Friday, July 20, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Evitar os descuidos


Evitar os descuidos

Pedro J. Bondaczuk

Concentrou o governo de Fernando Collor de Mello, até agora, todo o seu poder de fogo nessa espécie de guerra contra a inflação. E nesse particular não existe a menor dúvida, pois, está levando nítida vantagem, a ponto de convencer o próprio Congresso Nacional a manifestar apoio às linhas mestras do plano denominado "Brasil Novo". Diante do tratamento de choque estabelecido na economia, à primeira vista, dá para se ter a ideia de que a inflação vai baixar mesmo a níveis suportáveis, podendo inclusive alcançar taxas negativas nestes primeiros meses da implantação das medidas de impacto lançadas. Aliás, o Plano Cruzado funcionou nessa mesma base, transformando-se depois em grande fiasco.

Entretanto, a impressão é que o atual governo está exagerando um pouco na dose de entusiasmo em torno do sucesso dessa luta um tanto ingrata, relegando a plano secundário as implicações presentes e futuras. A perspectiva quanto ao estado de recessão constitui já uma tônica nos comentários de especialistas das questões econômicas. Existe praticamente uma opinião unânime a respeito desse acontecimento. Por outro lado, tanto isso é verdade, que empresários e trabalhadores, através de suas respectivas lideranças, têm viajado nestes últimos dias com destino a Brasília, tentando expor ao governo preocupações e apreensões de toda a natureza.

Não se trata apenas de fórmula para pressionar o Banco Central a rever determinadas colocações quanto à liberação de créditos, iniciativa necessária à movimentação dos negócios, capaz de manter de pé as empresas, além de garantir os empregos, porém, de efetivo alerta quanto aos riscos de uma situação futura um tanto complicada.

Ainda há pouco, em seminário realizado na Unicamp, a economista Maria da Conceição Tavares, analisando os prós e contras do plano em desenvolvimento, admitiu a existência de ganho salarial para os trabalhadores que vão permanecer no emprego, todavia, está prevendo, em contrapartida, uma onda de desemprego "sem precedentes", atingindo cerca de 20% da população economicamente ativa do País. De fato, não há como esconder o sol com a peneira, pois o fenômeno do desemprego está ocorrendo em todos os setores de atividade de modo um tanto abrangente.

Convenhamos, não se discute mais a queda da inflação. Acontecerá ela a toque de caixa, apesar do pleno funcionamento da correção monetária, do BTN e principalmente da prática dos juros elevados. Como se observa, as atenções do governo não se acham voltadas também para o espantalho do desemprego e menos ainda para a redução das atividades nesse universo do mundo dos negócios. Parece estar faltando sensibilidade no trato dos resultados negativos da experiência adotada no dia 16 de março último. Certamente, esse descuido poderá assumir as características de erro imperdoável, comprometendo a curto prazo o êxito previsto para o plano lançado com grande entusiasmo e em meio às expectativas de toda a sociedade brasileira. E tempo há de sobra para os ajustes indispensáveis.

(Editorial publicado na página 2, Opinião, co Correio Popular, em 11 de abril de 1990)

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