Índia revela estadista
Pedro J. Bondaczuk
O novo primeiro-ministro
indiano, Rajiv Gandhi, embora nunca tenha escondido de ninguém que jamais
apreciou a política, demonstrou muita competência e frieza nos doze primeiros e
difíceis dias de seu mandato. Ele assumiu o cargo sob um impacto emocional
suficiente para derrubar qualquer pessoa com menor dose de autocontrole, ou
seja, no mesmo dia em que sua própria mãe foi vítima de um estúpido atentado,
que suprimiu à Índia não apenas a sua grande líder, mas a própria convivência
pacífica entre suas várias etnias e religiões.
Embora
impotente para evitar que cerca de 1.200 “sikhs” fossem massacrados pela
vingança dos hinduístas nos quatro dias subseqüentes ao assassinato de Indira
Gandhi (e qualquer um seria, em idênticas circunstâncias), soube assumir as
rédeas dos acontecimentos.
Colocou
as bem treinadas tropas indianas nas ruas, e em prazo muito mais curto do que
os observadores políticos poderiam imaginar (principalmente em se tratando do
segundo país mais populoso do mundo), restabeleceu, com mão de ferro, a ordem
pública interna.
Contidos
os motins, ao invés de adotar uma atitude vingativa e rancorosa contra os
matadores da mãe, preocupou-se, antes de tudo, em fazer justiça e indenizar a
comunidade “sikh” pelas mortes e prejuízos sofridos. E em punir os policiais
relapsos, que levados pelas emoções, permitiram a ocorrência dos fatos
lamentáveis, que o mundo todo teve a oportunidade de conhecer pelo noticiário,
e que poderiam deslustrar a imagem da Índia no Exterior.
Rajiv,
como todo ser humano, também chorou a morte de Indira. E, estejam certos, muito
mais do que qualquer indiano e por motivos óbvios. Afinal, além de sua líder
política, ela era, acima de tudo, sua mãe. Era aquela figura protetora que o
gerou e o criou e por quem jamais escondeu ter um profundo orgulho.
Mas
deu uma lição magnífica aos radicais e a tantos quantos, no mundo todo, colocam
interesses pessoais, e às vezes mesquinhos, acima do bem estar dos povos que
lideram. Embora preparado à última hora para a política (era ex-piloto de
aviação civil), Rajiv teve a oportunidade de conhecer seu imenso país de ponta
a ponta. Pôde inteirar-se de seus conflitos e suas necessidades.
Durante
a campanha política de dois anos atrás, quando foi eleito para o Parlamento,
voltou a ter contato íntimo com seu povo. Auscultou seus sentimentos, sentiu
suas carências, anotou suas reivindicações. E, no primeiro teste, provavelmente
o decisivo de sua vida, passou com louvor. Soube entender os indianos e liderá-los.
O
resultado de tudo isso é que o clã dos Nehrus, de tanta importância histórica
para a independência e coesão da Índia, dá mais uma contribuição ao país. E
Indira, além de exercer no poder uma política firme e voltada para o
desenvolvimento nacional, mostrou, mais do que nunca, saber das necessidades do
seu povo. Muito mais do que estabilidade, do que um saneamento econômico ou
consagradoras vitórias militares, a ex-primeira-ministra indiana deixou para o
país algo bem mais valioso. Outorgou-lhe um autêntico estadista, na figura de
seu jovem filho Rajiv Gandhi.
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 13 de novembro de
1984)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk.
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