Tuesday, January 26, 2016

Perfeccionismo sem obsessão

Pedro J. Bondaczuk

O poeta norte-americano Robert Hiilyer, ganhador de um Prêmio Pulitzer de poesia, afirmou, certa ocasião, que “o perfeccionismo é um perigoso estado de espírito em um mundo imperfeito”. Concordo com ele, mas apenas em parte. Queiram ou não, tudo, ou quase tudo em nossa vida é relativo. Devemos, pois, considerar as duas faces da moeda. A perfeição – não é novidade para ninguém – é algo difícil, se não impossível, de se conseguir. Nem por isso, todavia, devemos deixar de tentar. Só assim, tentando, tentando e tentando, conseguiremos fazer o melhor, seja qual for a tarefa que nos propusermos a executar. O que não podemos é transformar o perfeccionismo em obsessão, em fonte de decepções diante da imperfeição do que fizermos, de contínuas frustrações e, por conseqüência, de sofrimentos.

Uma das dificuldades das pessoas criadoras é, por exemplo, a de encontrar final perfeito para suas obras, quer se trate de um poema, de uma sinfonia ou, mesmo, de uma carreira acadêmica ou profissional. No caso dos escritores, os perfeccionistas sempre encontram alguma coisa a cortar, a acrescentar, a mudar, mesmo que aquilo que fizeram pareça perfeito a terceiros. Esse perfeccionismo, destaque-se, não é negativo. Claro, desde que não seja levado a extremos, que não se transforme, reitero, em obsessão. Que não nos leve a abortar a obra que estivermos fazendo, que seja de razoável para boa qualidade, apenas porque não é perfeita. Muitos agem dessa maneira.

É melhor concluirmos o que nos propusermos a fazer, mesmo que nos pareça, ou que seja de fato, obra imperfeita e aquém das nossas possibilidades, do que hesitarmos, ou  adiarmos ou, pior, abandonarmos sua conclusão. No meu caso, confesso-me perfeccionista convicto em minha atividade de comunicador, tanto como jornalista, quanto, e principalmente, como escritor. Já fui obcecado na busca da perfeição. Hoje não sou. Admito e aceito minhas limitações, embora busque superá-las. Já abortei, por exemplo, uma infinidade de textos, livros inteiros, considerados de boa qualidade pelos que os leram, por entender que careciam, entre outras coisas, de clareza. Em vez de preservá-los, para trabalhar neles em ocasião oportuna, mais propícia, de maior lucidez, simplesmente os destruí, sem que deles restasse o mínimo vestígio. Tolice, claro. Foi, no mínimo, enorme desperdício de tempo e de esforço.

Comecei a cair na realidade no jornalismo. Também nessa atividade empenhei-me por redigir textos perfeitos. Igualmente me frustrei e me senti tentado a destruir o que escrevia e que julgava aquém do meu potencial, do meu critério de avaliação de qualidade. Todavia, em jornal, trabalhamos de olho no relógio, que é nosso implacável feitor. Temos uma coisa chamada “deadline”, ou seja, prazo final e inadiável para concluir as matérias de que formos incumbidos, para serem estampadas no jornal do dia seguinte. Se abortarmos todos os textos que redigirmos, por não gostarmos deles, não teremos, óbvio, como concluir nossas tarefas. O resultado, fatalmente, será o clássico “bilhete azul”, a demissão sumária e irrevogável, por incompetência.

De uns tempos para cá, passei a ser regido por inflexível “deadline” também na produção literária. Assumi uma quantidade tão grande de compromissos diários, com sites, blogs e jornais impressos, que não posso nem pensar em refazer qualquer texto imperfeito, a menos que se trate de ridículo monstrengo eivado de erros gramaticais, sob pena de não cumprir o comprometido. E o cumprimento do que trato, para mim, é sagrado! O que escrever, portanto, tem que sair o mais perfeito possível, e de cara, na primeira versão. A máxima concessão que me posso fazer é proceder a atenta (posto que veloz) revisão, fazendo os acréscimos e os cortes mais urgentes que se mostrarem necessários. E atentando, sobretudo, para a correção gramatical. No mais... Às vezes acerto e os textos saem, surpreendentemente, de acordo com meu rígido critério de qualidade. Na maioria das vezes, porém... frustro-me, rotundamente. Pudera!

O problema, no caso, não está no perfeccionismo. Está, isso sim, no exagero dos compromissos assumidos, tremenda armadilha que eu mesmo montei para me amofinar. Normalmente, não gosto do que escrevo. Apenas, se tanto, 5% dos textos que produzo me agradam e relativamente. Não me refiro ao conteúdo, porquanto tenho extremo cuidado nas pesquisas dos temas de que trato, para não cometer nenhuma barbaridade, qualquer disparate que me leve a cair em ridículo. O que me incomoda é a forma de exposição, pois tenho a convicção de que sei e que posso escrever melhor, com maior clareza e precisão, do que usualmente escrevo. Ademais, limito o campo de atuação, abordando, praticamente, um único assunto: Literatura.

Tente, paciente leitor, escrever três milhares de textos, como fiz até aqui, nestes últimos dez anos, tratando de um só tema, recorrente, e sem se repetir nenhuma vez. É, no mínimo, tarefa para Hércules e seus doze mitológicos trabalhos. Todavia, nem forçando muito a barra sou sequer arremedo desse semi-deus grego, filho de Zeus.Ainda assim, não me oponho (pelo contrário, defendo) ao perfeccionismo, sem fazer dele, no entanto, obsessão. E tendo em mente a advertência do poeta Robert Hiilyer, de que ele se trata de “perigoso estado de espírito em um mundo imperfeito”.


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