Friday, September 14, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Difícil renegociação


Difícil renegociação


Pedro J. Bondaczuk


O principal negociador da dívida externa brasileira, embaixador Jório Dauster, retoma, hoje, em Nova York, as negociações da nossa dívida externa, oportunidade em que deverá mais ouvir do que falar. O Comitê Assessor dos bancos credores, que aceitou mal a proposta feita pelo governo de Collor em setembro passado, certamente irá contrapropor algo menos radical do que o pagamento dos débitos de conformidade com a capacidade do País de pagar o que, por sinal, é não somente lógico, mas o procedimento mais racional a ser adotado numa circunstância dessas.

É oportuno que as coisas sejam colocadas em seus devidos lugares. Negociar não significa impor condições, de forma absoluta e intransigente. Portanto, a perspectiva é a de que muita conversa deverá rolar --- acompanhada de ameaças e pressões sutis ou até ostensivas da parte dos banqueiros, de acordo com as circunstâncias --- antes que se chegue a um princípio de entendimento.

Desta vez, a equipe negociadora brasileira conta com um respaldo muito importante, com o qual as anteriores não contavam: o apoio do Poder Legislativo, como manda a nova Constituição. Isto quer dizer que tem o aval da população, já que os legisladores, por haverem sido eleitos, representam --- ou deveriam representar --- a opinião da maioria.

Não seria justo neste momento, em que toda a sociedade é convocada a um enorme sacrifício para deter um processo que já ameaçava descambar para a hiperinflação, manter essa válvula inflacionária, que é a exportação de capitais, aberta.

Até porque, nunca chegou a ficar absolutamente claro para ninguém em que bases o endividamento se deu. Se quem tomou o empréstimo estava legitimado para agir assim. Mas este é um outro assunto. Falta uma "glasnost", uma transparência a respeito.

Aliás, nem a questão da dívida externa é nova e nem as penosas renegociações também o são. O presidente Campos Sales, por exemplo, antes de assumir o governo no início do século, renegociou os débitos, então também insuportáveis, e em bases muito mais justas do que aquilo que os credores atuais desejam.

Oswaldo Aranha também aliviou o peso do desembolso, na década de 1930, durante a gestão de Getúlio Vargas. O presidente Collor, em entrevista recente que concedeu quando de sua visita a Portugal, no mês passado, definiu negociações dessa natureza como um jogo. De um lado, os credores, desejando obter um máximo de desembolso num prazo mínimo. De outro, o devedor, pretendendo exatamente o inverso.

No mais, as declarações bombásticas, as ameaças ostensivas ou veladas e as pressões, não passam de táticas de jogador, querendo mostrar que tem melhores cartas do que realmente possui.

(Editorial publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 6 de novembro de 1990).

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