pareça inútil e dispensável, estaremos contribuindo para o desequilíbrio natural deste nosso restrito mundinho. Os recursos do Planeta não são infinitos, inexauríveis, como equivocada e irresponsavelmente pensamos. O próprio solo, por mais fértil que pareça ser, se exaure e perde a sua fertilidade em pouco tempo, caso não seja utilizado de forma moderada, equilibrada e racional. Sem se dar conta, o homem continua semeando desertos por onde passa. Até quando?!!! Só Deus sabe.
Desde o início do processo de industrialização, em meados do século XIX, está em marcha um dos processos mais estúpidos, irracionais e (ao que tudo indica) irreversíveis de agressão ao meio-ambiente. Florestas inteiras já foram devastadas para a exploração de madeira, para lavouras de baixa produção, ou simplesmente para fazer carvão. E a devastação continua a todo o vapor, agora na Amazônia, onde áreas imensas, do tamanho até de alguns países, são consumidas todos os anos pelo fogo, sem que ninguém faça nada para conter tamanha destruição.
Inúmeros mananciais da preciosa e escassa água potável já foram irremediavelmente poluídos, sem possibilidades de recuperação e, em pouquíssimos anos, farão muita falta a milhões, provavelmente bilhões de pessoas. Os escapamentos dos veículos automotores lançam, diariamente, milhões de toneladas de gases tóxicos na atmosfera, que não se perdem no vácuo como os estúpidos parecem pensar, mas permanecem sobre nós – comprometendo a nossa saúde e minando nossas resistências – como crescentes ameaças à vida.
Fenômenos como o buraco na camada de ozônio (que nos protege dos mortais raios ultravioletas) e o efeito-estufa, para citar apenas dois dos mais perceptíveis desequilíbrios da natureza provocados pela ação humana, tendem a modificar, perigosamente, o clima terrestre, de forma irreversível, com resultados certamente catastróficos.
O homem, como se vê, não busca, em absoluto, entender a natureza (da qual é parte integrante, como outra qualquer), não procura compreender suas inflexíveis leis e dessa forma, tê-la como aliada, e não como inflexível vingadora que é. Age, isso sim, em sentido completamente contrário. As conseqüências dessa insensatez, dessa loucura humana, conclui-se, nem o mais apocalíptico dos profetas é capaz de prever com exatidão, em todo o seu alcance e abrangência.
Por tudo isso – reitero – as pessoas deveriam conhecer melhor e, sobretudo, difundir, as idéias de Gregory Bateson. Ou seja, deveriam pensar o mundo sob enfoque holístico, como um todo e jamais separá-lo em partes. Ou, como ele cansou de dizer, “para recuperar nosso lugar no mundo natural, antes que seja tarde demais, devemos abandonar nossa visão simplista e quantitativa da ciência e aprender ‘a pensar como a natureza’”. Pergunto: isso seria possível nas circunstâncias atuais? E atrevo-me a responder, desolado e pessimista: não, não e não!

Wednesday, September 20, 2006

REFLEXÃO DO DIA


Alguns obstáculos em nossa vida, à primeira vista, assumem o aspecto de intransponíveis, embora raros o sejam de fato. Isto, é claro, se o objetivo visado for factível. Ou seja, desde que não extrapole para o terreno da fantasia, do sonho inconseqüente, da impossibilidade física, intelectual ou material. Mesmo nestes casos, o homem tem sabido, no correr da história, superar limites. Outro fator amiúde citado pelas pessoas como fundamental para o sucesso é a chamada "sorte". E o que vem a ser esse conceito tão vago, com tantos significados?. São as chances que aparecem, na hora certa e que, quando aproveitadas, podem reverter situações adversas. É o inesperado, que nos livra de riscos e que evita, em muitos casos, a própria morte. É o aleatório agindo a nosso favor. É estar na hora certa, no local adequado e atento o suficiente para usufruir a oportunidade.

