Sunday, September 28, 2014

Guerra econômica no Líbano


Pedro J. Bondaczuk


A retirada das tropas israelenses do Líbano vem se desenvolvendo num ritmo acelerado, tendo sido iniciada ontem a segunda etapa do seu cronograma, que prevê a volta para casa de dez mil soldados de Israel, no máximo até junho. Apesar de alguns confrontos e atitudes hostis de parte a parte, no geral o processo se realiza de uma maneira até menos traumática do que muitos observadores temiam que ocorresse.

Entretanto, o Líbano que os israelenses estão deixando, quase três anos após o desfecho da operação “Paz para a Galiléia”, que visava a escorraçar para longe das fronteiras de Israel diversos grupos de palestinos que alvejavam seguidamente povoações judias de território libanês) é um país destroçado. Destroçado e falido, muito diferente daquele que as tropas encontraram quando da invasão.

O problema atual do Líbano já nem é mais tanto a guerra civil, que caminha para completar uma década, com a qual o povo aprendeu a conviver. É a recessão econômica, o visível empobrecimento nacional, com a outrora fortíssima e cobiçada libra libanesa batendo sucessivos (e quase diários) recordes de desvalorização.

O conflito interno, no seu início, trouxe até mesmo alguns lucros para esse país, situação que perdurou até 1982. Estes eram provenientes das seguidas “injeções” de dólares dos países árabes, que visavam a financiar as facções litigantes que apoiavam com crescentes recursos, mormente os guerrilheiros palestinos.

Era o que o atual ministro Selim Hoss, um especialista em economia, com muita lucidez, classificou de “turismo em uniforme”, representado por soldados sírios e de outras nacionalidades, que íam para o Líbano munidos de recursos para uma vida decente num país estrangeiro.

O ex-ministro das Finanças daquele tempo, Elias Saba, testemunha que “a renda individual de então atingiu seu máximo e que as divisas vindas de fora mais do que compensaram qualquer baixa do PNB que houvesse sido causada pela guerra”. Diante disso, pode-se dizer que, no período, o conflito até que compensou (do ponto de vista financeiro) para os libaneses.

Entretanto, a operação “Paz para a Galiléia” praticamente acabou com isso. Expulsou os palestinos, destinatários do maior volume de ajuda dos árabes e que mais gastavam esse dinheiro no mercado do Líbano. Os sírios restringiram a sua atuação ao Vale do Bekkaa e à proximidade da sua própria fronteira, fazendo circular menos divisas, principalmente numa Beirute arrasada, sitiada e sob constante bombardeio.

Hoje a situação da ex “Suíça do Oriente Médio” é para lá de desesperadora. As reservas de moeda estrangeira caíram abruptamente, nos últimos dois anos, de US$ 2,7 bilhões para menos de US$ 400 milhões. Isso, para um país que importa 70% do que consome, é arrasador!

A inflação e o desemprego subiram à estratosfera. Apenas no mês de janeiro, as taxas inflacionárias alcançaram 35% e com tendências de crescimento muito mais acentuado.

É indispensável que se faça, com urgência, um esforço internacional para socorrer o Líbano. Caso contrário, a advertência feita na semana passada por Ghassan Seblani, líder da milícia xiita Amal, será concretizada em questão de dias ou, quando muito, semanas. Ele disse, fundamentado não apenas naquilo que vê, mas no que sente na própria carne: “Se a crise continuar fora de controle como está, levará a um extremismo que acabará conosco antes dela. Será a destruição do Líbano que conhecemos hoje”. E, ressalte-se, a sociedade libanesa atual está a milhões de anos-luz de distância da ideal...

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 7 de março de 1985).


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