Olho por olho
Pedro J. Bondaczuk
O seqüestro do xeque Abdel Karim Obeid, por parte de
um comando israelense, ocorrido na sexta-feira passada, no Sul do Líbano, foi
um ato, no mínimo, precipitado, por colocar em risco os 17 reféns estrangeiros
em território libanês, em mãos de vários grupos extremistas.
Combater tais facções, em meio ao caos de um país
esfacelado, onde não se sabe quem manda de fato, é como procurar uma agulha num
palheiro. O melhor que se faz, numa circunstância dessas, é se defender das
suas investidas e se limitar a isso. Até porque, diante das circunstâncias,
fazer do ataque a melhor arma de defesa, nesse caso, pode redundar no que deu.
Na provável execução do tenente-coronel norte-americano William Higgins e,
sabe-se lá, de quem mais.
Quando se lida com fanáticos, não se pode esperar
nenhum rasgo de lucidez. E esta, em verdade, é a presente situação. Os
israelenses, que contam com um dos melhores serviços secretos do mundo (o
Mossad) e com comandos extremamente bem treinados e disciplinados, certamente
quiseram mostrar ao Hezbollah que estão dispostos a atingir a organização em
seus próprios domínios e com suas próprias táticas. Ou seja, partiram para uma
espécie de pena de Talião contra os xiitas, o que nunca funcionou no passado e funciona
muito menos agora.
O pai da independência indiana, Mohandas
Karamanchand Gandhi, o “Mahatma” (“Grande Alma”) da Índia, cujo movimento de
resistência passiva aos britânicos completa, hoje, 69 anos, dizia, do alto da
sua extraordinária clarividência: “Olho por olho e o mundo acabará cego”.
E é para isso que parece estarmos nos encaminhando:
para uma cegueira generalizada. De nada adianta – e o Pentágono sabe disso – os
norte-americanos fazerem uma demonstração de seu poderio de fogo diante do
Líbano. Apenas a potência destruidora da nave capitânia da Sexta Frota dos
Estados Unidos, o porta-aviões “USS Coral Sea”, tem capacidade de varrer
qualquer vestígio de Beirute da face da Terra. Mas, e daí?
Qual a culpa da população dessa cidade pela ação
desses grupelhos radicais fanatizados, que agem exatamente no vácuo do poder
deixado pela guerra civil? Ela, certamente, é muito mais vítima de toda essa
situação do que os outros 16 reféns estrangeiros, do que o coronel Higgins ou
de que as milícias e grupos que se trucidam selvagemente, dia após dia.
É uma gente heróica, decidida a se manter naquilo
que é seu a qualquer custo, mesmo diante da iminência da morte, com a esperança
de que um dia a racionalidade retorne, não somente a Beirute, mas a todo o
Líbano. E que o país volte a ser a Suíça do Oriente Médio e não a atual terra
de ninguém em que o fanatismo, o cinismo internacional e a indiferença mundial
o transformaram.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do
Correio Popular, em 1º de agosto de 1989)
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