Brincar
de terrorismo
Pedro J. Bondaczuk
O seqüestro de
avião, ocorrido anteontem, no trajeto entre Amsterdam e Milão, mostra como as
autoridades aeronáuticas e aeroportuárias ainda estão despreparadas para
enfrentar situações de grande tensão. Um garoto levado, de 15 anos de idade,
colocou em polvorosa, durante mais de quatro horas, as autoridades italianas. E
tudo (graças a Deus) não passou de uma brincadeira de criança. Restringiu-se a
uma imensa piada que reflete, com exatidão, o estado do mundo na atualidade.
Mostra quais são as fantasias que passam pela cabeça
dos adolescentes que, bombardeados por mensagens cotidianas de violência,
iludidos por filmes de quinta categoria endeusando um mito de heroísmo
(representado muito bem pelo personagem Rambo), querem ficar adultos antes do
tempo. Não para assumir suas responsabilidades como tal, mas, infelizmente,
para repetir as mesmas mazelas que não se cansam de observar nos mais velhos.
No caso do garoto Adagliso Scioni, de somente quinze
anos (quatro a menos que outro adolescente infrator que ficou famoso neste ano,
o alemão ocidental Mathias Rust), nos vêm à mente inúmeras questões práticas.
Como, por exemplo: quem foi o adulto que se responsabilizou pelo seu embarque? Ele não pediu para ninguém
da empresa ficar tomando conta do rapaz? E a tripulação, como pôde entrar em
pânico diante da fantasiosa mentira do jovem, que assustou, convenhamos, à
própria e experiente polícia antiterror italiana?
O risco é que o caso venha a ser explorado, no
futuro, por terroristas de verdade, que puderam perceber, desgraçadamente, que
não é tão difícil como se pensa organizar e executar um seqüestro.
E extremistas malucos, ávidos por publicidade para
suas utópicas causas, não faltam. Aliás, até abundam. De que adianta os políticos
fazerem reuniões de alto nível para debater a questão? De que vale a
mobilização de técnicos, de serviços secretos, de armamentos
ultra-sofisticados? Qual o resultado de tanto treinamento por parte de grupos
antiterror se um garoto imberbe, que ainda nem engrossou a voz, munido de um
simples relógio digital, conseguiu fazer que tanta gente entrasse em pânico?
Como pode um menino agitar todo um país?
Adagliso demonstrou, com sua brincadeira de péssimo gosto,
que nenhum dos tantos e tão apregoados sistemas de proteção ao vôo funciona. É
verdade que o seqüestro de anteontem, conforme o classificou o chefe do
Departamento Antiterror do Ministério do Interior italiano, Umberto Improta,
foi uma brincadeira infantil. Mas foi tanto do seqüestrador, quanto dos
seqüestrados e dos que são pagos para impedir “piadas” de tão péssimo gosto.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do
Correio Popular, em 25 de dezembro de 1987)
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