Sunday, September 16, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - O mínimo que é o máximo


O mínimo que é o máximo



Pedro J. Bondaczuk



O mês de março começa com más notícias, principalmente para aqueles "heróis da resistência", que vivem (ainda) de salários, têm carteira assinada (menos das metade dos trabalhadores brasileiros), e conseguem segurar, às custas de uma série de concessões (só no ano passado, o rendimento médio dos empregados caiu 5,5%, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) seus instáveis empregos. Desde o dia 1º., os combustíveis estão mais caros, o que faz supor uma nova onda de reajustes, que deve atingir desde o preço dos fretes, aos gêneros de primeira necessidade, passando, certamente, pelo transporte.

O pretexto para esse encarecimento, da gasolina e do óleo diesel, é a vertiginosa alta do custo do barril de petróleo no mercado internacional, a maior desde a Guerra do Golfo Pérsico, em 1991. Os produtores árabes restringiram o fornecimento, com vistas, exatamente, a essa valorização. Conseguiram o que queriam. Para complicar, o inverno no Hemisfério Norte, bastante rigoroso, forçou o aumento do consumo nos Estados Unidos e na Europa, principalmente do óleo para a calefação.

Contudo, como as cotações oscilam, tanto para cima, quanto para baixo, de acordo com a oferta e a procura, uma pergunta ingênua (pois já se conhece liminarmente a resposta), se impõe: haverá redução no preço dos combustíveis caso a Opep decida, na sua próxima reunião, elevar sua cota de produção e diminuir, por consequência, o custo do barril de petróleo? Claro que não! "O consumidor que se exploda!", é o que devem pensar as autoridades.

Outra notícia das piores é a constatação, por parte do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que a taxa de desemprego, nas principais metrópoles brasileiras, voltou a crescer, ficando no patamar de 7,6% da População Economicamente Ativa, em janeiro passado, após haver caído em dezembro, por conta, certamente, das contratações de trabalhadores temporários, como sempre acontece às vésperas das festas de fim de ano.

É nesse cenário, novamente tenso e difícil, que começam as discussões sobre o reajuste do salário mínimo, com antecedência de pelo menos dois meses, em relação ao que ocorreu em 1999. O tema só veio à baila agora, frise-se, por causa de uma tentativa de represália do PFL contra o governo, ao qual seus líderes acusam de participar, ou no mínimo de incentivar, as manobras do PSDB para aliciar parlamentares peefelistas e de outros partidos, além de se aliar ao PTB, para se tornar a maior bancada na Câmara de Deputados.

Desde então, o todo poderoso presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, vem levantando a bandeira da equiparação do mínimo ao equivalente a US$ 100 (hoje, R$ 177). O presidente Fernando Henrique Cardoso, em princípio, se opôs com veemência a essa proposta, classificando-a de "irresponsável e demagógica". Pretendia que o menor salário pago no País (que para a grande maioria dos brasileiros é, simultaneamente, piso e teto), fosse reajustado em irrisórios 7%, conforme previsão orçamentária (Orçamento este que, embora estejamos entrando no último mês do primeiro trimestre de 2000, ainda não foi sequer apreciado, quanto mais aprovado pelo Congresso).

Posteriormente, percebendo o quanto essa postura o tornava vulnerável, num momento em que sua popularidade começava a crescer, reconsiderou a questão. Agora já acena com um novo salário mínimo entre R$ 150 e R$ 160, dando a entender que essa cifra seria um ato de "extrema generosidade" do governo para com os trabalhadores. A governadora do Maranhão, Roseana Sarney, desafiou FHC e assegurou que no seu Estado, a partir de 1º. de maio, nenhum servidor receberia menos do que US$ 100 mensais.

O argumento, do Ministério da Fazenda, para vetar reajuste superior à menor taxa de inflação acumulada (a maior, que reajusta tarifas elétricas e telefônicas, foi de 20%), ou seja, de 7%., é o mesmo de sempre: o de evitar a "desestabilização do real". Eta moedinha frágil! Qualquer coisa ameaça a sua estabilidade! A principal desculpa, para manter o mínimo nesse patamar de fome, é a de que um aumento real provocaria um rombo imenso na Previdência Social e levaria centenas de prefeituras de pequenas cidades à falência. Será?

Não haveria nenhum outro setor no governo, com despesas supérfluas, passíveis de corte? Todos os ministérios e secretarias resistiriam a uma auditoria minimamente honesta? Os prefeitos desses mesmos municípios, que se dizem incapazes de pagar um piso um pouco mais decente, trabalham de graça? Claro que não! A maioria ganha o equivalente, muitas vezes, à totalidade da folha de pagamentos do funcionalismo municipal. E ninguém fala nada! O fato é que nem mesmo os países mais pobres e desorganizados da América Latina, África e Ásia, têm uma remuneração mínima tão iníqua e perversa quanto a brasileira. Se eles conseguem pagar o equivalente a US$ 140 (como é o caso do Paraguai) ou até mais, por que o Brasil não conseguiria?


(Editorial da Folha do Taquaral de 15 de março de 2000).


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