Mercúrio
versus Amazônia
Pedro J. Bondaczuk
A Amazônia tem freqüentado, com uma certa
insistência, o noticiário dos grandes órgãos de comunicação mundiais não por
sua beleza, citada apenas de passagem, ou pela pobreza de sua gente aqui e ali
insinuadas, ou pela sua importância como reserva natural.
O que se levanta, amiúde, é o risco da floresta
desaparecer em virtude da ação criminosa de determinados grupos e pessoas,
certamente com a conivência de muitas autoridades, já que é impossível se
verificar uma devastação do porte da que vem ocorrendo sem que seja percebida.
Até porque, periodicamente, a imprensa levanta o problema, apresenta denúncias,
faz reportagens, divulga o que ocorre.
Não faz muito o "Globo Repórter", da Rede
Globo, mostrou o crime ecológico que se pratica quotidianamente na Amazônia. É
impossível que nenhum responsável de evitar que isso ocorra não tenha,
portanto, tomado conhecimento dos fatos.
Há os que ainda consideram os alertas emitidos como
exagerados, mal-intencionados, e os nacionalistas afoitos, que não sabem para
onde direcionar seu fervor cívico (ou cínico?) chegam a dizer que existe um
movimento internacional para nos tirar a Amazônia. Pura bobagem, fruto, em
geral, da ignorância.
Porém, os bem-informados sabem que o risco ecológico
é real e até de dimensões muito maiores do que as apontadas. Quando a questão é
levantada, fala-se somente da derrubada da floresta. Esse, afinal, é o lado
mais visível da devastação. Não há dúvida que é algo a ser ressaltado e,
sobretudo, combatido.
Todavia, é preciso que se ressalte o perigo
representado pela poluição de muitos rios amazônicos com o mercúrio, usado por
cerca de 20 mil garimpeiros ilegais que atuam na Amazônia na depuração do ouro
que extraem. Isso, em geral, tem sido omitido, aqui e no Exterior.
Há uma grande ironia nisso tudo. Veja o leitor: o
Brasil é o segundo produtor mundial do metal precioso, abaixo tão somente da
África do Sul. No entanto, nas estatísticas internacionais, ocupa um
inexpressivo décimo lugar ou coisa parecida, bem atrás dos Estados Unidos e
Austrália, onde a atividade de extração é menor.
O que ocorre com o nosso minério? É quase todo
contrabandeado! Portanto, o País não lucra quase nada com a sua extração e, de
quebra, arca com o ônus da poluição com o mercúrio, altamente tóxico. O
interessante é que o Uruguai não possui uma única mina em seu território e, no
entanto, posa como grande produtor de ouro, com mais de 30 toneladas anuais.
Mas é necessário que a questão não fique somente no
terreno das denúncias e nem no das promessas dos políticos por uma providência.
No dia em que ocorrer uma intoxicação em massa na região, como ocorreu na
cidade japonesa de Minamata, talvez, então, se tente fazer alguma coisa.
É sempre assim. Espera-se, primeiro, que a porta
seja arrombada, para somente depois do fato consumado se pensar em pôr tranca
nela.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 17 de outubro de 1990).
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