Enigmas sem decifração
Pedro J. Bondaczuk
O amor entre um homem e uma mulher é um enigma indecifrável que,
quanto mais procuramos decifrar, mais e mais nos emaranhamos em
milhares de novas dúvidas e infinitas indagações. O que ele é,
afinal? Qual a sua natureza? O que define sua origem? Qual a sua
duração? Enigmas! Múltiplos e intrincados enigmas a desafiarem
nossa capacidade de racionalização.
O amor, em resumo, é meramente atração sexual entre pessoas de
sexos opostos? Muitos entendem que, no final das contas, é isso
mesmo. Evidentemente que não é (ou, pelo menos, não é “apenas”
isso), embora esse fator seja relevante para aproximar dois seres
humanos que se amem. Posso ser atraído sexualmente por uma fêmea
esplendorosa e, após saciar meu instintivo desejo, não sentir mais
nada, absolutamente nada por ela, a não ser profunda indiferença (e
vice-versa).
É, então, identidade de pensamentos, sentimentos e vontades? Estes
fatores podem, de fato, estar presentes num relacionamento amoroso (e
é desejável que estejam). Contudo não o definem e nem o
caracterizam. Há muitas, muitíssimas pessoas que pensam da mesma
maneira, sentem o que outras sentem, têm os mesmos planos e ideais
e, no entanto, não se amam. O oposto, igualmente, é verdadeiro.
Ademais, é impossível saber com certeza, com absoluta e total
segurança, o que alguém do seu lado realmente pensa, sente ou
deseja. Essa pessoa pode, perfeitamente, dizer uma coisa e pensar,
sentir e desejar outra completamente diferente. Como saber se está
dizendo a verdade? Não há como.
Um casal vive, às vezes, anos e anos sob o mesmo teto, compartilha
seus corpos, festeja bodas de prata, de ouro e de diamante, constrói
uma vida em comum, gera e educa filhos, é presenteado com um punhado
de netos, reúne considerável patrimônio material em parceria e, no
entanto... não se conhece. Amiúde, um se surpreende com atitudes
inesperadas do outro, para o bem ou para o mal.
Qual a razão de nos apaixonarmos por determinada pessoa e não por
outra qualquer, das bilhões do sexo oposto que há mundo afora, não
raro mais belas, melhores dotadas de inteligência e cultura, de
comportamento mais exemplar e repletas de virtudes em muito maior
quantidade do que a que escolhemos? Existe algum motivo especial?
Deve existir, mas qual? Mistério! Insondável mistério!
Conclui-se, pois, que o amor não é para ser racionalizado, mas
vivido plenamente, com o êxtase e o sofrimento que produz, enquanto
durar. E dura para sempre? Depende o que essa palavra “sempre”
signifique para cada um.
Há casos em que sua existência se limita a um único dia, se tanto,
que nos parece uma eternidade pelas sensações e lembranças que
produz. E que permanece em nossa memória intenso, vivo e verdadeiro
enquanto vivermos. Há outros que vão até além do túmulo e
perduram por anos e mais anos após a extinção física da pessoa
amada. Como se vê, só há enigmas nessa questão. Complexos,
profundos e indecifráveis enigmas.
O escritor português Casimiro Brito escreveu, a propósito, no livro
“Arte da Respiração”, estas palavras que vêm a calhar nestas
descompromissadas considerações: “Amar-te é decifrar
humildemente um enigma que não tem decifração porque a todo o
momento as águas passam e bebê-las e banhar-me nelas é bom e não
há mais nada”.
É isto o que você tem que fazer, caso tenha o supremo privilégio
de ter um amor: gozá-lo em sua plenitude e esplendor, a cada segundo
(pois é eterno... enquanto dura). Esqueça as racionalizações. Não
tente decifrar um enigma que não tem decifração. Não queira saber
sua origem, natureza, finalidade ou duração. Viva-o com o máximo
de intensidade que puder.
“Beba e banhe-se” nas suas águas e verá o quanto isso é bom.
Acredite que “não há mais nada”, mesmo que haja, não importa.
O amanhã? Bem, esqueça do amanhã, que, ademais, você pode sequer
ter.
Futuro? Não se preocupe com ele. O amor é intemporal. Faz seu
próprio tempo. Preenche todas as fases da sua vida, embora se
realize no presente, que é o que você tem nas mãos, o seu
patrimônio e a sua riqueza, que por isso precisa valorizar.
Sobretudo, ame. Ame profunda e irrestritamente, sem reservas, temores
ou preocupações.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment