Mudanças
exigem análise cuidadosa
Pedro J. Bondaczuk
As
transformações que vêm ocorrendo no mundo desde que, em 1987, o presidente
soviético, Mikhail Gorbachev, anunciou seu projeto reformista, baseado nos
pilares da "glasnost" e da "perestroika", de uma forma tão
vertiginosa, que praticamente não sobra tempo para uma análise mais cuidadosa
das conseqüências e possibilidades futuras, têm gerado também muitas dúvidas e
incertezas.
Alguns
arriscam-se a fazer previsões, que logo são superadas pela realidade. Por
exemplo, a primeira indicação de que Moscou estava disposta a aceitar a
destruição do Muro de Berlim foi dada em maio de 1988. Na oportunidade, uma
rápida reunificação da Alemanha não passava pela cabeça de ninguém, tão
impossível ela parecia.
Todavia,
a odiosa barreira que dividia a milenar cidade, e virtualmente toda a Europa,
em duas correntes ideológicas antagônicas, e que pareciam inconciliáveis, ruiu,
em 10 de novembro de 1989, levada de roldão pela vontade do povo alemão de
acabar com décadas de ocupação estrangeira, e ninguém previu esse dramático
desfecho.
Menos
de um ano depois, o país estava reunificado, num processo surpreendentemente
rápido. O mesmo ocorreu com a queda dos regimes comunistas dos Estados do Leste
europeu. Funcionou, aí, o chamado "efeito dominó", mas de forma
inversa à temida pelos norte-americanos na década de 1960, em relação à Ásia.
Nessa
ocasião, os Estados Unidos argumentavam que o chamado "mundo livre"
--- existe isso?! --- precisava impedir a todo o custo que o comunismo
avançasse através das carentes sociedades asiáticas. Afirmavam que o avanço
teria o efeito desse famoso jogo caseiro. Ou seja, a cada país que caísse sob a
ditadura marxista, haveria um próximo, vizinho, que seria o próximo a cair.
Na
região, ou por erro de enfoque --- o que é mais provável --- ou por causa da
forte presença militar norte-americana, isto não aconteceu. O
"dominó" restringiu-se apenas à antiga Cochinchina: Vietnã, Laos e
Camboja.
O
mesmo não ocorreu em relação ao Leste europeu. Todavia, parece que as análises
sobre o fenômeno da falência do comunismo, ou por pressa, ou por
desconhecimento dos problemas locais, vêm sendo, no mínimo, tendenciosas e em
tom triunfalista.
Como
diz a sabedoria popular: "muita água ainda irá passar por baixo da
ponte". É indispensável que haja cautela nas conclusões, até para que
potenciais crises futuras possam ser prevenidas e detidas no nascedouro.
Em
recente entrevista, o filósofo francês, Alain Finkielkraut alertou para os
perigos de um enfoque equivocado sobre tais acontecimentos, ao afirmar: "A
partir da falência comunista, é um pouco apressado concluir pela vitória da
democracia. Sejamos prudentes e atentos, não nos contentemos, para celebrar o
sucesso da democracia, com a presença de certos sinais que são, por vezes,
enganadores. Meu temor é que, sob o pretexto de que o comunismo ruiu, os
europeus dêem provas de pouca sensibilidade diante de realidades sociais
terríveis. Essa vitória sobre o comunismo entretém e disfarça o egoísmo que se
chama burguês, e que é o mais brutal!"
E
ademais, essa ideologia permanece viva, muito viva, em especial na Ásia. É
mister que não se esqueça que o país mais populoso do mundo, a China --- um em
cada cinco seres humanos que habitam este Planeta seguramente é chinês --- vive
sob este regime, dominado por aquilo que de mais odioso ele possui: seu caráter
policial sobre a vida dos cidadãos.
(Artigo
publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 15 de junho de
1991).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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