Lições de amor
Pedro J. Bondaczuk
O
poetinha Vinícius de Moraes, com a sua verve irresistível e seu
jeito doce de poetar, escreveu inúmeros poemas sobre o amor, a
maioria antológica. Seus versos são citados, amiúde, por namorados
ou simples paqueradores, Brasil afora, pela beleza que encerram e
pela forma convincente de se conquistar uma mulher. Aliás, não me
lembro de nenhum deles (e nem de nenhuma das centenas de letras de
canção que escreveu), em que o tema não estivesse presente, ou de
forma ostensiva, ou subjacente, mediante simples sugestão. E está
certo o poeta. Nada é mais importante que o amor.
Mas
amar, ao contrário do que possa parecer, não é tão fácil quanto
se apregoa. Para que esse sentimento se manifeste e se realize, em
sua plenitude, temos que abrir mão de grande parcela do nosso
egoísmo e do nosso arraigado e não raro exacerbado egocentrismo.
Apregoar
o amor não é difícil, pelo contrário. Senti-lo, também não
chega a beirar a impossibilidade e não envolve maior complexidade.
Mas vivê-lo em sua plenitude é que são elas! Para isso, temos que
relevar os defeitos alheios, que a rigor não são maiores do que os
nossos, sem ares de superioridade ou tentativas de imposições.
Muita
gente fracassa no amor pelo simples fato de não saber amar. Confunde
esse nobilíssimo sentimento, que só é genuíno se for espontâneo,
com a idria de posse, de imposição das próprias vontades e da
conseqüente submissão da pessoa amada. Claro que um relacionamento
desse tipo só pode resultar em fracasso.
Mesmo
que originalmente haja amor entre os que se relacionam dessa forma
viciosa e equivocada, este, em pouco tempo, se esvai, em decorrência
da coação de uma das partes. Ocorre que seres humanos são livres
e não são (e nem podem ser jamais) “propriedades” de ninguém.
Cada pessoa é senhora da própria vontade, que tem que ser
respeitada às últimas conseqüências. O amor implica, sempre, em
absoluta igualdade entre os parceiros, em tudo e por tudo.
Mas há formas e formas de amar. E há objetos e
mais objetos desse sentimento. As obras duradouras, que permanecem
anos, séculos, quiçá milênios após a nossa morte e que
beneficiam gerações, não importa seu tamanho ou natureza, são,
por exemplo, atos de amor. Não esse estereotipado, mutilado e
distorcido, como é entendido por grande parte das pessoas, ou seja,
a mera transação de corpos, almas e interesses, sem nenhum
comprometimento profundo e genuíno.
Este tipo de sentimento conduz, somente, à
frustração, ao desespero e à solidão. O amor a que me refiro é
aquele desprendido, abnegado, altruísta, que move céus e terras
para proteger e beneficiar seus destinatários, sem esperar
agradecimentos, vantagens e sequer reciprocidade. Por esta emoção,
sim, vale a pena viver e, se preciso, vale a pena morrer. Quem não
ama o que faz, jamais conseguirá fazer nada bem feito.
Só
o amor, desprendido e abnegado, pode redimir a humanidade e
estabelecer uma interminável corrente de afetos e de solidariedade.
Não serão governos, sistemas, Estados e ideologias que irão
estabelecer a harmonia e a justiça social de que tanto necessitamos.
O
poeta Dante Aligheri, no livro “A Divina Comédia” (no Canto
XXII, quando trata do “Purgatório”), afirma esta grande verdade:
“O amor aceso em nome da virtude, uma vez alteada a sua chama,
sempre ateia um outro amor”. Ou seja, é como uma fagulha, num
capinzal seco: depois de ateado o fogo, este se torna incontrolável.
Ninguém mais consegue apagá-lo. Pena que haja tão pouco desta
chama no mundo!
Temos
que amar, sobretudo, a humanidade, a despeito de suas fraquezas,
aberrações, patifarias e contradições. Ou seja, devemos agir como
recomendam lúcidos pregadores: “abominar o pecado, mas ter
compaixão pelo pecador”. Aquele que não ama os semelhantes e,
pior do que isso, que os abomina, jamais dedicará a vida na
elaboração de uma obra cujos resultados não irá aproveitar.
Nunca
podemos perder de vista o fato de que somos efêmeros e que
desconhecemos nosso tempo de vida. Quanto menos esperarmos, zás,
alguma fatalidade (acidente, doença ou agressão), pode nos atingir
e pôr fim à nossa aventura no mundo. E mortos, claro, de nada nos
valerão nossos bens ou nossas virtudes ou nossas aptidões. Tudo o
que fazemos, portanto, mesmo que não venhamos a nos dar conta, é
para usufruto alheio.
Em
geral, só damos o devido valor a uma pessoa, coisa ou qualquer outro
bem, quando os perdemos. Aí, já é muito tarde. Há quem viva, por
exemplo, anos e anos ao lado de alguém, que lhe devota respeito,
afeição, lealdade e veneração, e sequer se dá conta. É incapaz
do mais simples gesto, de uma única palavra que seja de
reconhecimento e de gratidão. Contudo, quando perde essa pessoa –
por morte, separação ou qualquer outro motivo – fica
inconsolável, julgando-se o mais infeliz dos viventes, lamentando a
tola indiferença que manifestou.
Por
isso, em vez de corrermos atrás de sombras e ilusões, o mais sábio
é valorizarmos a substância ao nosso alcance. Ou seja, é mais
prudente mantermos o pássaro que tivermos nas mãos do que
corrermos, loucamente, atrás dos que estiverem voando. E devemos,
sobretudo, amar, amar e amar, sem restrições ou limites, a nossa
cara metade, os nossos filhos e netos, os nossos pais, os nossos
amigos e, o que é o máximo da abnegação, não somente o nosso
próximo, mas a humanidade. O amor é a única coisa que aumenta na
mesma proporção que o damos. Sejamos, pois, pródigos e perdulários
na sua doação!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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