Evitar os descuidos
Pedro J. Bondaczuk
Concentrou o governo de
Fernando Collor de Mello, até agora, todo o seu poder de fogo nessa
espécie de guerra contra a inflação. E nesse particular não
existe a menor dúvida, pois, está levando nítida vantagem, a ponto
de convencer o próprio Congresso Nacional a manifestar apoio às
linhas mestras do plano denominado "Brasil Novo". Diante do
tratamento de choque estabelecido na economia, à primeira vista, dá
para se ter a ideia de que a inflação vai baixar mesmo a níveis
suportáveis, podendo inclusive alcançar taxas negativas nestes
primeiros meses da implantação das medidas de impacto lançadas.
Aliás, o Plano Cruzado funcionou nessa mesma base, transformando-se
depois em grande fiasco.
Entretanto, a impressão é
que o atual governo está exagerando um pouco na dose de entusiasmo
em torno do sucesso dessa luta um tanto ingrata, relegando a plano
secundário as implicações presentes e futuras. A perspectiva
quanto ao estado de recessão constitui já uma tônica nos
comentários de especialistas das questões econômicas. Existe
praticamente uma opinião unânime a respeito desse acontecimento.
Por outro lado, tanto isso é verdade, que empresários e
trabalhadores, através de suas respectivas lideranças, têm viajado
nestes últimos dias com destino a Brasília, tentando expor ao
governo preocupações e apreensões de toda a natureza.
Não se trata apenas de
fórmula para pressionar o Banco Central a rever determinadas
colocações quanto à liberação de créditos, iniciativa
necessária à movimentação dos negócios, capaz de manter de pé
as empresas, além de garantir os empregos, porém, de efetivo alerta
quanto aos riscos de uma situação futura um tanto complicada.
Ainda há pouco, em seminário
realizado na Unicamp, a economista Maria da Conceição Tavares,
analisando os prós e contras do plano em desenvolvimento, admitiu a
existência de ganho salarial para os trabalhadores que vão
permanecer no emprego, todavia, está prevendo, em contrapartida, uma
onda de desemprego "sem precedentes", atingindo cerca de
20% da população economicamente ativa do País. De fato, não há
como esconder o sol com a peneira, pois o fenômeno do desemprego
está ocorrendo em todos os setores de atividade de modo um tanto
abrangente.
Convenhamos, não se discute
mais a queda da inflação. Acontecerá ela a toque de caixa, apesar
do pleno funcionamento da correção monetária, do BTN e
principalmente da prática dos juros elevados. Como se observa, as
atenções do governo não se acham voltadas também para o
espantalho do desemprego e menos ainda para a redução das
atividades nesse universo do mundo dos negócios. Parece estar
faltando sensibilidade no trato dos resultados negativos da
experiência adotada no dia 16 de março último. Certamente, esse
descuido poderá assumir as características de erro imperdoável,
comprometendo a curto prazo o êxito previsto para o plano lançado
com grande entusiasmo e em meio às expectativas de toda a sociedade
brasileira. E tempo há de sobra para os ajustes indispensáveis.
(Editorial publicado na página
2, Opinião, co Correio Popular, em 11 de abril de 1990)
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