Friday, January 08, 2016

Surge rara safra de estadistas nas Américas


Pedro J. Bondaczuk

A América Latina em geral (e a Central em particular) em virtude de suas tradicionais práticas caudilhescas, nunca foi farta em grandes estadistas. Às vezes aparece, um ou outro, aqui ou ali, nos raros hiatos entre uma ditadura e outra, que geram esperanças nas sofridas populações do continente, em geral frustradas não muito tempo depois. Entretanto, de 1983 para cá, uma nova “safra” de políticos está aparecendo na região. Gente com idéias novas e grande visão de futuro, como o presidente argentino, Raul Alfonsin; como o peruano, Alan Garcia Perez, ou como o uruguaio, Júlio Maria Sanguinetti. São poucos, é verdade, mas em raras vezes os latino-americanos tiveram tantos líderes notáveis pela seu espírito público, desprendimento e espírito e vocação democrática ocupando, ao mesmo tempo, cargos de tamanha relevância, como agora.

A América Central, que sempre se constituiu no patinho feio das Américas, em estereótipo de ditaduras, a tal ponto de seus países serem chamados, jocosamente, de “Repúblicas de Bananas”, não ficou de fora desse ressurgimento democrático, ainda cercado de muitas ameaças. Tem, na figura do costarriquenho Oscar Arias Sanchez legítimo estadista, capaz de conter ódios e ressentimentos (alguns até seculares) em favor de uma causa maior: da estabilidade política, econômica e social dessa sofrida região, para que ela deixe de ser o joguete que sempre foi, ao longo da história contemporânea, dos ricos e poderosos e crie e siga seu próprio destino, sem interferências de terceiros.

O plano de paz de Oscar Arias para a América Central, posto que de execução ainda duvidosa face os múltiplos obstáculos existentes, é uma obra de raro arrojo e de muita coragem. A primeira vez que a proposta veio à baila na grande imprensa foi em janeiro passado. Na oportunidade, foi acolhida com frieza e indisfarçável pouco caso. Podemos dizer que até mesmo houve certa hostilidade à proposta. Ninguém acreditava que um continente, tutelado por mais de um século e meio, pelos Estados Unidos, pudesse achar, por iniciativa própria, seu caminho para sair da magnífica enrascada em que se meteu. Arias, todavia, mostrou determinação, típica dos visionários, dos idealistas, dos que acreditam no próximo e, claro, confiança na própria capacidade de convencimento.

Com enorme paciência, o líder costarriquenho foi tecendo a rede de entendimentos entre as várias partes em conflito, atraindo o interesse dos outros quatro presidentes dos países convulsionados por perversas e intermináveis guerras civis. Até que obteve o que a muitos parecia um milagre quase impossível de acontecer. Reuniu, em torno de uma mesma mesa de negociações, pessoas com idéias e interesses heterogêneos, muito diferentes, conflitantes até acerca do papel da América Central no mundo contemporâneo. Por isso, fica-se torcendo pelo sucesso da empreitada desse líder conciliador. E mesmo que ela venha a fracassar, a simples emergência de um estadista tão lúcido e pertinaz, como Oscar Arias Sanchez, já é uma vitória do bom senso, que deve ser saudada por todos os latino-americanos, tão carentes de lideranças autênticas e de cabeças pensantes lúcidas e arejadas.

(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 24 de setembro de 1987).                      



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