Amargo sentimento de
permanente divisão
Pedro
J. Bondaczuk
A visita que o
secretário geral do Partido Comunista da Alemanha Oriental realiza, desde
ontem, à parte Ocidental do país dividido, a despeito de se tratar de evento
histórico, deve estar despertando os sentimentos mais contraditórios nos
alemães dos dois lados. O próprio visitante, Erich Hoenecker, certamente vive
um conflito íntimo muito grande. Afinal, nasceu no lado Oeste do território,
que hoje é antagonista da parte que comanda. Sua terra natal, portanto, e tudo
o que a liga a ela, sentimentalmente, passou a ser, para ele, por razões
ideológicas, sua “inimiga” natural. Desde que o país foi dividido em dois, em
1945, ao cabo da Segunda Guerra Mundial, esta é a primeira vez que os líderes
das duas Alemanhas se reúnem, com tempo e disposição para discutir suas enormes
diferenças.
Não se pode esperar,
portanto, que ambos troquem amabilidades, a não ser as protocolares de praxe.
As reuniões entre os dois estadistas provavelmente serão tensas, duras,
marcadas pela intransigência e por inúmeras queixas e recriminações mútuas.
Todavia, a importância da visita está no fato dela pelo menos ter acontecido, o
que não deixa de ser um avanço. Por que? Porque, com ela, está sendo aberto um
canal direto de diálogo entre Bonn e Berlim Oriental que ambos, com certeza, tentarão
não somente conservar, mas ampliar ao máximo.
Há, no entanto, os que
vêem nessa visita outro aspecto, e este não tão positivo. O encontro
representaria aceitação tácita, tanto da parte do chanceler alemão-ocidental
Helmuth Kohl, quanto da do seu interlocutor comunista Erich Hoenecker, de algo
que, a despeito de ser dura realidade, nenhum dos dois ousou jamais admitir
como definitivo e imutável: a divisão da Alemanha em dois Estados, separados
por ideologias e concepções de vida antagônicas e inconciliáveis. Se fosse
possível penetrar na mente dos dois líderes e auscultar seus sentimentos,
suponho que se detectaria que estes se caracterizariam, sobretudo, por
frustração. Pela quase certeza de que o sonho de uma Alemanha unida, rica e
poderosa, maior potência da Europa Ocidental, se torna cada vez mais remoto,
quase impossível.
Fico imaginando o que
cada um deles sentiu ontem, quando foram içadas duas bandeiras diferentes do
que deveria ser um mesmo e único país e quando foram executados dois hinos
nacionais distintos, símbolos enfáticos desse estúpido divisionismo. As emoções
de ambos devem ter sido semelhantes, se não iguais. Provavelmente foram,
principalmente, de frustração face essa “peça” que a História pregou no povo alemão.
A fisionomia constrangida dos dois sugere que foi o que eles sentiram.
Quem sabe esse
sentimento amargo os possa levar para o mesmo lado, para a execução de uma
tarefa comum, mesmo que por caminhos antagônicos para tal: a da reunificação da
Alemanha. A possibilidade disso acontecer, face à realidade atual, é
remotíssima. É, virtualmente, missão impossível. Mas... as coisas mudam. As
circunstâncias se alteram. A roda da história gira, e nem sempre com lógica.
Quem sabe se em escassos anos, ou até mesmo em meses, o que hoje é tão
improvável, não surpreenda o mundo e se transforme em realidade! Tomara que
sim!
(Artigo publicado na
Editoria Internacional do Correio Popular em 8 de setembro de 1987).
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