A falácia da negociação
Pedro J.
Bondaczuk
O papel do Estado moderno, numa
sociedade bem organizada e verdadeiramente democrática, é o de atuar em setores
específicos que, ou pela sua relevância, ou por envolverem a segurança
nacional, são de sua exclusiva competência.
Um deles, certamente o mais
importante, é o da educação. Constitucionalmente, inclusive, cabe ao Poder
Público prover o acesso à instrução à totalidade dos cidadãos. No Brasil, no
entanto, isto além de nunca ter sido feito de maneira integral, parece ser um
sonho ainda muito distante para a maioria.
O ensino oficial – e não por
culpa dos educadores, mal pagos e pessimamente aparelhados – é um verdadeiro
desastre, em termos de aproveitamento, em boa parte do País. Não se pode
apontar o caso de uma escola aqui, de outra ali, em geral instaladas em
metrópoles. É indispensável que se avalie a qualidade em seu todo. E esta,
convenhamos, é de ruim para sofrível.
Dessa maneira, os pais que
entendem ser a educação a maior herança (e às vezes a única) que podem deixar
para os filhos, não medem sacrifícios. Dispõem-se a pagar, mesmo que não tenham
recursos, uma escola particular.
A sucessão de crises econômicas,
todavia, que fez com que o poder de compra dos salários sofresse uma erosão de
no mínimo 35% em relação a 1980, torna cada vez mais esse empenho em dotar as
crianças de um ensino um pouco mais substancial mais distante. Agora, um grupo
de escolas particulares do Rio Grande do Sul está propondo ao ministro da
Educação, Carlos Chiarelli, que as mensalidades escolares sejam definidas pelo
sistema de livre negociação entre as partes.
Mas há condições, nas
circunstâncias atuais, para que isso se verifique? Que poder de barganha um
pai, que tem quatro filhos estudando simultaneamente em instituições privadas,
possui para evitar que se cobre dele aquilo que ele não pode pagar?
Como compatibilizar seu reajuste
salarial, cada vez mais difícil, com os da prestação mensal da escola? E se num
determinado mês seus ganhos forem inferiores às suas próprias necessidades
básicas, como em geral, aliás, vem ocorrendo? Como fazer para arcar com
mensalidades maiores?
Não é preciso ser nenhum gênio
para prever qual a opção que lhe será colocada. “O valor é muito alto? Você não
tem condições de pagar? A saída é simples: coloque seu filho numa escola do
Estado”. Onde, pois, a tal “liberdade” de negociação? Ela existiria caso as
duas partes pudessem estar em igualdade de condições. Mas podem?
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 18 de julho
de 1990).
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