Wednesday, September 19, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Sumiço da poupança


Sumiço de poupança


Pedro J. Bondaczuk


A forte redução da taxa de investimentos é um dos maiores, senão o maior obstáculo para que a meta de crescimento da economia, estabelecida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, de 6% do Produto Interno Bruto para este ano, se concretize. Para que o objetivo fosse factível, alguns economistas afirmam que seria necessário investir em torno de 23,5% do PIB --- ou seja, o que era investido nos anos 70 --- de recursos provenientes da poupança.

No entanto, esse percentual gira atualmente ao redor dos 16% (em 1995 foi de 15,8%), com um déficit, portanto, de quase oito pontos. O chefe do Departamento Econômico do BNDES, Armando Castelar Pinheiro, publicou, recentemente, em forma de artigo, no jornal "O Estado de São Paulo", um detalhado estudo a respeito.

O economista revela, por exemplo, que no período 1987-1995, 6,4% do PIB em poupança simplesmente sumiram, por ano. Foram bilhões de reais que deixaram de ser investidos e que, por consequência, não apenas frearam o desenvolvimento brasileiro, mas até fizeram o País andar em marcha a ré. Os nefastos resultados estão aí, representados pela enorme crise social.

Nesse mesmo espaço de oito anos, a população cresceu, embora a taxas menores do que nos anos 70 (atualmente o crescimento é de 1,4% anuais). Onde foi parar todo esse dinheiro? Virou fumaça, na voragem dos vários planos heterodoxos adotados desde 1986 (cruzado, verão, Collor), que implicaram em quebras de contratos e espantaram os poupadores, fazendo com que se voltassem para o consumo.

A poupança interna é o capital de investimento por excelência de qualquer país. Mas para ser atrativa, precisa, mais do que a oferta de altos rendimentos, do fator confiança. E foi isso o que se perdeu em decorrência do confisco determinado no início do governo Collor.

Já nos anos 80, por razões várias que não cabem discutir aqui, a taxa de investimento havia sofrido forte retração. Caiu de 23,3% do PIB ao ano para 18,3%, atingindo o fundo do poço em 1992 (a preços de 1980) com 13,6%, de acordo com o mencionado artigo de Armando Castelar Pinheiro, intitulado "O caso da poupança que tomou Doril" (em referência à propaganda de um analgésico que faria a dor sumir).

Investimentos que assegurem o desenvolvimento sustentável, de que tanto o País precisa para saldar sua monumental dívida social, requerem, além da confiança na manutenção das regras do jogo econômico, de uma economia estável. O Real vem proporcionando essa estabilidade, mas precisa ainda de inadiáveis ajustes para se consolidar.

Necessita de profundas reformas estruturais --- que não se restrinjam apenas à superfície --- nos sistemas tributário, previdenciário e sobretudo na administração pública. Além disso, tem que resgatar a confiabilidade da poupança e sua atratividade, para dispor de capitais de investimento.

Muitos passos já foram dados nessa direção, mas ainda são insuficientes. É preciso andar mais rápido, até para compensar o crescimento vegetativo da população. O Brasil precisa recuperar tempo, dinheiro e as esperanças desperdiçados nos anos 80, que não sem razão, passaram para a história com o rótulo de "década perdida" para o desenvolvimento.

(Editorial número um, publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 22 de julho de 1996).


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