Fascínio pelos labirintos


Pedro J. Bondaczuk

A vaidade é uma das características, um dos mais visíveis e notáveis defeitos (ou seria virtude?), das pessoas criativas, notadamente dos escritores, e mais em especial ainda, dos poetas. Claro que há exceções, como, aliás, em tudo na vida. Neste caso, porém, prevalece a regra. Alguns chegam a levar essa peculiaridade ao grau superlativo, ao da soberba, da arrogância e da petulância. Felizmente, para eles, não é o que fica a seu respeito para a posteridade, na história da literatura, quando morrem. Permanece a sua obra. E, claro, somente quando esta é de qualidade.
A vaidade dos escritores, esclareça-se, não se refere ao seu aspecto físico (sua eventual beleza, elegância ou charme) e nem à sua riqueza (de raríssimos), força ou coragem. Esses são aspectos que, via de regra, não têm a mínima importância para esses artesãos do verbo, que transpiram criatividade por todos os poros. O que os deixa vaidosos é a sua visão de raio-x da vida, é o talento que têm de enxergar o que realmente importa, de tudo o que nos rodeia, e exatamente onde ninguém enxerga: no óbvio.
O poeta é, sobretudo, um descomplicador, um faiscador de pepitas da beleza, meticulosamente escondidas sob a ganga impura do cascalho inútil. E o que é verdadeiramente belo, por estranha ironia, costuma ser, sempre, de uma simplicidade franciscana. Raros escritores têm a coragem de vir a público e confessar que sofreram qualquer espécie de influência de outros, como se isso se constituísse em alguma mancha, em algum delito, em fatal demérito. Claro que não é.
Poucos, no entanto, em especial os mais eruditos, podem afirmar, sem que se sintam mal por dizerem uma inverdade, que não foram influenciados em nada pela obra de Jorge Luís Borges. Em especial, quando se trata da literatura latino-americana, que da primeira metade do século passado para cá, experimentou rara explosão de criatividade, para assombro de culturas mais antigas, notadamente a européia, que não acreditavam que a jovem civilização do Novo Mundo pudesse produzir obras tão marcantes, densas, originais e consistentes.
Claro que não vou mencionar autores em cujos estilos e temas é patente a influência borgiana. E por que não o faço? Simples! Por dois motivos. Primeiro, por levar em conta o aspecto vaidade, que mencionei. Não quero melindrar ninguém. E, segundo, por não pretender polemizar com quem quer que seja. Limito-me, pois, a chamar a atenção do leitor para esse aspecto. Certamente, ele saberá identificar por si só onde está essa influência.
De minha parte – embora me considere poeta de terceiro escalão – não tenho o mínimo pudor ou constrangimento de declarar que fui e sou influenciado, e muito, por Jorge Luís Borges, principalmente na maneira de encarar a vida e nos aspectos que mais me motivam a escrever. Como ele, por exemplo (ou em decorrência dele), o tempo e os labirintos são dois temas recorrentes em minha prosa e, sobretudo, na minha poesia.
Essa vertente de inspiração foi apenas uma, das tantas, que o escritor argentino me suscitou. Li relativamente pouco do que ele escreveu. Dos 41 livros que publicou, tenho, se tanto, uns 15, mas os considerados principais. Quanto ao tempo, a obra borgiana apenas complementou a impressão que me foi deixada no espírito pela leitura dos seis volumes do “Recherche du temp perdu”, de Marcel Proust. Já os labirintos, ainda me causam um fascínio indescritível, embora tenha utilizado essa imagem em poucas das minhas produções.
Claro que nossas concepções do tema são diferentes. À visão original de Borges, agreguei a minha experiência pessoal e a minha cultura (ambas, evidentemente, muitos furos inferiores às do escritor argentino). Com o toque da minha personalidade, o tema ganhou rumos próprios, novos, originais, embora (obviamente) menos brilhantes do que os do seu inspirador.
A vida é um labirinto, onde todos estamos perdidos, em busca de uma saída, tendo em nosso encalce, nos nossos calcanhares, uma fera sanguinária e insensível, que nos persegue de maneira implacável, no intento de nos matar. Sabemos que um dia seremos alcançados por ela, embora não possamos atinar em que ponto desse emaranhado de caminhos e quando. Andamos em círculos e, no final de cada passagem, nos deparamos, invariavelmente, com nova parede e novos rumos que podem ou não nos conduzir à saída. Porém, no final das contas, eles acabam nos conduzindo, somente, a idênticos resultados. Ou seja, a novas paredes.
Enquanto a maioria dos romancistas, contistas e poetas limitam-se a descrever a vida, Jorge Luís Borges mostrou-se mais ousado e foi além: “recriou-a”. E fez isso com tamanha verossimilhança, que o que inventou se confunde com o que, de fato, sempre existiu. Por isso, enquanto eu viver, ele também viverá em meu íntimo, em minhas elucubrações cotidianas mais secretas e em minha busca ingente e desesperada pela “saída do intrincado labirinto da vida”. Vaidades à parte...

Tuesday, September 19, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O mundo não é mau, como ouvimos e lemos amiúde, desde tenra infância. A existência não é ruim, um vale de dores e de lágrimas, como asseguram furibundos e fanáticos pregadores ascéticos. A felicidade não é uma ocorrência rara e virtualmente ilusória. Nós é que complicamos a vida. Nossa vaidade, nossa arrogância e nossa prepotência contra o próximo é que, como a mola, voltam para nós com a mesma força com que as destinamos aos outros e nos oprimem, machucam e humilham. Corremos o tempo todo atrás de sombras e não percebemos a substância parada bem diante dos nossos narizes...

