Perfeccionismo
sem obsessão
Pedro J. Bondaczuk
O poeta norte-americano Robert
Hiilyer, ganhador de um Prêmio Pulitzer de poesia, afirmou, certa ocasião, que
“o perfeccionismo é um perigoso estado de espírito em um mundo imperfeito”.
Concordo com ele, mas apenas em parte. Queiram ou não, tudo, ou quase tudo em
nossa vida é relativo. Devemos, pois, considerar as duas faces da moeda. A
perfeição – não é novidade para ninguém – é algo difícil, se não impossível, de
se conseguir. Nem por isso, todavia, devemos deixar de tentar. Só assim,
tentando, tentando e tentando, conseguiremos fazer o melhor, seja qual for a
tarefa que nos propusermos a executar. O que não podemos é transformar o
perfeccionismo em obsessão, em fonte de decepções diante da imperfeição do que
fizermos, de contínuas frustrações e, por conseqüência, de sofrimentos.
Uma das dificuldades das pessoas
criadoras é, por exemplo, a de encontrar final perfeito para suas obras, quer
se trate de um poema, de uma sinfonia ou, mesmo, de uma carreira acadêmica ou
profissional. No caso dos escritores, os perfeccionistas sempre encontram
alguma coisa a cortar, a acrescentar, a mudar, mesmo que aquilo que fizeram
pareça perfeito a terceiros. Esse perfeccionismo, destaque-se, não é negativo.
Claro, desde que não seja levado a extremos, que não se transforme, reitero, em
obsessão. Que não nos leve a abortar a obra que estivermos fazendo, que seja de
razoável para boa qualidade, apenas porque não é perfeita. Muitos agem dessa
maneira.
É melhor concluirmos o que nos
propusermos a fazer, mesmo que nos pareça, ou que seja de fato, obra imperfeita
e aquém das nossas possibilidades, do que hesitarmos, ou adiarmos ou, pior, abandonarmos sua
conclusão. No meu caso, confesso-me perfeccionista convicto em minha atividade
de comunicador, tanto como jornalista, quanto, e principalmente, como escritor.
Já fui obcecado na busca da perfeição. Hoje não sou. Admito e aceito minhas
limitações, embora busque superá-las. Já abortei, por exemplo, uma infinidade
de textos, livros inteiros, considerados de boa qualidade pelos que os leram,
por entender que careciam, entre outras coisas, de clareza. Em vez de
preservá-los, para trabalhar neles em ocasião oportuna, mais propícia, de maior
lucidez, simplesmente os destruí, sem que deles restasse o mínimo vestígio.
Tolice, claro. Foi, no mínimo, enorme desperdício de tempo e de esforço.
Comecei a cair na realidade no
jornalismo. Também nessa atividade empenhei-me por redigir textos perfeitos.
Igualmente me frustrei e me senti tentado a destruir o que escrevia e que
julgava aquém do meu potencial, do meu critério de avaliação de qualidade.
Todavia, em jornal, trabalhamos de olho no relógio, que é nosso implacável
feitor. Temos uma coisa chamada “deadline”, ou seja, prazo final e inadiável
para concluir as matérias de que formos incumbidos, para serem estampadas no
jornal do dia seguinte. Se abortarmos todos os textos que redigirmos, por não
gostarmos deles, não teremos, óbvio, como concluir nossas tarefas. O resultado,
fatalmente, será o clássico “bilhete azul”, a demissão sumária e irrevogável,
por incompetência.
De uns tempos para cá, passei a
ser regido por inflexível “deadline” também na produção literária. Assumi uma
quantidade tão grande de compromissos diários, com sites, blogs e jornais
impressos, que não posso nem pensar em refazer qualquer texto imperfeito, a
menos que se trate de ridículo monstrengo eivado de erros gramaticais, sob pena
de não cumprir o comprometido. E o cumprimento do que trato, para mim, é sagrado!
O que escrever, portanto, tem que sair o mais perfeito possível, e de cara, na
primeira versão. A máxima concessão que me posso fazer é proceder a atenta
(posto que veloz) revisão, fazendo os acréscimos e os cortes mais urgentes que
se mostrarem necessários. E atentando, sobretudo, para a correção gramatical.
No mais... Às vezes acerto e os textos saem, surpreendentemente, de acordo com
meu rígido critério de qualidade. Na maioria das vezes, porém... frustro-me,
rotundamente. Pudera!
O problema, no caso, não está no
perfeccionismo. Está, isso sim, no exagero dos compromissos assumidos, tremenda
armadilha que eu mesmo montei para me amofinar. Normalmente, não gosto do que
escrevo. Apenas, se tanto, 5% dos textos que produzo me agradam e relativamente.
Não me refiro ao conteúdo, porquanto tenho extremo cuidado nas pesquisas dos
temas de que trato, para não cometer nenhuma barbaridade, qualquer disparate
que me leve a cair em ridículo. O que me incomoda é a forma de exposição, pois
tenho a convicção de que sei e que posso escrever melhor, com maior clareza e
precisão, do que usualmente escrevo. Ademais, limito o campo de atuação,
abordando, praticamente, um único assunto: Literatura.
Tente, paciente leitor, escrever
três milhares de textos, como fiz até aqui, nestes últimos dez anos, tratando
de um só tema, recorrente, e sem se repetir nenhuma vez. É, no mínimo, tarefa
para Hércules e seus doze mitológicos trabalhos. Todavia, nem forçando muito a
barra sou sequer arremedo desse semi-deus grego, filho de Zeus.Ainda assim, não
me oponho (pelo contrário, defendo) ao perfeccionismo, sem fazer dele, no
entanto, obsessão. E tendo em mente a advertência do poeta Robert Hiilyer, de
que ele se trata de “perigoso estado de espírito em um mundo imperfeito”.
No comments:
Post a Comment