Barato que sai caro
Pedro J. Bondaczuk
A Petrobrás, criada para
atender ao clamor da população brasileira em defesa das nossas
jazidas de petróleo, constitui-se, em seu meio século de
existência, em motivo de imenso orgulho para o nosso País. Graças
ao trabalho, à dedicação e à competência de seus milhares de
técnicos e de funcionários, o Brasil está muito próximo de se
tornar autossuficiente na produção dessa matéria-prima, cada vez
mais escassa e, por isso, economicamente cada vez mais valiosa.
Foram várias as tentativas,
nestes cinquenta anos de atividades da estatal, para privatizá-la.
Graças, no entanto, à mobilização da opinião pública, contrária
à entrega desse patrimônio a grupos alienígenas, escapou de cair
nas mãos dos sete grandes cartéis, que dominam essa atividade no
mundo, ou de ser por eles sufocada e ter que encerrar suas
atividades.
Líder mundial (disparada) na
prospecção e exploração de petróleo em águas profundas, com
tecnologias e métodos que ela própria criou e desenvolveu, a
Petrobrás é orgulho nacional e respeitada, temida e admirada no
mercado internacional. Mesmo assim, não há consenso, no País,
sobre a manutenção do seu atual status.
Há muita gente que torce o
nariz para qualquer forma de nacionalismo --- político, econômico
ou cultural --- e que não hesitaria em entregar a empresa, talvez a
preço de banana como foram os casos da Vale do Rio Doce e da
Companhia Siderúrgica Nacional (para citar apenas os exemplos
óbvios), ao capital estrangeiro, em nome de uma pretensa
"modernidade", cuja essência desconhecem e que não lhes
traz benefícios.
Por tudo isso, é lamentável,
sob todos os pontos de vista, a recente perda da P-36, a maior
plataforma de exploração de petróleo do mundo, ocorrida em alto
mar, perto do litoral fluminense, que resultou na morte de onze
funcionários que lá trabalhavam e em imensos prejuízos, não
apenas referentes ao custo da própria unidade e à matéria-prima
que deixa de ser extraída, mas, sobretudo, para a imagem, interna e
externa, da Petrobrás. O naufrágio fornece, sobretudo, argumentos
aos que defendem que o governo se desfaça desse empreendimento
vitorioso, que custou tanto esforço e recursos para se impor e se
tornar rentável.
Fosse esse desastre um fato
isolado, e ainda assim seria considerado dos mais graves, por todas
as implicações que envolve. Ocorre que se trata de mais um
episódio, em uma sucessão de dez, quinze ou vinte acidentes
inexplicáveis (ou mal explicados), envolvendo a empresa, que vem se
registrando, com enervante regularidade, nos últimos 18 ou 24 meses.
Nem bem a opinião pública
aplacou sua ira, com os derramamentos de óleo na Baía de Guanabara,
no Rio de Janeiro e no Rio Iguaçu e na Baía de Paranaguá, no
Paraná, com graves e talvez irreparáveis prejuízos ao meio
ambiente, e eis que o País perde a P-36, investimento de R$ 500
milhões de reais, que, provavelmente, até o final do corrente ano,
tornaria o Brasil livre da necessidade de importações de petróleo
(produto com tendência a se tornar cada vez mais caro no mercado
internacional, à medida em que for ficando mais escasso).
Um acidente, por maiores que
sejam as evidências de descuido, pode ser atribuído à fatalidade.
Ninguém, em sã consciência, deseja que ocorra. Mas ocorre, à
revelia das prevenções. Afinal, trata-se de atividade bastante
perigosa, de grande risco, onde desastres não avisam a hora que vão
acontecer. Ocorrem a despeito de toda e qualquer prevenção que se
faça. Dois, ou até três acidentes por ano, de pequenas proporções,
ainda são admissíveis. Mas tantos, quantos os que vêm se
verificando nas várias unidades da empresa, são muito preocupantes!
Indicam, no mínimo, descuido, ou até mesmo, desprezo pelas mais
elementares normas de segurança.
Petroleiros experientes, com
vários anos de serviço na Petrobrás, apontam a terceirização de
boa parte dos serviços da estatal como a grande vilã, responsável
por tanto prejuízo, material e moral. Por se tratar de uma atividade
muito competitiva, a redução de custos tornou-se premente
necessidade. Até aí, se entende. Por consequência, a firma
terceirizada oferece seus serviços a quem a contrata a preços
mínimos. Para que isso se torne possível, paga, evidentemente,
salários irrisórios aos seus funcionários. Caso contrário, não
teria nenhum lucro e muito menos condições para existir.
Empregados mal remunerados,
porém, não são, diz a lógica, os de melhor preparo e treinamento.
Atuando em uma atividade de tamanho risco, como a da prospecção,
exploração e refino de petróleo, só por verdadeiro milagre
deixariam de cometer erros. E cometem em profusão. E estes custam
muito, em termos não somente de dinheiro, mas de prestígio perdido
e, o que é o pior, de perda de vidas. É o caso típico em que o
barato sai extremamente caro.
Não se contesta a necessidade
de redução de custos. Mas é preciso avaliar no quê e onde se pode
economizar. Exemplo? Não fazer burradas, que acabam sendo até
motivos de anedotas, como aquela tentativa, no mínimo burlesca, de
mudar o nome da empresa de "Petrobrás" para "Petrobrax",
com "x". O episódio não teria maior importância e
ficaria restrito somente ao campo do folclore das grandes mancadas
nacionais, se não representasse desperdício de alguns milhões de
reais. É nisto que se deve economizar, nunca em mão de obra
especializada e em equipamentos e métodos para assegurar, senão a
segurança total, que é impossível, pelo menos a que mais se
aproxime do rigor absoluto.
(Editorial da Folha do
Taquaral de 15 de abril de 2001).
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