Primeiro romance da “trilogia
essencial” de Modiano
Pedro
J. Bondaczuk
A Editora Record – a
exemplo do que fez a Rocco – tão logo foi anunciado, em outubro de 2014, que o
escritor francês, Patrick Modiano, havia conquistado o Prêmio Nobel de
Literatura do ano passado, apressou-se em trazer para o público brasileiro
várias obras desse “astro” das letras mundiais, até então pouco conhecido entre
nós. Adquiriu, na Feira de Frankfurt, na Alemanha, os direitos para o
lançamento de três livros desse romancista no Brasil: “Remissão da pena”,
publicado na França em 1988; “Flores da ruína”, de 1991 e “Primavera de cão”,
datado de 1993 que já estão nas prateleiras das boas livrarias do País.
São três obras
independentes, distintas, mas que, todavia, formam uma unidade: a “trilogia
essencial” de toda obra de Modiano. Como a imensa maioria dos seus romances, as
narrativas são feitas em poucas páginas (não chegam a 150) e guardam a mesma
linha temática da maioria de seus livros, ou seja, memórias do período de ocupação
da França por parte das tropas nazistas, durante a Segunda Guerra Mundial e
durante o período imediatamente posterior à libertação do país.
O leitor certamente tem
estranhado minha insistência em comentar tantas publicações de um único
escritor, o que nunca antes eu fiz. Vários já me fizeram essa observação,
embora sem criticar minha opção. Afinal, estou sendo, no mínimo, coerente. Se
em menos de um ano, duas grandes editoras lançaram sete livros de Modiano, é
porque ele tem algo de especial a apresentar. Ninguém arriscaria tanto dinheiro
em produtos que não tivessem potencial de retorno. E os livros de Modiano têm.
Mas este é apenas um dos motivos da minha insistência. Outro é o fato de eu
jamais ter tido acesso a tantas obras de um único ganhador de Nobel. É, pois,
oportunidade rara que tenho e que não vou desperdiçar. Há outros motivos ainda,
e não menos relevantes. Um deles é que estamos a uma semana, ou pouco mais, do
anúncio de novo ganhador do Nobel de Literatura e, por isso, é oportuno manter
o assunto em evidência (por sua óbvia importância literária). Nos primeiros
dias de outubro saberemos quem vai ser o sucessor de Patrick Modiano. Quem
será? Vai ser, finalmente, um brasileiro? Será algum dos eternos favoritos até
aqui preteridos? Logo saberemos.
Um dos livros da
“trilogia essencial” do originalíssimo escritor francês é “Flores da ruína”.
Trata-se de um volume relativamente pequeno, de 144 páginas, recheadas de
memórias e de reflexões. Como na maioria dos seus romances, a trama é relatada
por um narrador na primeira pessoa, sugerindo que se trate do próprio Modiano.
Ademais, fica difícil de distinguir o que é real, o que é acontecido, o que é,
enfim, autobiográfico do que não passa de mera ficção. A narrativa é um pouco
dos dois. O foco central é o suicídio de um jovem casal. O autor apresenta,
metodicamente, as circunstâncias que levou os dois a darem cabo da vida,
entremeando, às investigações, memórias pessoais, que aparentemente nada têm a
ver com as mortes, mas... só aparentemente.
Óbvio que não irei
revelar o cerne da trama e muito menos seu desfecho, já que estas considerações
não se propõem a ser sinopse do livro, mas comentários à margem sobre a
impressão que o autor deixou em meu espírito. Aprecio, sobremaneira, a beleza,
a elegância e a agudeza da narrativa de Modiano, na abordagem de tema tão
delicado. Há páginas e mais páginas que classifico como verdadeiros poemas em
prosa, tal a delicadeza que contêm. Apesar do autor muitas vezes me confundir,
ao misturar fatos e ficção, acho válida e oportuna essa estratégia, que me
força a prestar atenção dobrada na leitura, muito maior do que os romances
convencionais, nos quais conta mais (quando não exclusivamente) a ação do que
aquilo que a determina e as conseqüências que ela traz. Afinal, não é qualquer
um que se mantém fiel a um mesmo e único tema, ao longo de uma já longa
carreira, sem, todavia, ser repetitivo, monótono e óbvio.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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