Entre dois mundos


Pedro J. Bondaczuk


A minha vida, desde os cinco anos, transcorre, simultaneamente, em dois mundos diferentes, não raro conflitantes, nenhum dos quais estou disposto a abrir mão. Um deles é o da suposta realidade, o do cotidiano, com dificuldades, privações, injustiças e violências de toda a sorte e tudo o que de ruim se possa imaginar (e que os meios de comunicação despejam todos os dias em minha casa e, não raro, sinto na própria carne). Contudo, ele tem, igualmente, sutilíssimas surpresas agradáveis e momentos inesquecíveis de exaltação e de felicidade. Abriga canalhas e santos, patifes e heróis, gênios e loucos, sanguinários assassinos e sublimes curadores de corpos e de mentes.. Tem de tudo! Por isso, viver nele me fascina e me desafia, pelo quê de aventura e de mistério que cada momento proporciona.
O outro mundo, exclusivo (só meu), é o da cultura, da arte e, principalmente, da literatura sob o meu enfoque pessoal: o dos gostos que cultivo desde que me entendo por gente. Este “planeta” particular materializa-se nas centenas de discos que coleciono há décadas (de vinil, claro, pois ainda não entrei na era do CD), na infinidade de gravuras e de reproduções da obra dos grandes mestres das artes plásticas (quem me dera possuir os originais!) e, principalmente, nos milhares de livros que compõem a minha eclética e caótica biblioteca. E assim vou tocando a vida, que já passa das 60 primaveras, aprendendo e ensinando, me indignando e me emocionando, rindo e chorando, tentando modificar a realidade para melhor e cultivando sonhos, como se fossem delicadas flores de um místico jardim. Oscilo entre a inovação e a tradição.
Mas por que passei a viver, simultaneamente, nestes dois mundos, especificamente após somente os meus cinco anos, nem antes e nem depois, como afirmei? Porque foi nessa idade que aprendi a ler, com meu pai, tendo por cartilha uma velha Bíblia, de páginas hoje amareladas e amassadas de tanto manuseio e que conservo como minha mais preciosa relíquia. Considero esse o momento mais transcendental desde que nasci, que determinou o meu rumo: o que sinto, o que penso e o que sou.
A vida simultânea nestes dois mundos foi decisiva na escolha, principalmente, das minhas atividades, do que faço para me sustentar e do que produzo para me deleitar. A realidade fez de mim um jornalista, obcecado à cata de informações sobre o que de principal acontece, dia após dia, mundo afora. Ou seja, reproduzo a história (sob a minha versão) no momento exato em que ela acontece. Já o mundo das artes fez de mim um poeta, um ficcionista, um malabarista da palavra. É aí que entram os livros e o convívio espiritual, diário, semana após semana, mês após mês, ano após ano, com os seus autores.
Há escritores que não se concebe que jamais tenham existido. Enriqueceram o mundo com sua genialidade e seu talento de criação e por isso são imprescindíveis. Embora fisicamente mortos, conquistaram a imortalidade pelas obras que legaram à humanidade. Cada apreciador de literatura tem sua própria relação de preferidos, sendo que alguns são unanimidade e integram todas as listas.
No meu rol pessoal de preferências, por exemplo, nomes como os de Jorge Luís Borges, Juan Rulfo, Mário Vargas Llosa, Érico Veríssimo, Mário Quintana, Carlos Drummond de Andrade, Machado de Assis, Cecília Meirelles, Manuel Bandeira, Pablo Neruda, Gabriela Mistral, Gabriel Garcia Márquez e Fernando Sabino – cada qual por alguma razão particular – jamais poderiam faltar. Isso, entre os contemporâneos, ou seja, do século passado para cá.
É claro que esse desfile de gênios poderia engrossar e alcançar as dimensões de uma lista telefônica como a da cidade de São Paulo. Nela, jamais esqueceria de incluir Ernest Hemmingway, William Faulkner, John Steinbeck, Edgar Allan Poe, Leon Tolstoi, Jorge Amado, Marcel Proust, Fiodor Dostoievski, Honoré de Balzac, Montaigne, Gustave Flaubert, Émile Zola, Gogol, Pushkin, Guimarães Rosa, Stendhal, Henry David Thoreau, Will Durant, Ralph Waldo Emerson, Rabindranath Tagore, T. S. Eliot, Rainier-Marie Rilke, Jean-Paul Sartre, Albert Camus, Franz Kafka, Alberto Moravia, Fernando Pessoa, Augusto dos Anjos, Vinícius de Moraes, Cora Coralina e tantos e tantos outros criadores de vida, garimpeiros de beleza e pastores de sonhos e ilusões que me embalam com freqüência.
Entre os “eternos”, ou seja, os clássicos - os que estariam, sempre, num patamar mais elevado, todo especial – cito, sem pestanejar, Platão, Aristóteles, Homero, Ovídio, Juvenal, Cícero, Virgílio, Petrarca, Camões, Dante, o Padre Antônio Vieira, William Shakespeare, Johann Wolfgang Göethe e mais alguns milhares de luminares do saber e das artes. Há livros que, se não existissem, determinariam até um destino mais mesquinho para povos e civilizações, um atraso irreversível e irrecuperável.
Hoje nós, intelectuais ditos pós-modernos, que tanto nos jactamos de nossa cultura, não passaríamos de anões do pensamento sem esses gênios. Somos (supostamente) grandes, porque estamos sobre os ombros de gerações e mais gerações de pensadores notáveis que dedicaram suas vidas a iluminar os corações e as mentes dos néscios como nós e que nos agigantam.
Esses escritores viveram, na prática, o mito de Prometeu. Ousaram subtrair a chama sagrada de Zeus para dar vida à matéria inanimada dos seus sentimentos e das suas fantasias pessoais. Por isso, foram punidos, atados aos Montes Urais das suas lembranças, tendo o fígado devorado pelos abutres dos tormentos psicológicos e emocionais por toda a eternidade. Sublimes sonhadores! Loucos é que foram! Santa loucura!

