Feixe de influências
Pedro
J. Bondaczuk
O ser humano (portanto
eu, você, a minha mulher, a sua, seu marido caso você seja de sexo feminino,
meu vizinho, seu vizinho, aquela pessoa com que cruzamos casualmente na rua, no
ônibus, no trem ou no metrô etc.etc.etc.) é um animal gregário. Nosso instinto
de sobrevivência nos leva, automaticamente, a nos vincularmos a vários grupos
desde nosso nascimento – família, colegas de escola e de trabalho, clubes
sociais ou de futebol e vai por aí afora – vínculos estes nem sempre
dependentes da nossa vontade. A maioria, aliás, ocorre casualmente, ao sabor
das circunstâncias.
Estabelecemos com o
próximo toda a sorte de relacionamentos, alguns profundos e duradouros, outros
ocasionais e passageiros. E estes determinam, ao fim e ao cabo, o que somos e o
que seremos. Esses contatos nem precisam ser pessoais ou até com
contemporâneos. Exemplo? Grande parte do que sou e do que penso foi
influenciada por escritores a cujos livros tive acesso, a maioria morta muito
antes de eu nascer e a quase totalidade sem que eu tivesse a mais remota
possibilidade de qualquer contato pessoal, mesmo que fortuito. No entanto...
Li, tempos atrás, a
esse propósito, em uma crônica publicada no Suplemento Literário de O Estado de
São Paulo (se não me falha a memória, datada de 1961), a seguinte observação do
escritor Mário da silva Brito, que anotei e até já escrevi um ensaio a
respeito: "Nunca fui eu só, ou só eu. Mas todos os outros. Os
antepassados, os que me rodeiam, os que pertencem ao meu tempo. Os que amo e
até os desconhecidos. Estou feito de pedaços. Sou uma soma de múltiplas
parcelas humanas. Consigo somar até quantidades heterogêneas".
Convenhamos, todos somos assim.
Nosso próximo tende a
nos enriquecer ou a nos corromper, a ampliar nossos horizontes ou a reduzi-los
ao mínimo e a estimular em nós o espírito de competição, sem o qual, desde que
sadio, ninguém se sente motivado para qualquer realização (mesmo quando se opõe
a nós). Ou há alguma impropriedade nesse raciocínio? Não o creio. O filósofo,
pedagogo e escritor norte-americano John Dewey (1859-1952) constatou, em um de
seus textos, que "os homens vivem em comunidade em virtude das coisas que
têm em comum; e a comunicação é o meio por que chegam a possuir coisas em comum".
Só que, se comunicar, é
via de duas mãos. Ou seja, é contínuo dar e receber de informações e de
influências (boas ou más). E é isto o que está faltando nos dias de hoje,
tornando as pessoas tão solitárias, arredias e carentes. Fechamo-nos, muitas
vezes, para o mundo, julgando-nos auto-suficientes. Reitero: ninguém o é, Todos
precisam de todos e o tempo todo. Daí haver a vida em comunidade, fator
essencial da sobrevivência da espécie e da evolução mental, espiritual e até
física do ser humano (mas da sua involução, degradação e até riscos de extinção
também, dependendo do grupo em que as circunstâncias hajam determinado a que
fôssemos inseridos).
Nenhum homem é, e nem
pode ser, uma ilha. Somos, todos, sem exceção, partes de imenso continente: a
humanidade. Temos que partilhar idéias, emoções, sentimentos e intenções,
mediante contínua e eficaz comunicação, em ininterrupto processo de dar e
receber. Todavia, temos que nos precaver contra influências nefastas, hábitos
perniciosos, exemplos nefastos e comportamentos destrutivos. Afinal, não
recebemos, apenas, influências boas. Cabe-nos discernir o que deve e o que não
deve ser incorporado à nossa personalidade.
Ninguém tem a
capacidade de ler pensamentos. Se não os comunicarmos clara e eficazmente ao
próximo, este jamais saberá o que queremos ou o que necessitamos. O isolamento,
portanto, além de antinatural, é, muitas vezes, destrutivo e pernicioso, tanto
no plano individual, quanto no coletivo. Assim como o relacionamento
descuidado, claro. A escritora norte-americana Shakti Gawain (cujo nome de
batismo é Carol Louise Gawain), observou a propósito: “As pessoas com as quais
nos relacionamos são sempre um espelho refletindo nossas próprias crenças, e
simultaneamente nós somos espelhos refletindo as delas. Assim o relacionamento
é uma das mais poderosas ferramentas para o desenvolvimento – se olharmos
honestamente para nossos relacionamentos, nós conseguiremos ver muito sobre
como nós os criamos”. Em suma: somos um feixe de influências, para o bem ou
para o mal.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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