No tempo das tangerinas
Pedro
J. Bondaczuk
A venda de livros no
Brasil é muito aquém do potencial de mercado que há por aqui. Afinal na
Argentina, com população cinco vezes menor que a nossa, o mercado editorial é o
triplo, ou mais, do nosso. Isso acontece
por uma série de razões, que não cabe, aqui, discussão (que, aliás, até já
fizemos tempos atrás). O brasileiro, em sua maioria, não gosta de ler. Ou assim
parece. Ou não pode entregar-se a este prazer, pelos mais diversos motivos. Ou
não adquiriu esse saudabilíssimo hábito desde criança, com o qual apenas teria
a lucrar. Além do que, o livro é relativamente caro para os padrões de renda da
maioria da nossa população. Enfim, a vida do escritor, por aqui, não é nada
fácil. São raríssimos os que têm condições de se manter somente com literatura.
As tiragens de cada edição são baixas, se comparadas com as de outros países.
Ainda assim... As vendas são muito lentas. Raros livros têm uma segunda edição
e, quando têm, levam “uma eternidade”, anos para ser toda vendida (isso, quando
é).
Por tudo isso, rendo
sincera homenagem à escritora e historiadora catarinense, Urda Alice Klueger,
cujos textos leio e edito, aqui neste espaço, há cerca de cinco anos. Posso
atestar, sem margem para engano, que são de primeiríssima qualidade literária.
Mais do que minha apreciação (e dos leitores que nos honram com sua fiel
companhia) é sua performance no cenário regional e nacional das letras que é
admirável. Enquanto a maior parte dos escritores tem imensas dificuldades de
esgotar uma única edição, Urda tem diversos livros com várias edições, que se
esgotam em tempo relativamente curto, levando em conta nossa realidade; Este é
um atestado inquestionável de qualidade do que ela escreve. Ninguém compra
tanto livro, ainda mais em um país não muito afeito à leitura, caso o que
esteja adquirindo não seja útil e atrativo, em suma, bom.
Analisarei, com mais
vagar, nos próximos dias, a produção literária dessa escritora, de 62 anos de
idade (desculpe a indelicadeza de mencionar este fato), natural de Blumenau,
membro da Academia Catarinense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico
de Santa Catarina, da União Brasileira de Escritores e da Associação de
Jornalistas e Escritoras do Brasil. Afinal, sua obra literária ascende a, pelo
menos, quinze livros publicados (podem ser até mais, não tenho certeza). Pelo
menos cinco deles tiveram mais de uma edição. Isso chama-se sucesso. E este
decorre de qualidade (que, reitero, posso atestar, por conhecer boa parte da
sua intensa produção).
Hoje ressalto,
particularmente, um evento, que já divulguei em uma nota, mas que, por sua
relevância, merece destaque pouco maior. Ele vai acontecer em 27 de setembro, a
partir das 15 horas, na Livraria Blulivro, no Shopping Park Europeu, piso
Térreo, em Blumenau, Santa Catarina. E por que essa promoção é tão importante?
Porque, na oportunidade, Urda Alice Klueger estará autografando a DÉCIMA
SEGUNDA edição do seu livro “No tempo das tangerinas”. Note-se que não se trata
da primeira, da segunda ou mesmo da quinta. É a DÉCIMA SEGUNDA edição!!!
Trata-se de um romance, publicado pela Editora Hemisfério Sul, enfocando a
emigração alemã no Vale do Itajaí. Além de ser um livro de ficção, é,
simultaneamente, importante documento histórico (afinal, Urda é, também,
historiadora) de um dos episódios mais relevantes da História do Estado de
Santa Catarina e do Brasil.
Destaco que “No tempo
das tangerinas” é continuação de “Verde Vale”, que já esgotou, se não me falha
a memória, nove edições e está, atualmente, na décima. Tratarei, reitero, desse
livro nos próximos dias, com mais vagar. Adianto, todavia, que ele começa com a
descrição da paisagem e da família Sonne (pioneira na colonização daquela
zona): o pai, a mãe Lucy (que veio para o Brasil fugindo da I Guerra Mundial),
e seus 10 filhos: Humberto-Gustavo, Guilherme, Wilhelm, Julius, Arnaldo, as
irmãs Margeritha, Emma, Anneliese, Priscila e a temporã Kátia. Eles recebem,
através de uma emissora alemã, notícias da II Guerra Mundial. É mister lembrar
que, neste tempo, Blumenau era como que extensão da Alemanha. Seus habitantes
conservavam a língua e os costumes do país de origem. Todavia, enquanto este
enfrentava os problemas da guerra, na comunidade nascente de Santa Catarina
reinava a fartura: nos morros, as árvores se carregavam de tangerinas, exalando
seu aroma pelo lugar. Era para lá que as crianças iam fazer suas brincadeiras.
O leitor perspicaz
certamente já deduziu que foi esse fato que inspirou o título desse bem escrito
e documental romance. Vem da “memória afetiva” (diria que, no caso, “olfativa”)
do personagem Guilherme, para o qual, 30 anos após o final do conflito, “a
guerra não acabou” e que, como Urda destaca, “a lembrança do aroma das
tangerinas serve para fazê-lo esquecer as dificuldades do dia a dia”. Curioso
que tenho recordação recorrente desse mesmo tipo, da minha infância em
Horizontina, no Rio Grande do Sul.
Eu tinha, somente,
cinco anos de idade. No casarão do meu avô paterno, a ampla sala – onde se
faziam refeições e periódicas reuniões familiares e sociais – desembocava em
uma longa escada, em cujas laterais havia alguns pés de mexirica (que naquela
região era conhecida como “bergamota”) cujos galhos, carregados de frutos,
invadiam parte da escadaria, centímetros além do corrimão. Na época da florada,
o aroma era de uma doçura inenarrável. Passados quase setenta anos, não consigo
esquecer aquele perfume, o mais delicioso que já senti até hoje. Por isso
entendo o efeito calmante e embriagador do cheiro das tangerinas sobre o
personagem Guilherme. Voltarei, certamente, ao assunto.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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