Monday, September 18, 2006

TOQUE DE LETRA



Pedro J. Bondaczuk

(Fotos: Christiano Mazzola/Portal oficial da Ponte Preta)

TUTO, O “MATADOR”

Uma brilhante jogada do meia Tuto – que redundou numa penalidade máxima, que ele mesmo converteu – garantiu a vitória, ontem, da Ponte Preta, sobre o Santos, no Moisés Lucarelli, por 1 a 0. O atacante provou, mais uma vez, que não é o jogador limitado que muitos pensavam que fosse, mas tem “faro de gol”. Mais uma vez, o catarinense, que fez quase toda a sua carreira no Japão, foi decisivo. Aliás, os três lances mais agudos da partida foram seus. Além do gol, todo ele de sua autoria, do início ao fim da jogada, ainda chutou uma bola na trave e obrigou, num outro lance, o goleiro Fábio Costa a fazer uma grande defesa. Dizem que o matador da Macaca errou o chute. Bobagem! Méritos para o goleiro. Mas corneteiros, que não se contentam com nada, garantem que Tuto perdeu esse gol. Suponhamos que sim. Todavia, a jogada que fez, e que resultou no pênalti, mais do que compensou esse suposto erro. Agora, o atacante pontepretano está no encalço do artilheiro da competição, mesmo não tendo atuado em mais da metade dos jogos da Ponte. Queiram ou não, este vai fazer (ou já está fazendo) história no Moisés Lucarelli.

BUGRE CONTINUA O MESMO FORA DE CASA

O Guarani até que vinha bem na chamada “Era Barbieri”. Bastaram, porém, dois jogos fora de casa, para que a fragilidade da equipe ficasse, mais uma vez, patente. No meio da semana, o time foi goleado pelo Náutico, no Recife, por 4 a 1, mesmo jogando a maior parte da partida melhor do que o adversário. Sua defesa, no entanto, entregou “o ouro ao bandido”. Em Florianópolis, diante do limitado Avaí, não foi diferente. O Bugre abriu o placar e parecia que desta vez voltaria para Campinas com os três pontos ganhos na bagagem. Só parecia... Cedeu não apenas o empate, como permitiu a virada do time catarinense que, convenhamos, não é lá essas coisas. Amanhã o time encara, no Brinco de Ouro, o Remo, em franca ascensão nas mãos de Giba, com a obrigação de vencer. Todavia, a cada rodada que passa, o Bugre vê, mais e mais, o sonho do retorno à elite do futebol brasileiro ficar mais distante.

