Efeito manada
Pedro J. Bondaczuk
Há pessoas, diria que a imensa maioria, que têm obsessão pela
“modernidade”, embora quando questionadas, nem mesmo saibam
definir com razoável precisão o que entendem por “moderno” e,
em contraposição, por arcaico, antigo, ultrapassado e, portanto,
descartável.
Não têm o menor senso crítico e gostam de navegar na onda do que
está em moda. Consideram tudo o que tenha, por exemplo, três anos
(se tanto) de produção como imprestável, substituível, em suma,
velho (em sentido pejorativo). Esquecem-se que o que é moderno hoje,
será ultrapassado amanhã e que nem sempre conseguirão acompanhar
(por falta de recursos financeiros, na maior parte das vezes) a onda
de momento.
Quando se trata de tecnologia, essa postura até que é compreensível
e, diria, elogiável. Se os cientistas e a indústria desenvolveram
máquinas que facilitem nossas vidas, e se tivermos dinheiro para a
sua aquisição, por que não usufruir desses avanços? As boas
novidades, nesse sentido, serão, obviamente, sempre e sempre
bem-vindas.
Quando se trata de estilo de se vestir, de se pentear, de se maquiar
etc., ou seja, de moda, a coisa já começa a pegar um pouco. Nem
tudo o que outras pessoas gostam e usam é, automaticamente, adequado
ao meu estilo de vida. Mas... ainda passa.
Todavia, quando se trata de artes - e não importa se música,
pintura, escultura, literatura etc. – aí a coisa pega de vez.
Descamba-se, não raro, para os modismos, passageiros e inúteis, que
satisfazem os gostos de determinada pessoa e não, necessariamente,
os nossos.
Seguir esse tipo de tendência, sem senso crítico e sem
justificativas, apenas porque “todo mundo” gosta disso ou
daquilo, é o que denomino de “efeito manada”. É seguir,
bovinamente, algum pretenso líder (que pode até ser o suprassumo da
burrice e do mau gosto), apenas para não ser acusado de “antiquado”.
Esse comportamento reflete absoluta falta de personalidade. E por que
ser a retaguarda do bando, quando se pode ser cabeça?
Não há obra de arte moderna e antiga. O que há são obras boas e
obras ruins. O critério de avaliação correto, portanto, não é o
temporal, de quando determinada obra foi produzida, mas o
qualitativo, se ela é boa ou ruim. Se adotarmos a maneira de avaliar
em voga, estaremos cometendo uma baita sacanagem com artistas de um
passado remoto (e não raro, até recente), que criaram não para o
tempo e o esquecimento, mas para a imortalidade.
Não podemos nos deixar induzir por modismos, como se estes pudessem
ou devessem determinar nossos gostos. Vejo, hoje em dia, muitos
pseudo apreciadores de pintura, por exemplo, torcerem o nariz para
determinados pintores, por serem figurativistas.
Na sua concepção, eles deveriam ser surrealistas, ou cubistas, ou
seja lá o raio que lhes queiram pespegar, e se não seguirem essas
tendências, as obras serão imediatamente discriminadas e
consideradas “coisas menores”, mesmo que haja genialidade,
perfeição formal, talento e paixão nessas pinturas.
A mesma coisa ocorre com a poesia. Já tive livro recusado por uma
editora, assim liminarmente, sem que o responsável pela seleção
das obras a publicar sequer lesse, simplesmente porque era de
sonetos. “Escreva coisas ‘modernas’ que eu publico”., foi a
resposta que ouvi. Saí irritadíssimo não por causa da recusa, mas
pela razão apontada para tal.
Também componho poemas concretistas, surreais, versos brancos,
cheios de metáforas (modéstia a parte, criativas e originais). Mas
não eram eles que eu queria publicar. Queria que meu público (que
felizmente não é pequeno) conhecesse meus sonetos, considerados de
excelente qualidade por vários professores de literatura que os
leram. Frustrei-me.
Quem determinou que apenas os textos considerados “modernos” são
válidos e bons? Que autoridade esse alguém tem para isso? Será que
a verdade passou a ter donos e esqueceram de nos avisar? Como se vê,
não são apenas as pessoas ingênuas que se deixam levar por
modismos. Há muitos pseudointelectuais (e até intelectuais
genuínos) que caem nessa esparrela. Como é perverso, com os
artistas, esse tal de efeito manada!!!
Por que não seguir o lema da cidade de São Paulo – “non ducor,
duco”, ou seja, não sou conduzido, conduzo – desenvolvendo
saudável espírito crítico e incentivando o máximo de pessoas a
fazerem o mesmo? Não sou, obviamente, contrário a mudanças. Mas
não quero mudar na marra, à minha revelia, por causa de tendências,
modas e, pior, modismos.
Antigo, na verdade, é arrotar uma pretensa modernidade, sem sequer
saber definir do que se trata. Por isso, recorro, mais uma vez, a
Carlos Drummond de Andrade – que já citei um milhão de vezes ao
tratar desse tema, mas que nunca é demais citar novamente. Em um
verso magistral (como tudo o que escreveu), o sábio poeta de Itabira
deu a entender que sua pretensão nunca foi a de ser moderno. Foi a
de ser eterno. A minha também…
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