Novo retrocesso
Pedro J. Bondaczuk
O mais recente pacote de
medidas, anunciado pelo ministro da Fazenda, Pedro Malan, para
substituir os recursos que estavam sendo gerados pelos descontos da
taxa de Previdência dos funcionários públicos aposentados, e que
deixarão de entrar para os cofres do governo, em decorrência de uma
decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que julgou essa cobrança
inconstitucional, foi uma decepcionante ducha de água gelada nos
que acreditavam em uma retomada do crescimento econômico, posto que
lenta e discreta, com a consequente geração de empregos, ainda
neste ano. Vamos terminar 1999, portanto, mais ou menos como acabamos
1998, mesmo não havendo agora o pretexto de crises externas, (na
Rússia, na Coreia do Sul, na Indonésia ou seja onde for), como
havia no ano passado.
As providências adotadas, (e
não se discute aqui sua necessidade ou não), todas de caráter
recessivo, já que implicam em elevação da carga tributária do
setor produtivo, resultarão, certamente, em aumento dos preços dos
produtos, o que vai desestimular e reduzir o consumo e provocar a
diminuição da produção, novas concordatas e falências e, como
seria de se esperar, mais demissões de trabalhadores. E o perverso
círculo vicioso da miserabilidade e exclusão social vai continuar
afetando (só Deus sabe até quando) a maioria esmagadora dos
brasileiros, que já não suportam mais tantos sofrimentos,
incertezas e aborrecimentos.
O maior problema nacional
hoje é o desemprego. Quem está nessa situação não pode esperar
até que a economia melhore ou até que esse "deus ex-machina"
do homem contemporâneo, chamado de "mercado", decida
quando, como e com que salário o indivíduo pode ser contratado ou
recontratado para trabalhar. Ninguém trabalha por esporte,
convenhamos. As contas continuam se acumulando na mesa desse pai de
família, desesperado em encontrar um meio honesto e decente de obter
o mínimo para a sua sobrevivência, em vão. Cada dia que esse
cidadão permanece desempregado, representa um retrocesso social de
anos, talvez irrecuperável, não apenas seu, mas principalmente dos
seus filhos.
Diante da atual situação, a
desigualdade social no Brasil, que já era, senão a maior, pelo
menos uma das maiores do mundo, tende, é claro, a se acentuar. Tudo
o que foi feito até aqui, para corrigir essa vergonhosa distorção,
está ameaçado de se perder. Nesse aspecto, o País vem retrocedendo
a passos largos, fazendo prever terríveis problemas sociais mais
adiante. Adiar nunca significou solucionar. Pelo contrário...
A violência urbana, fruto
amargo dessa mesma venenosa árvore do desemprego e da exclusão,
continua também aumentando, colocando toda a população na
defensiva, diante do crescente clima de insegurança e de medo que aí
está. É como se estivesse em andamento uma guerra civil não
declarada no País, e das mais sangrentas, pelo número de mortos
registrados diariamente nas grandes cidades brasileiras. Claro que o
aumento da criminalidade não pode ser atribuído à crise econômica
(ou não somente a ela). As causas são muitas e bem mais complexas
do que se dá a entender, sendo que o tráfico e o consumo de drogas
estão entre as principais. Mas que o desemprego, e o consequente
aumento da miséria (agravado por ele), contribuem para essa escalada
da violência, nem é preciso ser sociólogo para perceber que sim.
Todas as medidas anunciadas,
ou adotadas pelo governo, até aqui, para a criação de novos postos
de trabalho, nos vários setores de atividade econômica, são de
médio e de longo prazo. Será que os desempregados podem esperar
que esses programas, divulgados pela imprensa engajada com tanta
pompa e circunstância, do tipo "Avança Brasil" ou coisa
que o valha, amadureçam? Claro que não! Parece, na verdade, (e
tomara que estejamos errados), que esses solenes anúncios não
passam de meras peças de marketing político de um governo que
continua quebrando recordes de impopularidade. Mas as necessidades
dos milhões de brasileiros desempregados não esperam. A fome não
espera. O locador não espera. O dono do supermercado não espera
para receber o valor das mercadorias que o trabalhador sem emprego
necessita para alimentar os filhos. A farmácia não espera. Ninguém
espera o Brasil "avançar", sabe-se lá quando ou como,
para receber aquilo a que tem direito. Por que o trabalhador, cujo
único capital é a competência e a capacidade de gerar riquezas
(para outros), tem que esperar? Por isso, toda e qualquer medida
adotada, que venha a retardar a retomada do desenvolvimento econômico
nacional, por mais que os tecnocratas busquem justificar sua suposta
necessidade (e eles sempre têm alguma justificativa engatilhada), é
retórica, é desumana, é perversa e é, sobretudo, impatriótica.
Afinal, são pagos pela sociedade para encontrar soluções mais
justas e mais inteligentes do que estas...
(Editorial publicado na Folha
do Taquaral na primeira quinzena de outubro de 1999)
1 comment:
Grreat reading
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