Sunday, January 03, 2016

Momento delicado da glasnost


Pedro J. Bondaczuk


Os distúrbios étnicos, que se verificam, num crescendo, desde o ano passado, na União Soviética, estão se espalhando por suas 15 Repúblicas, como se fosse uma grande infecção. Os motivos podem não ser os mesmos, mas os riscos de esfacelamento do enorme império marxista são cada vez mais iminentes. A menos que tais manifestações de violência venham sendo toleradas pelas autoridades de Moscou como um mal necessário, uma espécie de “válvula de escape” para deixar escapar o excesso de pressão gerado pelas reformas econômico-sociais do presidente Mikhail Gorbachev, o que não parece provável.

Primeiro foram os armênios e azerbaijenses que se confrontaram, em disputa pelo enclave de Nagorno-Kharabalkaskaya. Depois, vieram os distúrbios na Geórgia, no Uzbequistão e agora no Kazaquistão. Isto para não falar no descontentamento, que já está descambando para um desafio, nas três Repúblicas bálticas: Letônia, Estônia e Lituânia.

Conseguirá o mentor da “glasnost” e da “Perestroika” manter sob controle tais incidentes, impedindo que eles ganhem um caráter mais amplo? E se não conseguir, o que é mais provável que ocorra? Uma guerra civil? Uma ampla repressão? Uma desagregação da URSS, certamente, não será permitida por nenhuma autoridade do Cremlin. Isto significaria o fim da superpotência oriental, o que, em são consciência, ninguém acredita que possa vir a ocorrer, embora haja, logicamente, quem o deseje.

A União Soviética vive um momento agudo de sua história e Gorbachev e os assessores que o cercam sabem disso. Tensões de toda a espécie são sintomas claros e visíveis de que a abertura nesse país, pelo menos até agora, tem sido para valer.

A democracia, através dos conflitos que ocasiona, gera uma força imensa. Caso ela seja canalizada para a direção correta, pode vir a significar um progresso enorme em todos os setores. Mas se tais vetores conflitivos não forem adequadamente administrados, eles tendem a produzir explosões incontroláveis de violência. Esse é o desafio que os reformistas de Moscou têm pela frente, até porque, certamente, eles serão, como já estão sendo, muito pressionados pelos integrantes da linha-dura do Partido Comunista.

Ninguém acredita que Gorbachev venha a agir como Deng Xiaoiping na China, que passou anos dizendo uma coisa, e acabou fazendo outra diametralmente oposta. A democracia, ao contrário do que muita gente pensa, não se caracteriza pela harmonia. Até porque, a unanimidade é a característica das tiranias, que impõem, a ferro e fogo, suas opiniões, suprimindo a oposição.

O que se espera é que o presidente soviético cumpra sua promessa de democratizar seu país. Mesmo tendo que enfrentar os conflitos que vem enfrentando em pelo menos oito de suas 15 Repúblicas.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 21 de junho de 1989).


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