Vende-se novo “milagre”
Pedro
J. Bondaczuk
O
brasileiro sempre foi condicionado a acreditar em “milagres”,
especialmente os que dizem respeito ao desenvolvimento econômico e à
justiça social. Tivemos, por exemplo, que conviver, até 1982, com
“milagrosas” performances de crescimento do Produto Interno
Bruto, superando, na ocasião, as de países tidos e havidos como
prósperos, como Japão, Alemanha Ocidental e Itália.
Alguém
esqueceu, somente, de dizer à opinião pública que tudo isso estava
ocorrendo com capitais alheios, tomados emprestados, e que um dia
teriam que ser devolvidos, acompanhados de leoninos juros, fora
outras despesas, como taxas de risco e as indefectíveis comissões,
disfarçadas em rubricas técnicas, capazes de esconder a verdadeira
natureza desses desembolsos.
De
16 de março para cá, alguns meios de comunicação passaram a
vender a ideia de um novo milagre para a sofrida população do País:
a de que, com um único “tiro na testa”, o tigre da inflação,
que então emplacava olímpicos 84% no mês, seria abatido pelo
presidente Fernando Collor, então empossado no poder, através do
seu plano Brasil Novo.
Passados
nove meses, no entanto, o que era sonho está virando pesadelo. A
fera, que se julgava abatida, despertou do seu torpor, com a mesma
voracidade de antes. Estava apenas anestesiada, e mal. A prometida
inflação zero ficou para as calendas.
O
programa salvador, anunciado aos quatro ventos pelo rufar dos
tambores ufanistas, agora é como um barco instável, fazendo água
por todos os lados. Velhas “soluções” foram desarquivadas, como
o apregoado “entendimento nacional”, que já teve tantos outros
nomes, desde a década de 1930, ou até mesmo antes dela.
Mais
uma vez a conta de um Estado paralítico e gigante, por isso
ineficiente e perdulário, é mandada para quem sempre sustentou seus
delírios megalomaníacos e seus vícios seculares: o trabalhador.
Passa-se, à opinião pública, a impressão da proximidade de um
acordo, de um pacto nacional, quando sequer houve consenso para a
elaboração da pauta.
Contesta-se,
inclusive, a legitimidade das partes envolvidas na negociação. O
grupo sindical que fala em nome da classe operária exprime a opinião
dominante da categoria? Os interlocutores do empresariado representam
a maioria dos empresários ou apenas um pequeno grupo?
Enquanto
isso, apregoa-se a ideia, errônea, de que o diálogo, para o
desejável entendimento, está evoluindo. De que o Plano Collor é
impecável e só não está dando certo em virtude da resistência da
sociedade a ele. De que o “milagre” será possível fazendo com
que, num passe de mágica, vícios, erros, corrupções e a inação
de muitas décadas serão corrigidos mediante um conjunto de regras
teóricas, saído de cabeças iluminadas e a curtíssimo prazo. Como
se vê, tudo “continua como antes no quartel de Abranches”.
(Editorial
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 4 de
dezembro de 1990).
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