FINALMENTE O HOMEM DE ÁREA

Finalmente, a Ponte Preta está trazendo o tão reclamado homem de área, para fazer dupla com Tuto no ataque. Não era sem tempo. Trata-se do rodado e experiente Marco Brito, que entre outras coisas, foi campeão carioca e da terceira divisão do Campeonato Brasileiro defendendo o Fluminense. Vai dar certo? Ninguém pode dizer. Depende da forma que se encontra atualmente. Se estiver bem condicionado, tem tudo para ser aquele centroavante com que a torcida há tanto tempo sonha. É experiente, entende do riscado, tem bom porte físico e visão de gol. Mas precisa jogar com raça, característica que o pontepretano exige de todos os que vestem sua gloriosa e centenária camisa. Só espero que não tenha vindo para jogar no lugar de Tuto, que vem carregando a Macaca nas costas em termos de feitura de gols. O óbvio é recuar Luís Mário para o meio de campo, função que ele, aliás, prefere, e sacar Carlinhos do time que, apesar de ótimo marcador, não consegue dar um passe de um metro certo. Enfim, esse é um pepino para Marco Aurélio descascar. Seja bem-vindo, Marco Brito. E sucesso!!

CAMPANHAS MUITO PARECIDAS

Ponte Preta e Guarani fazem campanhas muito parecidas até aqui. Com os três pontos que o Bugre perdeu no tapetão, ambos têm, agora, 30 pontos ganhos. Os bugrinos obtiveram 7 vitórias (no campo foram oito), nove empates e sete derrotas. O ataque alvi-verde marcou 32 gols e a defesa tomou 38. Já a Ponte Preta empatou três a menos, mas perdeu três a mais. Foram oito vitórias, seis empates e dez derrotas. O ataque pontepretano marcou 33 gols e a defesa sofreu 43, com saldo negativo de dez. A diferença entre ambos, porém, é inquestionável e decisiva: a Ponte Preta está na elite do futebol e tem adversários muito mais qualificados, enquanto o Bugre permanece na Série B, mantendo o sonho do acesso, mas a míseros três pontos da zona de rebaixamento. Qualquer comparação, portanto, significa forçar a barra. Destaque-se que 30% dos times da Série A têm a mesmíssima pontuação da Macaca (30 pontos), com suas respectivas colocações sendo definidas, apenas, nos critérios de desempate. Ao mesmo tempo que o clube luta para fugir do fantasma do rebaixamento, portanto, está também na bica para se classificar para a Copa Sul-Americana. Coisas do futebol!

VOLTA POR CIMA DO TRICOLOR

O São Paulo é mesmo imprevisível. Quando todos esperavam que o Tricolor paulista iria despencar de ponta-cabeça, depois da péssima apresentação contra o Corinthians e da perda da Recopa Sul-Americana para o Boca Juniors, o time deu a volta por cima e, na base da superação, venceu o Internacional de Porto Alegre, ontem, no Morumbi, por 2 a 0, jogando boa parte da partida com dez jogadores. Ressalte-se que foi um confronto direto entre os dois favoritos (pelo menos de parte considerável da imprensa) para a conquista do Campeonato Brasileiro deste ano. O grande problema sãopaulino é o mesmo da maioria esmagadora dos times do País, não importa qual a competição que estejam disputando: a falta de um matador. O São Paulo não pode confiar apenas em Aloísio que, por causa de suas características, vira e mexe está no Departamento Médico. O garoto Tiago ainda não está preparado para assumir essa responsabilidade e André Dias atravessa uma fase horrível e está muito longe daquele goleador que despontou no Goiás. Todavia, mesmo empurrando com a barriga, o Tricolor paulista vai se distanciando dos demais competidores na tabela, rumo ao tão sonhado título de campeão brasileiro. Se deixarem, ele papa mesmo!

NOVO ÍDOLO DA FIEL

Quem diria! E não é que o ex-volante do São Caetano e do Palmeiras, Magrão, caiu nas graças da Fiel! E bastaram somente três jogos para que isso acontecesse. Depois do gol que fez contra o Vasco, no meio da semana, pela Copa Sul-Americana, o jogador repetiu a dose, no sábado, na vitória apertada do Corinthians, diante do Paraná, por 1 a 0, e foi ovacionado pela torcida, que já se esqueceu dos argentinos, principalmente de Carlitos Tevez. Aliás, isso era previsível de acontecer, embora não tão cedo. A principal característica de Magrão nunca foi a técnica e nem o futebol refinado, mas a garra, a raça e a voluntariedade, o que o torcedor corintiano exige de quem veste a camisa alvinegra. E o jogador mostrou que sabe muito bem fazer seu marketing pessoal: comemorou seu gol, no sábado, bem ao estilo de outro grande ídolo corintiano, o meia Neto. O resultado foi exatamente o que ele pretendia: caiu nas graças da Fiel. Esse sabe das coisas!

RESPINGOS...

