Decisão sobretudo coerente
A decisão do Irã, de aceitar, incondicionalmente, a
Resolução 598 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que pede o imediato
cessar-fogo em sua guerra com o Iraque, pode ter sido surpreendente (como de
fato foi), mas não fugiu a uma certa linha de coerência sempre demonstrada por
Teerã.
Enquanto a República Islâmica
achava que podia vencer o conflito pelas armas, se manteve irredutível em suas
posições. Afinal, o governo de qualquer país, cujas tropas estivessem ocupando
parcelas consideráveis de território inimigo, agiria assim.
No entanto, uma sucessão de
reveses militares, ocorridos desde abril passado, com a expulsão persa da
Península de Faw e, mais recentemente, de áreas ao redor de Basra e da zona
montanhosa habitada pelos curdos, mostrou-lhes que, militarmente, o máximo que
suas Forças Armadas poderiam fazer era conservar esta espécie de “gangorra”,
que vem caracterizando a conflagração desde o seu início.
Ou seja, Iraque e Irã vêm
sucedendo-se na ocupação, e posterior expulsão, de terras adversárias. O número
de mortos cresce assustadoramente, as despesas com novos armamentos tornam-se
cada vez mais proibitivas, esvaziando os respectivos tesouros, e as economias
dos dois ameaçam entrar em colapso.
A impressão que dá ao crítico é a
de que a decisão iraniana partiu do seu presidente, Ali Khamenei, que a
despeito da retórica belicista que também empregou com freqüência em seus
pronunciamentos públicos (em especial contra os norte-americanos, como por exemplo
em seu discurso nas Nações Unidas, no ano passado), deu várias indicações de se
tratar de um moderado.
Aliás, após a derrubada do Airbus
A-300 da Iran Air, no início deste mês, num comentário feito neste mesmo
espaço, destacamos que o grande problema iraniano sempre foi aquilo que os seus
líderes “disseram” e nem tanto o que “fizeram”.
O momento para a aceitação de um
cessar-fogo não poderia ser mais oportuno. Tudo leva a crer que o chefe
espiritual da nação, o aiatolá Ruhollah Khomeini, esteja, de fato, morrendo.
Por incrível que possa parecer (aos mal-informados, evidentemente), é mais
fácil negociar a paz com esse dirigente vivo do que com ele morto. Por isso, o
presidente Khamenei deve ter tomado essa surpreendente atitude, realista,
sensata e ponderada.
Afinal, prosseguir num conflito que ninguém tem condições
de vencer é mero suicídio coletivo. A morte iminente do imã (que é como os
islâmicos denominam seus mestres, juízes dos juízes) xiita está marcando um
momento de profunda reflexão para os persas acerca do seu futuro. E com a
guerra, ele estaria, somente, cheio de incertezas, de cadáveres e de
destruição.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 19
de julho de 1988).
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