Real em crise
Pedro J. Bondaczuk
O sétimo aniversário do
lançamento do Plano Real, que tirou o País da rota da hiperinflação
e contribuiu, nos dois anos iniciais, até para que se fizesse uma
incipiente, porém inédita, distribuição da renda nacional,
transcorreu, no domingo passado (1º de julho), sem muita coisa a
comemorar.
A maioria das conquistas
obtidas naqueles memoráveis primeiros tempos, que despertaram enorme
euforia na população, se diluiu. E o contingente de brasileiros
abaixo da linha da miséria, que havia tido ligeira redução, voltou
a crescer, na onda do desemprego dos últimos três ou quatro anos,
atingindo, hoje, 53 milhões de pessoas. Ou seja, o equivalente à
população total da Grã-Bretanha.
Para complicar, a economia
brasileira está cada vez mais dependente de capitais externos e o
governo, por causa disso, se desdobra para atrair investidores (o que
é louvável e digno de elogio), embora o fluxo de investimentos do
Exterior em 2001 tenha sofrido considerável retração.
Ocorre que, junto com estes
capitais produtivos, úteis e indispensáveis, acorrem, ao nosso
mercado financeiro, especuladores profissionais. Tratam-se de raposas
velhas, bastante escoladas na arte de ganhar dinheiro sem dar coisa
alguma em troca, que vivem apenas disso: da agiotagem internacional,
posto que disfarçada. Não têm preocupações sociais ou
humanitárias ou quaisquer sentimentos. Só conseguem enxergar
cifrões e mais cifrões à sua frente.
Está aí uma das principais,
senão a principal das vulnerabilidades do País! Basta o mínimo
sinal de crise na Ásia, na Rússia, na Indonésia ou seja lá onde
for, para estes verdadeiros prestidigitadores, que sabem como ninguém
jogar o jogo do capitalismo, desestabilizarem a nossa economia e
lucrarem muito com isso.
Retiram daqui, em um piscar de
olhos, milhares, milhões ou até bilhões de dólares, incluídos
lucros astronômicos, que não conseguiriam em nenhum outro lugar do
mundo, forçando o Brasil a recorrer a novos e crescentes
empréstimos, internos ou externos, para conservar suas reservas,
complicando suas contas e ficando, por consequência, mais vulnerável
ainda.
Em meados dos anos 80, a
dívida externa brasileira andava pelos US$ 90 bilhões e era
considerada um escândalo. Hoje, orça a pelo menos US$ 200 bilhões
e ninguém fala disso! Endividar-se tornou-se "coisa normal".
Nosso governo, na tentativa de evitar essas sangrias desatadas, que
acontecem invariavelmente a cada crise financeira internacional,
incontinenti, eleva juros a taxas absurdas (em 1998, passaram de
48%), para atrair capitais. E atrai, sem dúvida! Quem é bobo?! Os
citados especuladores trazem, pois, de volta o seu "dinheiro
viajante", até farejarem um mercado mais lucrativo, um negócio
melhor ou detectarem qualquer risco de prejuízo, o que para eles é
o maior dos palavrões.
É preciso que o País se
livre desse tipo de dependência, que aliás não tinha em passado
recente. Suas reservas em moeda forte eram garantidas por superávits
anuais constantes, quando não crescentes, o que se repetiu por
vários anos seguidos, até 1994. O "lucro" no comércio
exterior girava então por volta de US$ 12 bilhões anuais.
Desde o advento do Plano Real,
no entanto, o saldo passou a ser deficitário. O País escancarou o
seu ultracobiçado mercado a quem quisesse operar aqui, utilizando
os preços internacionais (tentadores, diante de um real
supervalorizado, já que um dólar comprava apenas R$ 0,80), como
forma segura para controlar a inflação. Houve, inclusive, registros
seguidos de deflação.
A desvalorização acumulada
do real em sete anos, que gira em torno dos 168%, é evidente, traz
sérias dificuldades para todos nós. Boa parte dos produtos
essenciais que consumimos ou é importada, ou tem componentes que o
são. A cada subida do dólar (por causa do "nervosismo do
mercado em decorrência da crise argentina", como se propala, o
que é o cúmulo!), a vida da população se complica mais e mais.
Medicamentos,
eletrodomésticos, automóveis e até mesmo o "pãozinho francês
nosso de cada dia" encarecem a cada elevação da moeda
norte-americana (ou desvalorização da nossa, como queiram), já que
70% do trigo utilizado é proveniente de importação. Fica a dúvida
na população sobre se os índices que medem a inflação (e para
complicar há uma grande quantidade deles, o que confunde ainda mais
a dona de casa e o cidadão leigo em economia) estão corretos ou se
a vírgula dos percentuais divulgados pelos mais diversos institutos
de pesquisa não deveria ser deslocada uma ou duas casas para a
direita.
De qualquer forma, os preços
(e não somente os atrelados ao dólar, mas especialmente as tarifas
públicas) não andam, ultimamente, tão comportados. Até porque,
esses aumentos não são tão parcimoniosos quanto os de salários
(quando concedidos). Tomara que as autoridades encontrem a fórmula
ideal para repor o País na trilha do desenvolvimento. E que o real
se estabilize de vez, como moeda forte e atraente e nos dê motivos
para euforia, como há cinco anos, por exemplo. Não podemos
desperdiçar tamanho sacrifício por nada!
(Editorial da Folha do
Taquaral de 3 de julho de 2001).
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