· Apesar da euforia corintiana, o time está, rigorosamente, empatado, em número de pontos, com a Ponte Preta. Bastam duas derrotas consecutivas para que todo esse auê acabe.
· O Botafogo, que foi “assaltado” pela arbitragem, na quinta-feira, diante do Fluminense, pela Copa Sul-Americana, tomou um vareio de bola do Grêmio, ontem, no Olímpico, e levou na bagagem, para o Rio, 4 gols nas costas. E olhem que foi pouco!
· Com os quatro gols feitos, ontem, em Fortaleza, o ataque do Flamengo passou para o Corinthians o título de “menos realizador” do Campeonato Brasileiro. Os atacantes do Timão visitaram as redes adversárias somente 23 vezes em 24 jogos.
· As arbitragens continuam aprontando das suas. O gol de “gandula”, validado pela árbitra Sílvia Regina, em favor da Santacruzense, contra o Atlético Sorocaba, pela Copa Federação Paulista, foi o fim da picada!
· Por falar em arbitragem, o Fortaleza foi “garfado” em casa, ontem, diante do Flamengo, que deixou de dar um pênalti claríssimo em favor do time cearense, nos descontos da partida. Resultado? Perdeu o jogo por 4 a 3. Assim não dá!

* E fim de papo por hoje. Entre em contato, para críticas e sugestões.


pedrojbk@hotmail.com

REFLEXÃO DO DIA


A criação, a solidariedade, o amor, a compreensão e o perdão são diamantes. A posição social, o dinheiro, a ostentação são vidros. Todos amamos, em certa medida, estas "sombras". Todos, em algum momento, abrimos mão da substância. Estimamos vidros cuidando que sejam diamantes, mas poucos têm a coragem de admitir o equívoco. A vaidade impede a admissão. A teimosia não deixa que possamos dar a meia volta para retomar, ou encontrar, o caminho melhor. Só quem consegue isso, porém, tem condições de atingir os objetivos que realmente valham a pena na vida.

Nas garras do ceticismo


Pedro J. Bondaczuk


O ceticismo – a profunda descrença em tudo e em todos – ao lado da solidão, é uma das características marcantes deste início de milênio, de parcela expressiva da população mundial. Claro, seguindo em paralelo, há os que têm uma fé profunda, irrestrita, mística, extremada até, em tudo o que entendem que seja a “sua” verdade, não importa sua natureza que pode ser religiosa, social, ideológica ou qualquer outra. Como os extremos se tocam, ambas as atitudes, levadas ao seu ponto máximo, são equivocadas e nocivas. Como diz o povo, em sua simplicidade e sabedoria, “a virtude está no meio”.
O ceticismo extremado conduz as pessoas ao desencanto, à desconfiança patológica e às neuroses de toda a sorte, que afetam a tanta gente pelo mundo afora. A fé cega, por seu turno, aquela sem nenhum questionamento e nenhuma base minimamente lógica para se acreditar no que se acredita, baseada, apenas, na superstição, leva, via de regra, quem age dessa maneira, à estreiteza mental, ao dogmatismo exacerbado e, finalmente, ao fanatismo, causa de tantos desatinos e tragédias.
A atitude sensata (e sábia), é cultivar um conjunto de valores, testados e aprovados ao longo tempo, é estudá-los em profundidade, para dar-lhes sólida fundamentação e é buscar disseminá-los na sociedade, não os impondo, contudo, a ninguém, mas convencendo as pessoas da sua correção e dos resultados positivos que trazem.
Se tivesse que optar, todavia, entre o absoluto ceticismo (negação, inclusive, da própria existência) e a fé cega, certamente optaria por esta última. Claro que não buscaria impor minhas crenças a ferro e fogo a quem quer que fosse. Poderia até tentar convencer os que me cercam com argumentos (se os tiver, é claro), lhes dando, porém, a opção de aceitar ou de recusar aquilo em que acredito.
John Updike, no romance “O Encontro”, constata que “não há bondade sem fé”. E prossegue: “Sem fé, todos os atos são apenas ocupações. E se não teve fé, no fim da vida saberá então que enterrou todas as suas possibilidades no solo deste mundo e que já nada lhe resta para levar para o outro”. Isto, se acreditar em um outro, no que os céticos não crêem. Por isso, não contam com base para a esperança. Suas vidas são áridas, vazias, sem sentido, verdadeiras sucursais do inferno.
Mas o argumento mais sólido (e lógico) para que acreditemos em alguém, ou em algo (mesmo que de forma instintiva e irracional), é dado pelo norte-americano Will Durant, em seu clássico “Filosofia da Vida”. Num determinado trecho, o filósofo analisa a “naturalidade” e a falta dela das duas posturas. E conclui: “A crença é um fenômeno natural. Vem diretamente das nossas necessidades emotivas – da fome de auto-conservação, da sede de recompensa, de companhia, de segurança e até do pendor pela submissão”.
Qual a pessoa “normal” (e reconheço que esse conceito de normalidade é bastante elástico e ambíguo) não sente, ou nunca sentiu, esse tipo de necessidade? Quem, em sã consciência, não procura, por exemplo, conservar a saúde? Quem não aspira ser recompensado por suas boas obras ou idéias? Quem não sonha com uma companhia amiga e protetora, que o aceite, ame, ampare e compreenda? Quem não quer se sentir seguro, sem temores em relação à integridade física e de seu patrimônio? Para os que têm essa necessidade, a fé (não importa em quem ou no quê) se constitui em atitude mais do que natural: é instintiva até.
Ernesto Sábato, em seu livro “Antes do fim”, nos apresenta o outro extremo da questão, o ponto de vista dos céticos. Afirma: “Os jovens sofrem: já não querem mais ter filhos. Não há ceticismo maior. Assim como os animais no cativeiro, nossas jovens gerações não se arriscam a ser pais. Tal é o estado do mundo que estamos lhes entregando”. E aponta as atitudes que, no seu entender, são algumas características dessa profunda descrença, especialmente das gerações mais novas: “A anorexia, a bulimia, as drogas e a violência são outros dos sinais deste tempo de angústia, reações ao desprezo pela vida daqueles que nos comandam. Como poderíamos explicar aos nossos avós que levamos a vida a uma tal situação que muitos jovens se deixam morrer porque não comem ou vomitam os alimentos? Por falta de apetite pela vida ou para cumprir o mandato que a TV nos inculca: a magreza histérica”.
Quem tem fé, é otimista, até por definição. Por maiores que sejam seus problemas, dúvidas, dores e aflições, sempre acredita que, no final das contas, tudo vai se arranjar, dar certo e se resolver. E, por acreditar, age nessa direção e via de regra acaba conseguindo (embora sempre haja exceções). Que tipo de atitude, pois, é o mais sábio e racional? Crer na vida, na alegria e na felicidade ou se conformar em permanecer passivo nas garras do ceticismo? Cada qual que responda, à sua maneira, essa questão.

