Poesia é ato de paz
Pedro J. Bondaczuk
"A
experiência (uma longa série de sensações) nos ensinou que um momento de êxtase
vale por um ano de raciocínio". A afirmação é do filósofo norte-americano
Will Durant, expressado em seu clássico “Filosofia da vida”, que a fez com a
objetividade do pensador e não com o descomprometimento do poeta. Trata-se de
evento raro, que só ocorre com os que se predispõem a essa felicidade suprema,
tão absoluta, irrestrita e arrebatadora que alguns até chegam a duvidar que
exista. Mas existe e marca a vida de quem vivencia essa experiência. Há quem a
confunda com o orgasmo, com o qual tem até alguma semelhança. Trata-se, porém,
de sensação ligeiramente parecida, mas muito mais profunda, intensa e
inesquecível do que o gozo sexual.
Para
viver um momento como este, requer-se que tenhamos postura positiva face ao
mundo. O êxtase, esta suprema alegria, não advém, como supõem alguns
pseudomísticos (na verdade masoquistas), da mortificação, do sofrimento físico
e/ou psicológico, do sacrifício, das privações ou da angústia. Não é encontrado
no mundo trágico das drogas, com seus pesadelos lúgubres, embora exista até um
produto com este nome, vendido quase que livremente, que promete irresponsavelmente
conduzir seus usuários ao "paraíso". Leva-os, isto sim, ao inferno,
não raro sem volta Dinheiro algum é suficiente para comprar essa enorme
felicidade. O êxtase é a culminância de pequenas satisfações, quase nunca
valorizadas, que temos no dia-a-dia e que se somam até se transformar em algo
único, maiúsculo, grandioso, incomparável e inesquecível.
No
meu caso, atinjo-o em situações até bastante comuns, posto que específicas.
Chego a ele quando consigo produzir um texto perfeito, em sua construção
formal, nas idéias transmitidas, e na simplicidade, por exemplo. Quando chego
ao coração alheio e me faço compreendido. Quando recebo reciprocidade pelo amor
que sinto. Quando levo consolo e esperança a quem precise. Quando me sinto útil
e sou importante pela capacidade de servir e não de ser servido. Quando
transmito confiança e consigo orientar para o melhor caminho os outros. Embora
profissional do texto – meu ganha pão, vocação e missão – escrevo não com
vaidade, nem com raiva e muito menos mecanicamente. Faço-o com alegria.
Gosto
do que faço. E não troco essa satisfação tão simples por nenhuma outra das
tantas que as pessoas procuram. Pouco importa que passe por privações materiais
se preencho minha vida de beleza. Nenhum sofrimento me abala se me alimento de
poesia. Enquanto a maioria dos escritores tem como matéria-prima os becos
escuros da alma, sentimentos trágicos, acontecimentos tétricos, instintos
selvagens ou atos primitivos, prefiro
concentrar-me no lado belo da existência. Gosto de tratar de emoções simples. A
beleza está na simplicidade. Dizem que a felicidade é sem graça e não se presta
à literatura. Puro engano. A morte, embora me atemorize, é que não me fascina.
A violência, em todas as suas formas e manifestações, me causa repugnância.
Amo
a beleza, a solidariedade, a delicadeza. E, como ressalta Pablo Neruda no livro
"Confesso que vivi", "a poesia é sempre um ato de paz. O poeta
nasce da paz como o pão nasce da farinha. Os incendiários, os guerreiros, os
lobos buscam o poeta para queimá-lo, para matá-lo, para mordê-lo. Um espadachim
deixou Pushkin ferido de morte entre as árvores de um parque sombrio. Os
cavalos de pólvora galoparam enlouquecidos sobre o corpo sem vida de Pettofi.
Lutando contra a guerra morreu Byron na Grécia. Os fascistas espanhóis
iniciaram a guerra na Espanha assassinando seu melhor poeta". Mas a
magnífica produção desses “filhos da paz” sobreviveu. Porquanto “a poesia é
sempre um ato de paz”.
Sigo,
na medida do possível, como norma de conduta literária, a recomendação do
pensador budista japonês, Daisaku Ikeda, que ao comentar a responsabilidade
social que o escritor tem perante seu público, como orientador de
comportamentos, dá a entender que ninguém sai lucrando com a exploração das
misérias humanas. Que se deliciar com a desgraça de personagens lançados de
ponta-cabeça no inferno dos seus vícios, neuroses e loucuras, é um desvio
doentio de personalidade.
Por
isso, não vejo arte alguma na banalização da morte. Não vislumbro nada de
estético na apologia do assassinato feita especialmente pelo cinema, mas também
explorada em romances, contos e novelas. Não identifico qualquer heroísmo na
supressão de vidas alheias, seja qual for o pretexto, mesmo que em simples
enredos de ficção. Somente um louco sanguinário consegue atingir o êxtase
diante da morte. Apenas um sádico perverso aprecia o sofrimento, físico ou
moral, de quem quer que seja. “A poesia é sempre um ato de paz”. Por isso,
busco-a, com afã, no cotidiano e ao encontrá-la, extasio-me. Amo a vida, a
beleza e a alegria. Não descrevo sonhos, deliro... Sou poeta!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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