Tuesday, August 07, 2018

CRÔNICA DO DIA - Como seria?


Como seria?


Pedro J. Bondaczuk



A moderna tecnologia, notadamente a de comunicação – computador, internet, celular, mp4, IPAD, TV LCD de plasma ou 3D e vai por aí afora – e não apenas ela, mas também os avanços nos transportes, vieram a facilitar, em muito, a vida dos escritores. Até aí, eu não disse nada de novo. Limitei-me a ressaltar o óbvio e sequer fui original, já que escrevi a respeito um montão de vezes.
Ademais, todas as engenhocas que citei (e uma infinidade de outras que não mencionei, mas que ficam implícitas), trouxeram facilidades e conforto não somente para profissionais do texto, mas para todos. Claro, esse “todos” é relativo. Refere-se aos que tenham condições de pagar por tais quinquilharias. Então por que mencionei especificamente os escritores? Ora, por razões óbvias. Pelo fato deste espaço ser voltado à literatura e a quem a faz. Só por isso.
Fico perguntando cá aos meus botões, nos meus raros momentos de ócio: como seria a vida, e mais, a obra dos chamados “clássicos”, (já nem digo das letras mundiais, mas restringindo o âmbito, das nacionais) se pudessem contar com todos esses equipamentos? O que Machado de Assis, por exemplo, faria com todos esses recursos tecnológicos? Como tudo isso influenciaria nos enredos de seus contos, romances e novelas e na descrição e comportamento de seus personagens? Sua produção seria a que conhecemos ou se multiplicaria? Creio piamente nesta segunda hipótese.
Claro que só posso especular a respeito do que nunca aconteceu e nem pode (óbvio) acontecer. Mas o campo para a especulação é livre, irrestrito, vastíssimo, diria infinito, do tamanho da imaginação de cada um. E a minha, asseguro, não é pequena. Machado de Assis, com certeza, adquiriria todo esse aparato tecnológico, caso ele estivesse ao seu dispor. Afinal, era um sujeito tido como “moderno” já naqueles idos longínquos de metade do século XIX, época em que as grandes descobertas, que redundaram no mundo que temos diante de nós hoje, começaram a pipocar umas após outras.
O Bruxo do Cosme Velho teria, claro, seu computador. E à medida que a capacidade de memória fosse sendo expandida em novos modelos, trocaria, amiúde, seu aparelho “velho” por outro mais atualizado e potente. Disporia de todos os softwares que tivessem algo a ver com comunicação, como os editores de texto (não sei se o último Corel disponível, ou se o Indesign, ou se outro qualquer, ainda melhor, que eu sequer desconfie que exista), entre tantos outros.
Navegaria com a maior familiaridade na internet e teria, no seu menu de favoritos, os principais sites e blogs voltados à Literatura (quem sabe, o Literário ou, até mesmo, para o meu orgulho, o meu espacinho pessoal cujo nome de fantasia é “O Escrevinhador”?). Seria, certamente, blogueiro. E nos brindaria, todos os dias, com alguma crônica ou conto inéditos, novinhos em folha. Seria um luxo!
Será que Machado de Assis seria “twitteiro”? Desconfio que sim. E qual seria seu endereço no twitter? @machado? @massis? Não! Creio que seria mais criativo, Assumiria, de vez, o apelido que seus admiradores (e só não o admirava ou admira quem fosse ou quem é analfabeto explícito ou quase, que soubesse ou que saiba somente juntar as palavras sem entender seu sentido e se limitasse ou se limite a “desenhar” o nome, classificado por essa razão de “analfabeto funcional”, que o Brasil teve e tem em profusão).
Quem aprecia só um tiquinho a leitura (e nem precisa ser “rato de biblioteca”), já deve ter lido alguma coisa de Machado. E se leu... será muito burro, ou terá péssimo gosto, se não gostou. E se leu e apreciou sua escrita, concordará com o apelido dado ao nosso maior escritor: “Bruxo do Cosme Velho”. Seu endereço no twitter, portanto, provavelmente, teria relação com esse cognome. Seria, estou certo, @bruxo. Faz bem o gênero do Machadão.
Já imaginaram se no tempo em que ele viveu e produziu toda a sua obra já existisse toda essa parafernália? Capitu judiaria muito mais do Bentinho do que judiou. Este morreria de ciúmes e jamais acabaria com a incerteza se era ou não traído. Afinal, veria em seu filho, à medida que este crescesse, cada vez mais semelhanças com Escobar. Sua “dissimulada” amada seria mulher moderna, liberada e bem informada. Trabalharia, possivelmente, como gerente de alguma multinacional ou de um banco ou coisa que o valha.
No Carnaval, sairia como rainha da bateria da Mangueira, para deleite dos sambistas e desgosto de Bentinho, que a vigiaria como uma sombra, de todas as maneiras que lhe fossem possíveis. Tentaria, por exemplo, ter acesso aos seus e-mails, para fiscalizá-los e saber se havia algum suspeito, com texto, digamos, mais tórrido e enviado a Escobar.
Entraria no antigo Orkut, no Facebook, no Instagram ou em qualquer outra rede social, na tentativa de descobrir se o rival integrava os respectivos círculos de amizade de Capitu. Mas esta manteria a discrição e a compostura. Permaneceria mais misteriosa e impassível que a multimilenar Esfinge. E Bentinho? Sofreria o diabo, muitíssimo mais do que Machado o fez sofrer.
No mais... cada um de vocês que imagine como seria o comportamento do Machadão e, por consequência, dos seus milhares de personagens (só de contos, li mais de 200 que ele escreveu, descrevendo gente de todos os tipos, perfis e atitudes), caso tivesse acesso a toda esta parafernália tecnológica que para nós é tão familiar, senão trivial.

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