Indecisão sobre a poupança
Pedro J. Bondaczuk
Segundo o presidente do Banco
Central, Ibrahim Éris, o governo está preocupado com as retiradas
no sistema da poupança. Em apenas dois meses de funcionamento do
Plano Collor, cerca de Cr$ 200 bilhões, como se diz em linguagem
popular, "criaram asas". De fato, tivesse o Congresso
Nacional elevado o limite de saques acima da casa dos Cr$ 50 mil,
certamente, o esvaziamento alcançaria proporções dramáticas para
o sistema. Evidentemente, essa respeitável parcela serviu em parte
para aquecer o meio circulante no País, a ponto das autoridades
ficarem duvidando da eficácia do processo de enxugamento de liquidez
adotado no mercado financeiro.
Não há dúvida alguma de que
o dinheiro retirado, apenas em alguns casos isolados, passou a ser
guardado em cofres ou sob o colchão. Levando em conta o fato de ter
o brasileiro acentuado espírito consumista, como chegou a reconhecer
certa feita o então ministro da Indústria e Comércio, Camilo
Penna, passados os primeiros dias da aplicação do plano, uma vez
assentada a poeira, apreciável volume desse dinheiro retirado serviu
mesmo para ativar o consumo. Aproveitando também todo esse quadro
circunstancial, em meio a inúmeras fórmulas criativas, o comércio
andou por bem em vender os produtos oferecidos ao público através
da modalidade de prestações suaves, atraindo assim uma boa faixa de
poupadores.
Não bastasse essa espécie de
rombo no sistema, o pior de tudo é que o governo não se mostrou
interessado em criar incentivos à poupança. Aliás, o próprio
Ibrahim Éris disse há pouco não existir o propósito de se alterar
o rendimento das cadernetas. A impressão é que não surgirá a
curto prazo qualquer mecanismo capaz de reverter o quadro que aí
está, sem atrativos aos aplicadores. Assim, foi bem explícita a
resposta de uma professora aposentada, ao retirar na Caixa Econômica
de São Paulo as suas pequenas economias: "Não adianta deixar
na poupança o dinheiro, pois ele não rende nada e ainda corremos o
risco de perdê-lo".
Portanto, terá o governo,
daqui para a frente, de executar um trabalho paciente e demorado,
objetivando restabelecer o crédito quanto à poupança. O abalo
provocado pelas implicações do Plano Collor atingiu em cheio o
sistema. Consequentemente, a procura à modalidade não se dará em
decorrência apenas de uma propaganda bem conduzida. Há necessidade,
acima de tudo, do estabelecimento de fórmulas atraentes. Deixando de
lado a natureza íntima de determinadas pessoas, de gastar muito mais
do que efetivamente ganham, há que se reconhecer também a
existência de apreciável contingente de cidadãos com o hábito de
poupar. E tanto isso é verdade que o sistema cresceu e ganhou lugar
de destaque em nosso País. De lamentar-se, pois, estejam os técnicos
do Ministério da Economia indecisos quanto aos rumos futuros da
poupança. Ironicamente, quem mais perde com esse comportamento, no
final das contas, é mesmo o próprio governo.
(Editorial publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 18 de maio de 1990)
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