Resgate pela educação
Pedro J. Bondaczuk
A educação é tida como o
instrumento de redenção do povo brasileiro. É o único ponto em
que os extremos ideológicos se tocam e que desperta unanimidade
nacional. Direita e esquerda concordam em grau, gênero e número que
é preciso educar a população para combater, e eventualmente
erradicar, a miséria no País e, com isso, cortar as raízes da
violência e da criminalidade. Os dois lados divergem, no entanto, no
essencial: na forma e nos objetivos do processo educativo.
Há, sobretudo, enorme
incoerência em torno do tema, que fica evidente quando se compara o
discurso dos políticos com a ação dos administradores. Basta
observar, por exemplo, o volume dos recursos destinados nos
orçamentos, municipais, estaduais e federais, para a educação. Na
maioria dos casos, é mínimo, ínfimo, irrisório, sempre abaixo,
inclusive, do que prevê a Constituição.
Para complicar, esse pouco é
pessimamente aplicado. Não produz os resultados que poderia e
deveria produzir. A construção de prédios, não raro
superfaturados, ganha absoluta precedência sobre o treinamento e
valorização dos professores e sobre a modernização de métodos e
instrumentos pedagógicos. O ensino no País é de má qualidade.
Para alguns, é de péssima. Destina-se, basicamente, a garantir ao
aluno mero diploma, que de pouco lhe vai valer.
Se a educação fosse, de
fato, como se apregoa, prioridade nacional, o setor deveria ser
aquele a contar com a maior soma de investimentos. Boas estratégias,
no entanto, acabam esvaziadas, anuladas, tornadas sem efeito, diante
de uma desastrada execução. É o caso específico do programa
"Bolsa-Escola", do governo federal. A ideia de conceder
ajuda de custo mensal às famílias que mantiverem os filhos na
escola é excelente e digna não somente de elogios mas de apoio.
O que não é lá muito
realista é a quantia paga. Não passa de ridículos e irrisórios
quinze reais mensais! Menos de 10% de um salário mínimo, que já é
tão baixo que até poderia se chamar de "salário ínfimo".
Ainda assim, a procura por essa ajuda é enorme. Isso dá bem a conta
do grau de miserabilidade da nossa população. Para Campinas, foram
destinadas 6.600 bolsas-escolas (numa cidade beirando a um milhão de
habitantes!). Candidataram-se ao auxílio quase sete vezes mais. Ou
seja, pelo menos 40 mil pessoas.
As inscritas foram 13 mil
famílias, com renda nesse baixíssimo patamar. Mas o limite do que
está disponível é de apenas a metade dessa cifra. Isso, numa
cidade como Campinas, tida e havida como privilegiada no que diz
respeito ao padrão de vida, considerado entre os melhores do País.
Ressalte-se que só podem se
habilitar ao benefício famílias cuja renda familiar não ultrapasse
os noventa reais por mês. Como se observa, o salário mínimo, com
toda a sua inadequação, acaba ainda sendo um rendimento "nababesco"
para quem ganha a metade, ou menos do que ele. E há milhões de
brasileiros, e milhares de campineiros nesta situação de penúria,
de verdadeira indigência,
Mas o programa "Bolsa-Escola"
do governo federal tem pelo menos o mérito de existir. Muitas outras
propostas mais ou menos parecidas foram apresentadas, até com
vantagens bem maiores e bem menos exigências do que este. No
entanto, salvo raras e honrosas exceções, e assim mesmo em âmbito
bastante restrito, nunca saíram do papel. Mostraram-se inviáveis,
não importa por quais razões e restringiram-se a mera letra morta,
nada mais do que retórica sociológica.
Espera-se que, ao invés de
pôr fim à iniciativa, pretextando que o valor pago aos
beneficiários é praticamente simbólico, o próximo governo, seja
ele qual for, aperfeiçoe essa medida, de muita relevância quanto ao
mérito, embora, por enquanto, de resultados pífios. Se as milhões
de famílias inscritas no programa mantiverem. de fato, os filhos na
escola, por um ano que seja, o País já terá lucrado muito, em
termos de investimento no futuro. Não se pode dizer que por enquanto
o "Bolsa-Escola" seja instrumento adequado de distribuição
de renda. Mas pode e deve melhorar também nesse aspecto, caso haja
vontade da parte do sucessor de Fernando Henrique Cardoso.
Se a educação é, de fato,
conforme se apregoa, prioridade nacional, e instrumento de redenção
do brasileiro, por que não se destinar um valor, na pior das
hipóteses, dez vezes maior para um empreendimento tão inteligente e
de tamanho alcance social? É preferível gastar fortunas para
socorrer bancos falidos? Parece que sim! Ou despejar rios de dinheiro
para erigir elefantes brancos, como o fórum trabalhista de São
Paulo? Ou despender fortunas para sustentar agiotas internacionais?
.
(Editorial
da Folha do Taquaral de 28 de agosto de 2001);
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