Caminhos antagônicos
Pedro J. Bondaczuk
O relacionamento entre as
nações, especialmente as que mantêm um antagonismo entre si (quer de caráter
ideológico, quer militar ou econômico) é feito, há séculos, em dois planos. Um
oficial, diplomático e normal, fartamente divulgado e que deveria ser o único
caminho para a discussão e busca de solução das desavenças. Outro, subreptício,
ilegal e encoberto, traduzido por espionagem, apoio a facções internas que se
opõem ao regime vigente no país desafeto, e outras formas até mais imorais e
condenáveis. Dado o seu caráter nada ortodoxo, este último procedimento
raramente vem a público. Não, pelo menos, de forma oficial, embora todos saibam
que ele existe.
Exímios
novelistas têm feito fortunas usando como temas para suas histórias ações
mirabolantes, desenvolvidas no campo da espionagem internacional. Filmes, tendo
tais assuntos por tema, esgotam bilheterias e prendem as pessoas junto às telas
de televisão.
E
as artimanhas utilizadas pelos espiões da ficção são de tal ordem, que ninguém
acredita serem sequer próximas da verossimilhança. Quem pensa assim, todavia,
se engana.
Na
maior parte das vezes, a realidade, com as inconfessáveis motivações que a
escudam, é infinitamente mais aética e criminosa do que a imaginação dos mais
maquiavélicos dos novelistas pode conceber. Basta, por exemplo, uma rápida
passagem de olhos no noticiário de anteontem, estampada nesta página, e se ler
da maneira correta nas entrelinhas, para se perceber a manifesta ilegalidade da
qual se valem respeitáveis governos para obter informações que lhes interessam
ou para subverter situações, criando fatos políticos que as beneficiem.
A
ação dos espiões, todavia, não é um fato recente, nem restrito apenas ao
pós-guerra. Diríamos que é algo que pontilha a História universal, desde quando
os homens começaram a se agrupar em países, com realidades, costumes e
motivações diversos.
Nunca
faltaram, no correr dos séculos, celerados que colocaram a cobiça, a ganância e
mesquinhos interesses pessoas (sempre transitórios e efêmeros) acima dos
coletivos. Os anais de quase todas as civilizações registram seus traidores,
seus oportunistas e seus quintas colunas.
Entre
a visão romântica, que todos nós temos, do relacionamento internacional e a
realidade dos fatos, vai uma distância imensa. Uma comunidade mundial, baseada
apenas no Direito e na ética, é um ideal que beira as raias da utopia.
Vez
ou outra, alguém comete uma falha e para que todo o esquema não seja desnudado
à luz da opinião pública, o elo fraco da corrente de ilegalidades é
sacrificado, para que o status quo possa ser mantido.
Freqüentemente,
alguns tentam justificar essas mazelas, dando a entender que os “fins
justificam os meios”. Para que alguns “iluminados” testem alguma idéia
elocubrada num instante de ócio, não importa que uma, cinco, dez, cem ou mil
vidas sejam ceifadas. Ou, quem sabe, uma cidade como Hiroshima. Talvez, até
mesmo, um país. Que importam as pessoas para esses paranóicos, que se arrogam
em deuses, em senhores dos destinos de seus semelhantes? A lei? Ora, a lei...
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 26 de março de
1985).
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