Sunday, September 17, 2006

REFLEXÃO DO DIA


O poeta William Butler Yeats recomenda: "Unifique seus pensamentos a marteladas..." É isto...Agimos, em geral, sem pensar em profundidade em nossos atos e suas conseqüências. Não pensamos de maneira unitária. Nossas idéias são dispersas, vagas, contraditórias. Temos que unificá-las...Mesmo que a "marteladas"... Os verdadeiros prazeres, aqueles que justificam uma existência, são simples e gratuitos. Estão ao alcance das mãos de qualquer um que os queira usufruir. No entanto, complicamos tanto a nossa vida! No entanto, nos afligimos por tão pouco! No entanto, tentamos, na maior parte do nosso tempo, agarrar sombras! Não agimos assim, é evidente, por masoquismo, pelo prazer de sofrer ou então por maldade. Achamos, até mesmo, e com sinceridade, que estamos agindo certo.

A Ilha da Solidão


Pedro J. Bondaczuk


Argentinos e britânicos já combatem, praticamente, nos arrabaldes da capital das Ilhas Malvinas. Travam dura luta, que em alguns momentos chega a ser corpo a corpo, a apenas dez quilômetros dessa minúscula cidade, na verdade mero vilarejo, com não mais de três mil habitantes. Nos últimos sessenta dias, essa localidade, até agora desconhecida no mundo, trocou três vezes de nome.

Era Port Stanley, até o dia 2 de abril, quando tropas argentinas ocuparam-na, dando início ao atual conflito. Dessa data, até 5 de abril, foi chamada de Puerto Belgrano, em homenagem a um militar argentino do século passado. Finalmente, foi rebatizada para Puerto Argentino. Agora, esse vilarejo está a pouco, muito pouco, de voltar às mãos e nome primitivos. De ser administrado por aqueles que o ocupavam nos últimos 149 anos, até que a atual junta militar argentina desse início à atual aventura.

A batalha que se desenvolve em torno desta aldeia, contudo, está fadada a entrar para a história da insanidade política deste século. O desalento, expressado, hoje, pelo secretário-geral das Nações Unidas, Javier Perez de Cuellar, quanto a uma saída diplomática de última hora, que evite o aguardado confronto decisivo, é sintomático. O líder da ONU admitiu, tacitamente, o fracasso de todas as suas gestões para um cessar-fogo. Disse não acreditar mais que a trégua ainda seja possível. Para ele, as posições inflexíveis, tanto dos britânicos, quanto dos argentinos, inviabilizam qualquer entendimento.

