Saturday, November 21, 2015

Os pássaros e os sonhadores precisam de liberdade

Pedro J. Bondaczuk

O que seria do mundo sem os sonhadores? Não haveria artes, ciências e nem qualquer espécie de empreendimento e o homem, com toda certeza, ainda estaria vivendo nas cavernas, como fera bronca e selvagem, sem nenhum propósito para a sua existência que não fosse o de vegetar. O jovem piloto alemão ocidental Mathias Rust, que no dia 28 de maio passado realizou uma das mais formidáveis peripécias dos últimos tempos, ao driblar toda a extraordinária vigilância aérea soviética e pousar um frágil monomotor Cessna 172-B em pleno coração do poder russo, na Praça Vermelha de Moscou, bem junto às muralhas do Cremlin, demonstrou ser um sonhador.

Um tanto inconseqüente, é verdade, no verdor dos seus 19 anos de idade. Mas revelou-se, sobretudo, idealista que, se bem orientado, poderia realizar grandes coisas no futuro. Seu depoimento de 5 horas, ontem, no Supremo Tribunal da União Soviética, no início do seu julgamento, foi uma peça extraordinária de inocência e candura. Foi comovente atestado de que a juventude (ou parte considerável dela) ainda acredita num amanhã radioso para o Planeta, a despeito de todas as evidências contrárias existentes para inviabilizar essa crença.

Mathias Rust admitiu ter violado as leis, ou seja, o delito de que está sendo acusado. Mas explicou que fez seu histórico vôo para poder conversar com o líder Mikhail Gorbachev, para propor ao dirigente da superpotência do Leste um plano que faria as nações a viverem em paz. Que tremenda ingenuidade, que imensa candura, que idealismo esse moço demonstrou!!! É verdade que alguns podem considerar sua atitude sintoma de paranóia. Outros estão atribuindo propósitos inconfessáveis à aventura do rapaz, que estaria “!mancomunado” com terríveis forças do mal para prejudicar os soviéticos. Bobagem. Todas estas hipóteses são tolas demais para serem levadas a sério.

Apesar das consequências que podem advir para o fogoso adolescente, não acreditamos que os soviéticos venham lançá-lo no cárcere. Certamente Rust será condenado e sentenciado pelos sisudos juízes que apreciam sua temerária ação. Mas depois desse “susto” que as autoridades vão pregar no piloto, vão arranjar um jeito de deixá-lo livre, possivelmente apelando para sua expulsão do país. Uma criança sonhadora, cândida como um passarinho, não deve, como a ave, ser engaiolada. Deve voar, livre e ligeira, nas asas do seu sonho de paz, que talvez contamine (quem sabe) os circunspectos e mal-humorados senhores que conduzem os destinos dos homens.

(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular em 3 de setembro de 1987)

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