Justo
reconhecimento a um pacifista
Pedro J. Bondaczuk
O Prêmio Nobel da Paz foi atribuído, com rara
justiça, neste ano, a um pacifista negro, ferrenho opositor do apartheid na
África do Sul, mas que tem, como linha de ação, princípios semelhantes aos adotados
pelo Mahatma Gandhi, na Índia: bispo Desmond Tutu. Ou seja, a resistência
civil.
Há 20 anos, desde quando, em 1964, o reverendo
norte-americano Martin Luther King conquistou essa honraria, nenhum seguidor
dessa forma de luta contra a discriminação de raças, havia conseguido essa
façanha.
Dos Prêmios Nobel, o mais controvertido, sem dúvida
alguma, é o da Paz. Tanto que é o único a ser atribuído por uma entidade
política, o Parlamento da Noruega. Traz, inclusive no nome, uma grande
contradição. E explico porque. Alfred Bernard Nobel, cujos rendimentos das
aplicações de sua fortuna deixados em testamento para serem distribuídos às
pessoas que se distingam em diversos campos de atuação em favor do homem, não
pode ser chamado, rigorosamente, de um pacifista.
Afinal, foi ele o inventor da dinamite, que
modificou os conceitos da guerra, tornando esse exercício da insensatez muito
mais destrutivo do que antes da sua descoberta. Credita-se a esse sueco,
também, a invenção da gelatina explosiva, com farto uso bélico até algum tempo
atrás.
Raramente o Prêmio Nobel da Paz tem agradado a
gregos e troianos. Muitos críticos, por exemplo, consideram uma heresia a sua
concessão a Henry Kissinger e a Lê Duc Tho, em 1973, e a Anawar Sadat e
Menechen Begin, em 1978, a despeito do sucesso de suas respectivas negociações,
que redundaram no fim na guerra do Vietnã e na pacificação de egípcios e
israelenses.
As críticas, todavia, não são tanto quanto aos
prêmios concedidos, mas em relação aos omitidos. Não se concebe que um Mahatma
Gandhi não tenha sido sequer lembrado, no ano de 1947. Em 1948, quando o Nobel
da Paz não foi dado a ninguém, já seria tarde demais atribuí-lo a esse grande
líder, pois o pai da nação indiana foi assassinado, exatamente em virtude dos
princípios que sempre defendeu, logo no início desse ano, no dia 30 de janeiro.
E há muitos outros esquecidos célebres, que até dispensam menção, de tão
óbvios.
Se no ano passado o Parlamento norueguês já havia
agido certo, premiando o valente e obstinado líder sindical polonês, Lech
Walesa, no corrente fez prevalecer a coerência e reconheceu, não apenas a
justiça da causa defendida pelo bispo anglicano sul-africano Desmond Tutu, mas,
principalmente, dos seus métodos, compatíveis, em todos os momentos, com a sua
pregação. Este era o Nobel mais aguardado do ano e seu ganhador, convenhamos,
não poderia ter sido melhor selecionado do que foi.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do
Correio Popular, em 17 de outubro de 1984)
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