O tédio e seus riscos
Pedro
J. Bondaczuk
O leitor, sim, você
mesmo, que me acompanha com assiduidade, já sentiu tédio? Provavelmente, sim.
Só espero que tenha sido passageiro e ocasional e que nunca tenha sido causado
pela leitura dos meus textos. Esforço-me para fugir do lugar comum, nos temas que
abordo, embora meu estilo não varie e pareça. A alguns, monótono. Não é!
Afinal, se variasse, não seria estilo. Bem, serei mais específico a propósito
dessa sensação (ou emoção, não sei) que afeta tanta gente, em tantos lugares,
pelos mais variados motivos. Para tanto, recorrerei, mais uma vez (o que sempre
faço quando preciso ser didático) à enciclopédia eletrônica Wikipédia. Ela
descreve esse sentimento como uma sensação “de falta de estímulo” decorrente de
“ação ou estado repetitivo”. Ou seja, de uma espécie de enjôo com a rotina.
Wikipédia exemplifica
algumas dessas manifestações como uma percepção de “falta de coisas
interessantes para fazer, ouvir, sentir etc.” Acrescenta que “as pessoas
afetadas por tédio em caráter temporário consideram esse estado muitas vezes...
como perda de tempo”. Ora se é! Pergunto, é possível alguém sentir-se entediado
nesta época com tantos recursos para se comunicar e se entreter (como a
internet, por exemplo, e nela as redes sociais)? Bem, a possibilidade existe. E
há uma infinidade de pessoas entediadas por aí. Mas, convenhamos, todo esse
pessoal é dotado de uma falta de imaginação de espantar.
Wikipédia ainda observa
que “alguns acham que ter sobra de tempo também causa tédio”. Quase caí da
cadeira ao ler isso. Essas pessoas deveriam sentir-se privilegiadas por isso,
no entanto... sentem-se entediadas. Que tal me darem um pouco desse tempo que
lhes sobra, que tanto lhes aborrece, e que para mim sempre falta?! Bem que eu
aceitaria a troca. “Para as pessoas entediadas, o tempo parece passar mais
lentamente do que quando estão entretidas”. Quem me dera se isso ocorresse
comigo! Se os ponteiros dos relógios fossem só um pouquinho mais preguiçosos do
que são, me permitindo (generosamente) realizar mais, mais e mais, muito mais
coisas, em um único dia, do que consigo! Tenho que concordar com o dito popular
que acentua que, às vezes, “tem asas quem não sabe voar”. Exemplo? Ora, a
galinha!
Mas o que o tédio tem a
ver com literatura, razão de ser deste espaço? Tem muito. Caso leiamos com a
devida atenção, sobretudo os clássicos, toparemos, amiúde, com personagens
entediados, sem ânimo para nada, como, por exemplo, em alguns romances de Eça
de Queiroz, ou de Gustave Flaubert ou, até mesmo, em nosso Machado de Assis.
Geralmente, são os que cometem as maiores besteiras, por não terem o que fazer
(ou acharem que não). E não é somente isso. Muitos escritores trataram
especificamente desse tema, uns compreendendo esse sentimento e até
defendendo-o e outros tantos condenando-o (como eu faço). Duvidam?
Cito, por exemplo, o
poeta espanhol, Miguel Unamuno, que escreveu: “Quase todos os homens vivem,
inconscientemente, no tédio. O tédio é o fundo da vida. Foi o tédio que
inventou os jogos, as distrações, os romances e o amor”. Observo, para que não
pairem dúvidas, que o fato de eu citar determinado autor não significa que
concorde com o que ele escreveu. Neste caso, discordo, pelo menos em parte, da
opinião. Respeito quem concorde com ela. Mas...
Se discordei de Unamuno
(um dos meus poetas preferidos), faço-o com maior ênfase ainda em relação ao
que escreveu o poeta e ensaísta italiano do século XVIII, Conde Giácomo
Leopardi. Ele considerou esse estado de espírito como “sublime” e, portanto,
desejável. Tem gente que gosta mesmo de sofrer. Creio que este era um caso.
Enfim... Leopardi escreveu: “O tédio é, de certo modo, o mais sublime dos
sentimentos humanos. O não poder ser satisfeito por nenhuma coisa terrena, nem,
por assim dizer, pela Terra inteira. Por isso, o tédio é pouco conhecido dos homens
sem importância, e pouquíssimo ou nada dos outros animais”. Bah!
Tal declaração soa-me
arrogante e preconceituosa. Pudera! Sua condição, de membro da nobreza,
certamente fez com que se julgasse (e aos seus pares) superior às outras
pessoas, avaliando-as não pelo que eram, mas pela classe a que pertenciam. O
tédio, que tanto elogia, é, para mim, falta do que fazer. Ora, ora, ora. Claro
que nem todos escritores, contemporâneos do conde italiano, pensavam como ele.
Pelo menos o historiador e ensaísta escocês Thomas Carlyle não pensava. Assim
ele se expressou a propósito: “O tédio é a doença dos corações sem sentimentos
e das almas pobres”. E a pobreza a que se referiu, óbvio, não é a material, mas
a pior de todas: a espiritual.
Poderia citar, ainda,
dezenas de escritores, com suas respectivas opiniões, mas não o farei. Por que?
Para não entediá-lo, prezado leitor, e assim conservá-lo como fiel seguidor
(espero). Só alerto para o fato de que o tédio – não o ocasional e passageiro,
mas o frequente e demorado – deve servir de sinal alerta a quem o sofre dessa
maneira. Especialistas garantem que se trata de um dos primeiros sintomas de
depressão. E esta é uma doença que causa muitos sofrimentos e é complicada de
curar. Além disso, o tédio tende a ter efeitos psicossomáticos, causando dores
no corpo e falta de ereção (nos homens, claro). Ou seja, em português claro e
desbocado das ruas: pode fazer o entediado brochar. Livre-se, pois, rapidinho
desse sentimento. Vá procurar algo de bom para fazer, ora, ora.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk..
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