Melhor para quem?
Pedro J. Bondaczuk
O mês de maio, conforme
estimativas de dois institutos de pesquisa, deve registrar deflação.
Em abril passado, a balança comercial voltou a apresentar ligeiro
superávit, depois de anos consecutivos de déficits. O Produto
Interno Bruto brasileiro vai cair menos do que os 4% projetados no
início do ano, podendo a queda ser inferior a 2% ou até nem se
verificar. Os juros interbancários despencaram dos indecentes 49,5%
ao ano, de janeiro passado, para algo em torno de 25%. Então a crise
acabou?
Não! Muito longe disso! A
rigor, a população sequer sentiu os supostos benefícios dessa
apregoada recuperação econômica, que vem deixando os tucanos
eufóricos, ao ponto de arriscarem previsões delirantes ainda para
1999. Na recente convenção do partido, os participantes agiram como
se vivêssemos no melhor dos mundos. "Crise? Que crise?",
pareciam insinuar. Mas o desemprego, por exemplo, não cedeu. Pelo
contrário, ameaça, pelo menos em alguns setores, se agravar. Basta
consultar os cadernos de Classificados dos jornais, para observar a
escassez de oferta de vagas e, assim mesmo, para preencher as poucas
existentes, as empresas fazem exigências descabidas, oferecendo em
troca salários irrisórios.
O dólar, que havia se
estabilizado no patamar do R$ 1,65, voltou a ter forte valorização
em relação ao real, em decorrência, desta vez, da crise cambial
que se verifica na vizinha Argentina. Os juros menores não estão
sendo repassados à população e os empresários argumentam com as
altas taxas de inadimplência nas compras a prazo para não efetuarem
esses repasses. É a socialização do prejuízo, sem a
correspondente contrapartida da divisão de lucros, quando estes se
verificam.
E a deflação? Não seria uma
clara vitória da equipe econômica, que desmentiria as previsões
dos catastrofistas, os mesmos que diziam que a inflação anual de
1999 fecharia, em dezembro, com um acumulado ao redor dos 24%? Ser
otimista é bom, mas quando se tem base sólida para otimismo. Em
caso contrário, não passa de simples alienação. O quadro
econômico-social brasileiro está longe, muito distante, de adquirir
colorações róseas. Pelo contrário, o panorama é dos mais
sombrios e inquietadores. E não há qualquer pessimismo nessa
constatação.
A deflação é apenas o
indicativo mais seguro de que o País atravessa uma profundíssima
recessão, uma catalepsia econômica, da qual vai levar muito tempo
para se recuperar. O desemprego segue com taxas muito altas,
intoleráveis, fazendo com que a população perca os poucos ganhos
que teve nos primeiros anos do Plano Real. Chega a ser alarmante
quando o Estado mais rico da Federação, bem como a sua Capital, uma
das cinco maiores e mais importantes cidades do mundo, têm que criar
frentes de trabalho de emergência, a exemplo do que costumeiramente
se faz no Nordeste nos seus cíclicos períodos de seca, para
absorver a mão de obra ociosa, como está ocorrendo em São Paulo.
Famílias e mais famílias
vivem um duríssimo período incertezas e até de desespero,
ameaçadas pela miséria e pela fome, por absoluta falta de alguém
que lhes dê a mínima oportunidade de trabalhar. Muitos já estão
parados há dois anos ou mais, excluídos, portanto, não somente do
mercado de consumo, como da própria participação na vida social do
País e, por consequência, da cidadania.
As dez mil vagas criadas pela
Prefeitura de São Paulo, de garis e jardineiros, com salário
mensal de R$ 136,00, foram disputadas por cerca de 50 mil pessoas,
entre as quais, muitas com diplomas universitários.. Para
complicar, densas nuvens cinzentas voltam a rondar o céu da economia
brasileira, desta vez por causa da crise cambial argentina.
Novamente, a ameaça vem do exterior. Qual a causa de estarmos tão
fragilizados, a ponto de abalos na Ásia, na Rússia ou em nosso
vizinho e parceiro do Mercosul causarem tamanha instabilidade entre
nós? Não estaria na hora de questionar, ou pelo menos de discutir,
num amplo debate nacional, o atual modelo? As perspectivas de emprego
continuam mínimas, senão nulas. A balança comercial tende a ser
novamente deficitária em maio, por falta de uma estratégia
inteligente, ou pelo menos mais dinâmica, de exportações. As
bolsas de valores voltaram a operar em queda, enquanto o real torna a
sofrer desvalorizações. Enquanto isso, os tucanos soltam rojões e
esbanjam euforia. Querem tapear a quem?
(Editorial publicado na Folha
do Taquaral na segunda quinzena de maio de 1999)
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