Sonhos de criança
Pedro J. Bondaczuk
O
meu maior sonho, quando guri de apenas seis anos, recordo-me bem, era
ser escritor. Fechava os olhos e via-me, nitidamente, já crescido,
cercado por dezenas de pessoas ávidas por meus autógrafos.
Claro que, como toda criança, era um tanto inconstante no que queria
ser quando crescesse.
Às
vezes, sonhava ser um cientista, um pesquisador da área médica,
para descobrir remédios que curassem doenças incuráveis, como o
câncer e a poliomielite. Na ocasião ainda não havia sido inventada
sequer a vacina de Jonas Salk. A de Albert Sabin veio alguns anos
depois.
Hoje,
a pólio foi erradicada do País. Mas não do meu corpo... Essas duas
fixações acompanharam-me por toda a adolescência, maturidade e
ainda estão presentes, secretamente, no fundo do subconsciente. Vez
por outra vêm à tona, mas cada vez mais ocasionalmente.
Cientista
não consegui ser, embora seja leitor ávido de livros dessa área,
em especial de medicina, curso que tive que interromper por falta de
recursos. O vil metal foi o responsável pela frustração do segundo
maior sonho da minha infância. O que fazer?
Quanto
a ser escritor... As chances ainda existem. Talvez remotas, é
verdade, mas… não abri (e nem abrirei) mão desse sonho. Vivo de
textos, que representam meu ganha pão há anos. Com eles sustentei e
eduquei meus filhos. E se não fiz fortuna, pelo menos consegui
sobreviver graças ao talento de escrever.
Claro
que não posso avaliar a qualidade do que escrevo. Sou péssimo juiz
e pior ainda quando se trata de me julgar. Ora mostro um rigor
excessivo, ora sou complacente em demasia, sem contar com a devida
isenção para os julgamentos.
Livros
já escrevi 22, embora tenha só quatro (dois de contos, um de
ensaios e outro de crônicas) publicados e alguns em vias de serem
lançados, à mercê de julgamento de editoras às quais volta e meia
os ofereço, sem muito sucesso até aqui. Nenhum dos livros que
publiquei, no entanto, é de poesias, gênero ao qual me dedico desde
menininho. Mais uma vez meu sonho (e desta vez o maior deles) esbarra
na falta de recursos até mesmo para bancar publicações.
Poderia,
eventualmente, conseguir uma editora, mas para tanto precisaria de
tempo para fazer a peregrinação típica dos escritores
desconhecidos, em busca de oportunidade. Teria que ter a paciência
de Jó para ouvir inúmeros "não!" e engolir as desculpas
tão já conhecidas, sem que o interlocutor se dispusesse sequer a
ler os originais, ou ter, simplesmente, a porta batida na cara.
Optei
pelo expediente da correspondência, embora seja contestável que dê
resultados. Até agora, não deu. É verdade que já publiquei
textos, em uma infinidade de jornais, que se reunidos, formariam toda
uma biblioteca, com dezenas de alentados volumes. Bem ou mal,
portanto, comuniquei-me com o público. Com quantas pessoas, jamais
saberei.
Paralelo ao sonho de ser escritor (que ainda está
por se concretizar, já que não ganhei nada com os quatro livros
publicados), acalentei outro, mais ousado, mais pretensioso e
aparentemente irrealizável, durante a juventude: o de chegar à
Academia Brasileira de Letras. É muita pretensão minha? Certamente
que sim. Todavia... sonhar não paga imposto (ainda)...
Para
minha surpresa, em 1992 consegui subir o primeiro degrau dessa escada
íngreme e escorregadia do sucesso, que conduz à pretensa
imortalidade. Faltam, porém, ainda dois e ambos, em princípio,
inacessíveis. Questiono, a todo o instante, se tenho talento para
conquistar leitores. Mais do que isso, se o que escrevo interessa a
alguém e é útil às pessoas.
À
Academia Campinense de Letras, quis o destino que eu fosse guindado,
no início da década de 90. Parte do sonho, portanto, está
realizada. Para chegar, porém, à Paulista (antes) e à Brasileira
(numa etapa posterior) precisarei fazer mais, muito mais do que fiz
até aqui (que não foi pouco), em termos de criatividade, de domínio
das técnicas de redação e de bom senso.
Foram
anos e mais anos de intensiva leitura, de noites insones, de cansaço,
de angústias, de quilômetros de papel preenchidos com textos, de
críticas muitas vezes mesquinhas e destrutivas, de inúmeras
frustrações, de autodisciplina, de privação de vida social e de
lazer. Enfim, de trabalho e sacrifícios, com nulas compensações.
Tudo em nome de um sonho de infância que sequer sei se vale a pena.
Tudo em busca de castelos de fumaça. Tudo para satisfazer um ego.
Tudo para contentar meu narcisismo intelectual.
Querem
um exemplo de críticos chatos, destes de que quero distância por
serem sempre destrutivos, mesmo quando criticam com (digamos)
“educação”? Muitos, que se julgam defensores do tal do
politicamente correto, criticam-me por escrever sempre na primeira
pessoa e em tantas ocasiões trazer à baila coisas estritamente
pessoais. Todavia, há quem goste e que até me cobre para escrever
mais e mais a meu próprio respeito. E gosto não se discute.
Ademais, prestes a completar 75 anos de idade, este é o momento
propício da minha vida para o resgate de memórias, mesmo admitindo
que com o tempo elas perdem a precisão e se tornam quase
“ficcionais”. Às favas, pois, com os pretensos defensores do
“politicamente correto”!!!!
"Vanitas
vanitate", diria Salomão. Estranha criatura o homem! Milan
Kundera escreveu, em seu "Livro do Riso e do Esquecimento":
"O orgulho do poeta não é um orgulho banal. Só o próprio
poeta conhece o valor daquilo que escreve. Os outros o compreenderão
muito mais tarde ou talvez nunca o compreendam. O poeta tem,
portanto, o dever de ser orgulhoso. Se não fosse, trairia sua obra".
Como não sou “traidor”, escrevo para o futuro e a posteridade.
Mas corro o risco (real) de resvalar para o absoluto esquecimento...
Que tolice a minha, não é mesmo?!
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