De Londres, a primeira-ministra Margaret Thatcher, como que querendo se desculpar, ou se justificar antecipadamente perante as famílias dos soldados, fez sua derradeira oferta à Argentina. Afirmou, em pronunciamento pela televisão, que ordenará um cessar-fogo imediato, desde que o governo argentino se comprometa a retirar todas as suas tropas do arquipélago invadido em um prazo máximo de 14 dias. Como isto não vai acontecer... Comentando a oferta, a "Dama de Ferro" admitiu o óbvio: que é "uma pena que tantos jovens venham a morrer nessa guerra". Só faltava ela exultar com a carnificina. Talvez secretamente, em seu íntimo, até exulte, quem sabe.

Pena não é bem o termo que deva ser aplicado a essa inútil carnificina que se desenha. As palavras mais apropriadas para esse conflito seriam "loucura", "insensatez", "crime contra a humanidade" e outras muito mais fortes, aplicáveis aos dois contendores. Argentinos e britânicos são igualmente culpados, bem como os que apoiam as respectivas posições belicistas. Mas a senhora Thatcher lançou água gelada sobre a fervura, se é que a sua "oferta" de paz pudesse ser levada a sério. Concluiu seu pronunciamento pela TV afirmando que não acreditava que os argentinos aceitariam sua derradeira proposta. Ela aceitaria:?

Dessa forma, os campos nevados da Ilha Soledad, a "Ilha da Solidão" em nosso idioma, já quase nos limites da inóspita Antártida, vão se tornar rubros com o sangue de jovens que, no cumprimento do seu dever de executar o que seus superiores hierárquicos ordenarem, lá deixaram, estão deixando ou vão deixar seu bem mais precioso: a vida. E tanto sacrifício por nada. Morrerão anônimos.

Seus corpos serão enterrados em valas comuns, alguns tão deformados, que jamais virão a ser sequer identificados. Restarão esquecidos, sós, sem nome, na solidão gelada da "Ilha da Solidão". Terão, certamente, mães, esposas e filhas esperando pela sua volta, que nunca irá acontecer. Os parentes jamais terão certeza se morreram ou permanecem vivos em algum lugar. Enquanto a guerra estiver em andamento, for manchete nos noticiários de rádios, televisões, jornais e revistas, seu sacrifício pela pátria será citado, enfatizado e glorificado, com palavras bombásticas, sonoras, retóricas, mas despidas de sinceridade e de conteúdo, por políticos oportunistas, de olho apenas na manutenção do poder.

Alguns, neste caso oficiais (coronéis ou generais), poderão até ganhar monumentos ou dar nomes a ruas ou praças. Os poderosos precisam, posto que temporariamente, enfatizar o seu sacrifício. Não que acreditem na sua necessidade, mas para justificar o injustificável: a sua insensibilidade, cinismo e intransigência. No entanto, tudo isso apenas será possível – homenagens, cerimônias religiosas e reverência nacional –, enquanto a guerra for destaque na imprensa.

Depois, quando os acontecimentos do Atlântico Sul forem superados por novas questões e por novos conflitos – que serão "consumidos", como todos os outros, por um público ávido por desgraças, bestializado e imerso num egoísmo ferrenho e sem limites, encarando as carnificinas como se fossem de mentirinha, mera ficção –, desses jovens soldados, que lutam por alguma coisa que sequer sabem definir o que é, não restarão sequer lembranças. Nenhum pensamento vai mais se voltar para o seu sacrifício inútil, evitável e insensato. Seus nomes e experiências serão apagados da memória popular, como se jamais tivessem existido.

Em suas covas rasas, talvez marcadas apenas por uma tosca cruz de madeira, se tanto, em todas as primaveras, nesse recanto gelado e cinzento, na solitária Ilha da Solidão, nas Malvinas, brotarão delicadas e frágeis flores rubras, da cor do seu sangue generoso. Ninguém as plantou.

Os moradores da região evitarão até de passar pelo local, por temerem os "fantasmas" da sua ingratidão. A natureza, apenas ela, não esquecerá o sacrifício anônimo desses jovens. E a vida vai continuar. Até o dia em que a loucura dos homens atingir o paroxismo e levá-los a plantar gigantescos "cogumelos" de fogo nos quatro quadrantes do mundo. Ou, o que é improvável, até que a razão venha a preponderar sobre os instintos, quando só então a violência terá uma chance (posto que mínima) de ser banida da Terra e do espírito humano. Caso dê a lógica, no entanto, este planeta azul e frágil será todo ele uma inóspita e silenciosa "Ilha da Solidão", na imensidão do espaço...

(Comentário apresentado na Rádio Educadora de Campinas, em 2 de junho de 1982)