Saturday, August 25, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Falta continuidade


Falta continuidade



Pedro J. Bondaczuk


O Plano Collor, que atropelou a sociedade em 16 de março de 1990, foi cantado e decantado, em verso e prosa, como a solução para todos os problemas econômicos brasileiros e considerado absolutamente “imexível” – neologismo consagrado pelo ministro do Trabalho, Rogério Magri – pelos seus autores.

Todavia, com menos de um ano de execução, eis que está sendo deixado de lado, substituído por outro pacote. A ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello, nega que o programa original esteja sendo abandonado. Argumenta que as medidas anunciadas na quinta-feira, são simples complementações do plano original, que vinha fazendo água por todos os lados, prestes a naufragar.

Muitos economistas, todavia, discordam. E preveem que as mudanças econômicas serão impotentes para conter o ritmo inflacionário. Um dos que não acreditam na eficácia do novo programa é o coordenador do cálculo do índice da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo, Juarez Rizzieri.

Ele vai mais longe e alerta para a iminência de uma hiperinflação a curto prazo, aliada a um processo muito mais perverso, a hiperrecessão. Tomara, porém, que ele não esteja certo, para o bem de todos. O sucesso ou fracasso do plano não é uma preocupação que deva ser apenas do governo ou dos políticos. Nem somente dos que elegeram o presidente Fernando Collor.

É a vida de cada brasileiro que está em jogo, com sua qualidade sendo afetada na medida em que se consiga ou não a retomada do desenvolvimento, sem que o monstro inflacionário siga levando os esforços de cada um ao absoluto desperdício.

Os economistas do governo precisam se conscientizar de que não estão lidando apenas com frios números e com complicadas teorias econômicas, mas com destinos de pessoas, na hora de tomarem suas decisões. Trata-se de uma responsabilidade muito séria, que não admite erros.

Uma falha pode comprometer o futuro, muitas vezes de maneira irreversível, de milhões de cidadãos. Este tipo de alerta não é novo e nem somente brasileiro. O escritor inglês do século XIX, Walter Bagheot, já constatava naquela ocasião, no Reino Unido: “Os economistas políticos britânicos não falam de homens reais, mas de pessoas imaginárias – não de homens como nós os vemos, mas de homens inventados para a conveniência do poder”.

Talvez tivesse sido por causa dessa insensibilidade que o escritor Lawrence J. Peter tenha desabafado: “Um economista é um especialista que saberá amanhã porque as coisas que previu ontem não aconteceram hoje”. É bem o caso brasileiro da atualidade.

(Editorial publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 3 de fevereiro de 1991).


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