Terceiro do mundo
Pedro J. Bondaczuk
O desemprego continua sendo,
neste início de ano 2000, disparadamente, o principal problema do
País, embora não venha sendo tratado, pelo Poder Público e pela
mídia, com a seriedade que o caso merece. Raros são os jornais que
abordam a questão em profundidade, como deveriam, cumprindo, aliás,
o seu papel de porta-vozes da comunidade: o de apontar falhas e
cobrar soluções.
O assunto, quando enfocado,
merece apenas considerações superficiais, salvo raríssimas
exceções, e em geral é relegado às páginas internas dos cadernos
de economia. Poucos são os editoriais, dos principais órgãos de
imprensa, a esse respeito, e assim mesmo não têm a contundência e
a firmeza que deveriam ter. A televisão, por seu turno, age como se
tudo andasse às mil maravilhas e como se os milhões de
desempregados não passassem de marginais, despreparados para essa
era de globalização, que dão a entender que se trata de panaceia
para todos os males econômicos. Na verdade, é mais problema do que
solução.
O presidente Fernando Henrique
Cardoso (e apenas quando sua popularidade despenca nas pesquisas de
opinião) aborda, de passagem, o tema, e naquele tom triunfalista e
até um pouco pedante, que já se tornou característico de seus
pronunciamentos, anuncia projetos mirabolantes para a geração de
empregos, que até aqui não saíram do papel. Enquanto isso, milhões
de pais de família, aterrorizados com a situação, alguns
desempregados há dois anos (ou quase), veem a miséria rondando seus
lares. Gastam, inutilmente, solas de sapato à procura da ocupação
que lhes permita conseguir algumas migalhas para o sustento dos seus
lares e que pelo menos lhes devolva um pouquinho da autoestima
perdida, investindo, em vão, o restinho do capital de esperança que
ainda lhes sobrou.
Para atestar a gravidade do
problema (exercício desnecessário para quem está vivendo, nos
limites da resistência, esse terrível drama), citamos recente
pesquisa desenvolvida pelo Centro de Estudos Sindicais e de Economia
do Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
coordenada pelo pesquisador Márcio Pochmann, assunto que foi
manchete do jornal "Folha de S. Paulo", em 27 de janeiro
passado. Será que a equipe econômica leu? E FHC? E os líderes dos
partidos que se dizem "trabalhistas"? E os sindicalistas?
O estudo conclui que o Brasil
detém a incômoda (e vergonhosa) posição de 3º colocado no
ranking mundial de desemprego, entre os 141 países pesquisados, dos
mais diversos estágios de desenvolvimento. É superado, apenas, pela
Índia (a 1ª.) e pela Rússia (a 2ª.). E mais, revela que de 1986 a
1998, a contribuição brasileira, no total de desempregados no mundo
(oficialmente estimado em 138 milhões de pessoas), cresceu de 1,68%
para 5,61%!!! Por consequência, nossa "dívida social",
que já era astronômica, atinge, logicamente, as raias do absurdo.
Se levarmos em conta que
ostentamos a nona maior economia do Planeta (e já tivemos a 7ª.), o
quadro de exclusão assume proporções muito mais graves e
escandalosas. Promessas não faltaram neste período de queda livre
das taxas de ocupação. Foram inúmeras as vezes em que políticos e
especialmente economistas no governo (ou ligados a ele) vieram a
público para pedir "paciência" à população, dizendo
que primeiro era necessário debelar a inflação, para depois
promover o crescimento econômico. De uma coisa o brasileiro nunca
poderá ser acusado: de ser impaciente. Nesse aspecto, nem o
patriarca bíblico Jó superaria os nossos desempregados, verdadeiros
gênios na arte de esperar e de sobreviver.
O mais grave, na pesquisa da
Unicamp, é que foram consideradas apenas as pessoas que se enquadram
no chamado "desemprego aberto". Isto é, as que procuram
emprego, sem exercer nenhuma atividade remunerada. E estas chegam,
conforme cifras oficiais (não se pode acusar, portanto, os
pesquisadores de "manipulação" com fins políticos), a
7,7 milhões. Se forem considerados os brasileiros sem ocupação
fixa, que sobrevivem somente dos chamados "bicos", é
possível que o País passe pelo menos a Rússia para trás nesse
lamentável e deprimente ranking.
Os que estão empregados, por
sua vez, vivem o constante drama da possibilidade de demissão. Como
a "espada de Damocles", que permanecia presa apenas por um
frágil fio sobre as cabeças dos que tentavam empunhá-la, os cortes
ameaçam, indistintamente, tanto os funcionários hábeis e
competentes, quanto os que sobrevivem no emprego graças a
apadrinhamentos. Com um "estoque" tão grande, de mão de
obra ociosa, os trabalhadores não têm o mínimo "cacife"
para reivindicar o que quer que seja. Melhorias sociais? Nem pensar!!
As exigências dos empregadores são cada vez maiores, mesmo para as
atividades mais reles, e os salários que oferecem estão milhões de
anos-luz distantes daquilo que exigem. Onde os partidos, ditos
trabalhistas? Onde os sindicatos? É como se diz: "pimenta nos
olhos dos outros é colírio". E viva a globalização!!
(Editorial publicado na Folha
do Taquaral na primeira quinzena de fevereiro de 2000)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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