Concorrência
e parceria
Pedro J. Bondaczuk
Há pessoas que encaram a vida de forma permanentemente belicosa.
Estão sempre com duas pedras nas mãos para atirar no primeiro
incauto que lhes cruze o caminho. Vivem de mau humor e não têm o
menor escrúpulo em descarregar sua bílis nos outros. São incapazes
de vislumbrar beleza, grandeza e transcendência ao seu redor. Tenho
analisado muito este tipo e criei, até, uma legião de personagens
com essas características. Afinal, “modelos” é que não me
faltam e eles andam dando sopa por aí..
Outros tantos não entendem o sentido da palavra concorrência. Acham
que quem concorre com eles é, liminarmente, seu inimigo. Vislumbram
a vida como uma grande competição (e em certo aspecto é), em que
somente os fortes e os espertos se saem bem. Nem sempre é assim (ou
pelo menos não deveria ser) Não consigo assimilar essa postura,
embora a respeite. Procuro, porém, por questão de prudência,
colocar distância de trilhões de anos-luz de pessoas assim. Prefiro
apostar em parcerias.
Encaro meus colegas escritores não como competidores por um mesmo
espaço e muito menos como adversários aos quais devo derrotar, sob
pena de ser derrotado por eles. Posso, perfeitamente, competir com
alguém e ainda assim tê-lo como parceiro. Afinal, temos importante
afinidade, a literatura e se formos sábios e práticos,
partilharemos nossos conhecimentos e habilidades e ambos cresceremos.
Para que um cresça, não é condição sine qua non que o outro
diminua até desaparecer. Podemos (e devemos) crescer juntos.
Tive um imenso privilégio de conviver com escritores
talentosíssimos, alguns já falecidos, que infelizmente não tiveram
projeção proporcional aos seus inegáveis talentos. Três se
destacam em minha memória, dos quais recebi profunda influência,
que me tem sido utilíssima neste complicado, às vezes tenebroso e
não raro frustrante mundo das letras: Mauro Sampaio, Maurício de
Moraes e Uassyr Martinelli. Claro que há muitos outros, mas minha
convivência com os três citados foi muito mais duradoura e profícua
(e creio que para eles também).
Foram eles, por exemplo, que me abriram os olhos para determinadas
nuances da poesia que antes de conhecê-los eu não havia atentado.
Foram eles que vislumbraram em mim um poeta, coisa que até então eu
duvidava (e que, sinceramente, ainda tenho grandes dúvidas).
Éramos, simultaneamente, concorrentes e parceiros. À primeira
vista, pode parecer um paradoxo. Paradoxal ou não, porém, era assim
que nos sentíamos. Estabelecemos uma “concorrência” de alto
nível, cada um buscando superar o outro em sensibilidade e, acima de
tudo, em criatividade. Líamos, uns para os outros, nossas produções
e criticávamos, sem dó e nem piedade, o que entendíamos que fosse
criticável.
Tais críticas, contudo, jamais chegaram a abalar nossa amizade,
sequer a arranhá-la. Porquanto, não nos limitávamos a criticar,
mas apontávamos os defeitos detectados nos respectivos textos e
sugeríamos formas de correção. Éramos (e nos sentíamos assim),
concorrentes, mas, simultaneamente, também parceiros. Muitos dos
meus melhores poemas têm que ser partilhados com esses irmãos de
fé, pois só ganharam qualidade por eu acatar seus reparos a eles. E
vice-versa, claro.
Sempre que posso, trago, em meus textos, seus nomes e suas produções
literárias à baila. Em um país sem memória, infelizmente foram
esquecidos. Contudo, voltam a ser lembrados (e admirados) quando
reproduzo trechos de seus magníficos poemas, crônicas e contos em
todos os livros que tenho escrito, que, de uma forma ou de outra,
melhoram a qualidade do que escrevo.
Fomos concorrentes, sim, mas jamais adversários e muito menos
inimigos. Concorremos, sem dúvida, mas como pessoas que sempre se
admiraram, quiseram bem umas às outras e principalmente se
respeitaram. Sem abrir mão de nossos respectivos estilos e
personalidades, fomos fiéis e leais parceiros e, muito mais do que
isso, amigos no sentido lato do termo. E o lucro dessa parceria foi,
é e sempre será partilhado, em idênticas proporções, por nós.
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