Roleta russa universal
Pedro J.
Bondaczuk
As superpotências, além de não conseguirem qualquer
resultado prático nas negociações sobre armas nucleares, que se arrastam, em
Genebra, e cujo segundo turno recomeçou no início desta semana, ainda estão em
vias de um significativo retrocesso.
É que, a despeito de uma posição
unânime contrária, por parte dos seus aliados da Organização do Tratado Norte,
os Estados Unidos estão prestes a romper o Tratado Salt-2, firmado em 1979 pelo
ex-presidente norte-americano, Jimmy Carter, e pelo ex-líder soviético, Leonid
Brezhnev.
Embora esse acordo nunca viesse a
ser homologado, ambas as partes (aparentemente) respeitaram, até aqui, os seus
termos. Segunda-feira isso pode mudar. Há seis anos, quando o Salt-2 foi
obtido, o mundo entendeu-o como avanço considerável no sentido de conter a
corrida armamentista, pelo menos no que
se referia aos balísticos intercontinentais com ogivas múltiplas.
Através dele, ficou estabelecido
que cada uma das partes poderia contar, no máximo, com 1.200 mísseis dessa
espécie. No final do ano passado, a Casa Branca, e, mais especificamente, o
Pentágono, já vinham ensaiando a sua ruptura, preparando, sutilmente, a opinião
pública, especialmente a dos Estados Unidos, para esse desfecho.
Sempre que podiam, Reagan e
Weinberger insinuavam que os soviéticos estavam violando o acordo, de uma
maneira genérica, sem especificar datas, cifras e locais. É até possível que os
russos não estejam, realmente, respeitando os termos do Salt-2.
Nesse caso, a opinião pública
mundial merece mais esclarecimentos. Desde quando as violações vêm ocorrendo?
Quais os tipos de mísseis novos que saíram das suas fábricas? Quantos eles são?
Só respondendo a essas questões, com provas, evidentemente, será possível fazer
pressão sobre o Cremlin e cobrar da URSS que honre a palavra empenhada. Ou,
pelo menos, haverá um jeito de desmoralizar o pretenso pacifismo das
autoridades soviéticas.
O que não se admite é que, para
tornar viável o lançamento do novo submarino “Alaska”, os Estados Unidos
decidam, sem esta ou mais aquela, fazer, simplesmente, vistas grossas ao
acordo, mesmo que à revelia dos seus aliados. Se os soviéticos não vinham
violando o Salt-2, passarão, certamente, a violar, contando, agora, com um
sólido pretexto para isso. Se já não estavam respeitando os seus termos, vão se
sentir descomprometidos, doravante, diante de idêntica atitude norte-americana.
E a corrida armamentista, que já está em níveis paroxísticos, deverá,
certamente, atingir velocidade ainda mais vertiginosa, literalmente impossível
de ser freada.
As superpotências, portanto, além
de estarem tapeando a opinião pública mundial, em conversações que ambas sempre
souberam que chegariam ao impasse, e que não conduziriam a lugar algum, estão
prestes a levar a sua insensatez ainda mais longe, jogando por terra uma das
poucas conquistas, nesse perigoso e delicado terreno, dos últimos trinta anos.
Até onde elas pretendem ir, ninguém jamais conseguirá atinar. É o que se pode
chamar, com todas as letras, de “roleta russa”.
(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 8 de
junho de 1985).
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