Por
que se é escritor?
Pedro
J. Bondaczuk
A
vida do escritor é mais feita de sonhos e de fantasias do que de
conquistas tangíveis e reais. Poucos, pouquíssimos conseguem chegar
ao estrelato, ao topo da atividade e conquistar a tal da
“imortalidade” (como se esta fosse possível a nós, míseros
humanos). Não a do corpo, evidentemente, mas a do nome. Alguns
sonham que a literatura os deixará, se não ricos, pelo menos com
uma condição econômica confortável. Pouquíssimos conseguem. A
bem da verdade, a maioria gasta muito mais para ter livros publicados
do que ganha com a publicação.
Se
a atividade é tão decepcionante, por que tanta gente envereda por
ela? Qual seria a sua resposta se eu lhe perguntasse, de chofre: por
que você é escritor? Não vale utilizar estereótipos e vir com
aquele blá-blá-blá de “porque amo escrever”, ou “porque a
escrita me é como o ar que respiro”, e outros tantos clichês. A
maioria dos homens de letras que conheço nunca parou para pensar
nisso. E importa? Saber a razão porque se abraçou a atividade trará
algum ganho sobressalente? Entendo que não.
Numa
rápida pesquisa, feita no Google, a esse propósito, colhi, meio que
a esmo, quatro respostas diversas a esse questionamento. Santiago
Ribeiro, por exemplo, escreveu a propósito: “Crio romances
justamente por não conseguir viver um de verdade, dessa forma as
minhas histórias conseguem amenizar a minha solidão. A alma de um
escritor é tão atribulada de emoções que é necessário
anestesiá-la, e a minha fonte inesgotável de anestesia são as
palavras, doces palavras que tento colocar para fora do meu
imprestável coração”. Um tanto dramático, vocês não acham?
Mas é um motivo plausível e válido.
Já
Fernando Alvim nega essa condição. Garante: “Não sou escritor,
sou alguém que escreve livros”. Ademais, qualquer pessoa que tenha
domínio da escrita pode exercer essa atividade, desde que respeite
suas especificidades. Ser escritor sequer é profissão. Eu, por
exemplo, sou jornalista e, no entanto, faço e publico livros.
Portanto, “estou”, e não “sou” escritor. Não parece, mas é
diferente.
Outro
que nega essa condição, entre os nomes que pesquisei, é o
folclorista gaúcho Paixão Côrtes. Ele foi escolhido patrono da
Feira do Livro 2010 de Porto Alegre. Trata-se de intelectual bastante
conhecido e respeitado por suas ideias e criatividade. Ele afirmou,
em entrevista à imprensa do Sul: “Na realidade, não sou escritor.
Sou um escrevinhador que recolho as vivências do povo, salientando a
história que herdamos dos nossos ancestrais”. Eu também, Paixão,
eu também.
O
consagrado autor de “Jubiabá”, “Gabriela cravo e canela” e
tantos e tantos sucessos literários, Jorge Amado, deu, há alguns
anos, o seguinte depoimento a propósito: “Escrever, para mim, é
uma coisa que faz parte, que está dentro de mim, é a única coisa
que eu sei fazer. É uma coisa que vem das minhas entranhas, é uma
necessidade: eu sinto que tenho que fazer aquilo. Mas também é um
prazer e eu me divirto ao escrever. Me cansa, me esgota, mas eu me
divirto... eu não sei fazer nada que não me divirta”.
Eu
também, saudoso mestre, eu também. Por isso, já larguei atividades
bastante rentáveis, que eu sabia executar muito bem, mas, no
entanto, não me divertiam. Eram, para mim, sessões de tortura. E
como não sou masoquista e a vida não tem reprise...
De
todos estes depoimentos, o que mais gostei foi o de Mário Vargas
Llosa, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 2010. “Mais que
escritor, sou um reescritor”, afirmou o autor de “A guerra do fim
do mundo”, em conferência que proferiu, em outubro de 2010, dias
depois de ser premiado, em Porto Alegre. Afirmou, na oportunidade:
“Todo escritor sonha secretamente não receber prêmios e
reconhecimentos. Sua ambição é desmedida, é ser um grande
escritor”.
E
na sequência, Mário Vargas Llosa emendou: “Desde quando comecei a
escrever, quis ser alçado a Victor Hugo, com ‘Os miseráveis’, a
Faulkner, trazer o deslumbramento indescritível que senti. Esse
sonho me condena a uma permanente frustração, já que, se um
escritor chega a ser um desses catedráticos que admira, isso ocorre
quando já não está aqui”.
O
escritor peruano tem toda razão. O sucesso de um escritor genial,
quando vem (isso se ocorrer, o que é muito raro) ocorre apenas após
sua morte. E de que isso lhe adianta? Qual a vantagem que tem? Irá
ressuscitar e viver outra vida, mas em condições ideais? Não, não
e não!!! Afinal, o escritor sequer consegue que lhe massageiem o
ego, salvo raras e honrosas exceções, quando recebe rasgados
elogios não somente dos “afetos”, como principalmente dos
desafetos.
Claro
que escrevo, também, de olho no sucesso. Afinal, recorrendo a uma
gíria muito antiga, dos anos 50: eu não sou tatu!!! Sonho, desejo e
principalmente deliro de olho no que entendo por êxito, por vitória,
por consagração. Vejo-me cercado por milhares de leitores, em
concorrida e interminável noite de autógrafos, brigando, aos
empurrões, por uma palavrinha minha, mesmo que banal e das mais
triviais.
Qual
escritor não tem esse sonho recorrente? O engraçado é que,
justamente os mais vaidosos, com os quais conversei a respeito, foram
os que negaram com maior ênfase que tenham esse desejo. Pois é,
somaram ao pecado da vaidade excessiva que lhes é peculiar (a que
teria levado Lucifer a cair em desgraça), o da mentira. Vejam só,
escrevi, escrevi e escrevi e não respondi à questão posta no
início: por que sou escritor? Sinceramente? Não sei!!! E você sabe
por que é?
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