Ditaduras têm seus dias
contados
Pedro
J. Bondaczuk
Os povos da África,
após prolongadíssimo período de hibernação mental, ditado primeiro pelo
colonialismo predatório e posteriormente por uma descolonização tão ou mais
desastrada do que foi o inferno colonial, estão despertando para a realidade.
Voltam a almejar a liberdade, pelo menos aquela mínima, trivial, de poder
escolher o que desejam fazer e o sistema social e político que pretendem
integrar. Em alguns países, o processo tem sido traumático, caracterizado por
guerras civis. Foram os casos recentes da Libéria, da Somália e da Etiópia, onde
os ditadores foram derrubados por não compreenderem os sinais destes novos
tempos.
Em outras partes, como
Angola, por exemplo, caminha-se para a pacificação nacional, que os angolanos
jamais conheceram, pelo menos no pós-guerra. Primeiro lutaram contra Portugal,
para a obtenção da independência e, quando esta foi obtida, combateram entre si
para saber quem iria mandar em quem. Há países africanos que, embora
conflituosos, começam a divisar tênue réstia de “luz no fim do túnel”. São os
casos específicos da África do Sul, onde o perverso apartheid passa pelos
estertores que antecedem a morte, e Moçambique, onde o regime marxista se
auto-renova, numa “perestroika” africana.
Muitos povos seguem se
estraçalhando em explosões de fúria e ódio, como o Sudão e Ruanda, por
exemplo, com guerras civis em pleno andamento. Outros conhecem o encantamento
da descoberta, da recém-conquistada autonomia tão ansiada, como é o caso da
Namíbia. Não se pode negar, todavia, que a África está em processo de
transformação, de metamorfose, que na natureza, ou em termos de Estado, costuma
ser dolorosa, sofrida, porém frutífera.
Os ventos
liberalizantes, nesse contexto, não poderiam deixar de chegar também aos
grandes países do continente. É o caso do Zaire, com 40 milhões de habitantes,
que desde a morte de Patrice Lumumba está em busca de caminhos sob o jugo de um
sanguinário e cínico ditador, Mobutu Sese Seko e catastrófica e prolongada
permanência (há 26 anos) no poder. Sua atuação tem sido de tal sorte
calamitosa, que os opositores zairenses no exílio, que residem nos Estados
Unidos, chamam seu regime de “Cleptocracia”. Ou seja, de “governo de ladrões”.
Mas como tudo na vida, quando não se renova cansa, a megalomania do general
encastelado na presidência, também já cansou seus corruptos aliados.
O Zaire, a exemplo do
Benin, Togo, Mali, Niger e República do Congo, pode estar em vias de um “golpe
civilizado”. A oposição une-se para pressionar pela renúncia de Mobutu. Segue o
exemplo de Madagascar, onde o truculento Didier Ratsiraka sobrevive no poder às
duras penas, com o recurso do estado de emergência e do toque de recolher. E
ainda assim, por pouco não o arranca no tapa do palácio presidencial, que
chegou a ser, recentemente, invadido por uma multidão, sob os olhares complacentes
de soldados que, sabiamente, se recusaram a atirar na sua própria gente.
Os ditadores, cujos
tempos estão muito difíceis, conforme o presidente norte-americano George Bush
avisou que seriam, precisam aprender a diferença entre poder e controle. Karl
Wolfgang Deutsch, notável estudioso da ciência do comportamento, deu magistral
lição nesse sentido, em entrevista que concedeu à revista IstoÉ, em 20 de
agosto de 1980.
Ensinou: “Poder é a
capacidade de produzir uma grande diferença numa situação da realidade.
Controle é a capacidade de produzir a modificação que você deseja. O leão é um
animal poderoso. Entretanto, não pode colocar uma linha numa agulha. O controle
requer poder. O poder não é suficiente para alcançar os resultados que
queremos”. Os ditadores, não apenas os africanos mas todos os que continuam
infernizando a vida de seus povos, deveriam ter um “ataque de racionalidade”,
por ínfimo que fosse, e se curvar à realidade. Se não têm, nada a oferecer às
suas populações, que passem o bastão para governantes mais competentes, antes
que se vejam forçados a fazê-lo e tenham que sair pela porta dos fundos do
palácio presidencial, mas não para a liberdade ou mesmo para o exílio, porém
para a masmorra, quando não o pátio de fuzilamento.
(Artigo publicado na
editoria Internacional do Correio Popular, em 8 de agosto de 1991).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment